Os tempos de juros no piso histórico estão perto do fim. Cada vez mais economistas têm apontado para uma alta na taxa básica de juros, a Selic, ainda em 2021. Nesta quarta, dia 20, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central decidiu manter a Selic em 2% ao ano, mas disse que está vigilante com a alta da inflação. O crescimento das despesas do governo e o avanço dos preços apontam para a necessidade de um aperto na política monetária, o que deve levar os juros básicos para cima antes do esperado.
Além de mexer com o custo do crédito, a Selic também tem influência sobre os investimentos. As aplicações pós-fixadas com retorno calculado pelo CDI ou pela própria Selic terão sua rentabilidade melhorada.
Já os títulos prefixados, cujo retorno é determinado por uma taxa fixa, começam a perder a atratividade — especialmente aqueles adquiridos recentemente, no período em que os juros alcançaram a menor taxa da história. Apesar de não sofrerem influência direta do CDI, em geral a rentabilidade dos títulos prefixados é calculada com base no juro do momento mais um prêmio de risco. Chega-se, assim, a um percentual.
Quando a pandemia do coronavírus chegou, a Selic caiu de 4,25% para 2%. Sem perspectiva de quando a economia se recuperaria do tombo causado pelo vírus, muitos investidores recorreram aos títulos prefixados para se proteger da queda do CDI. Por terem sido emitidos em um cenário de juro baixo, agora esses títulos tendem a render menos que os pós-fixados no médio e no longo prazo. Aí surge a dúvida: com o cenário prestes a mudar de rumo, é hora de vender essas aplicações?
O que dizem os especialistas?
Embora não tenha mexido na Selic ainda, o Copom deu um importante sinal na reunião da quarta, 20. A autoridade monetária tirou do comunicado divulgado o chamado forward guidance, que é uma espécie de orientação futura sobre os juros — nesse caso, sinalizavam a manutenção da taxa. Embora não se saiba ainda quando o BC decidirá aumentar a Selic, o fim do forward guidance é um sinal concreto de que os ventos estão prestes a mudar.
“A partir de agora, o BC vai avaliar se a inflação está subindo mais que o esperado e como ele deve agir diante disso. A simples mudança de orientação deve fazer a curva de juros futuro escalar”, diz Guilherme Artmann, chefe de renda fixa da corretora Easynvest. Ele explica que é na curva futura que os investidores ficam de olho ao avaliar o desempenho de um título cujo retorno é calculado pelo CDI.
A migração do foco para os títulos pós-fixados tende a penalizar os prefixados no mercado secundário. Um bom exemplo disso são os títulos NTN-F do Tesouro Direto. Desde o início do ano, esses papeis prefixados perderam até 4% de valor de face, em razão da marcação a mercado. Lembrando: marcação a mercado é o ajuste do valor do título no momento da revenda no mercado secundário. As NTN-F de maior prazo de vencimento (em 2029 e 2031) foram as que caíram mais desde o início de janeiro.
É curioso notar, no entanto, que esses títulos ainda acumulam valorização em um horizonte maior. O Tesouro Prefixado 2022, por exemplo, ainda tem uma rentabilidade de 6,7% nos últimos 12 meses. No mês passado, a rentabilidade desse mesmo título nos 12 meses anteriores estava em 7,7%. Isso significa que muitos investidores que embarcaram nesses títulos nos últimos meses ainda estão colhendo bons frutos, mas a tendência é que esse retorno continue a encolher.
Já quem embarcou nos títulos prefixados no último trimestre não pode dizer o mesmo. “Quem comprou em dezembro, por exemplo, certamente vai ter prejuízo se tentar revender agora. Depende muito do prazo de vencimento do título e da data de compra”, diz Artmann.
Como decidir se vendo ou não esses títulos?
O primeiro ponto a avaliar é o mencionado acima: a janela de compra e venda. Se você aplicou nesses títulos recentemente e está vendo um rendimento negativo, embolsar o prejuízo é má ideia. O ideal é carregar esses títulos até o vencimento ou até que as condições de mercado sejam mais favoráveis. Já se você está entre os sortudos que entraram na aplicação no momento certo, é hora de avaliar se vale a pena zerar a posição.
“Se o investidor faz o resgate com um objetivo definido, como a aplicação desse dinheiro em títulos mais longos ou até em produtos de renda variável, faz sentido embolsar o ganho”, aconselha Alan Ghani, analista de renda fixa da EXAME Research. Se o título for de curto prazo, como os prefixados 2022, também não é mau negócio manter até o vencimento. Isso porque, embora haja expectativa de alta dos juros, o caminho da subida não deve ser tão íngreme. O próprio BC conta com os juros a 4,75% no final de 2022 — um percentual bem próximo do que havia antes da pandemia do novo coronavírus.
Artmann, da Easynvest, lembra que ainda há possibilidade de o governo conseguir realizar alguma medida fiscal, o que melhoraria o cenário para os juros no médio e longo prazo. Se colocar as despesas federais e a inflação nos trilhos, o governo abrirá caminho para uma era de juros mais baixos, o que deve fazer com que as condições para os prefixados voltem a melhorar. Mas tudo isso é para o médio prazo e ainda depende da capacidade de articulação do governo de Jair Bolsonaro.
Cuidado com a liquidez
É importante lembrar, no entanto, da regra da liquidez. Títulos prefixados, especialmente os de crédito privado (CDBs, LCIs e debêntures), podem ter liquidez limitada, o que faz com que o resgate antecipado seja mais difícil. As corretoras costumam aplicar uma penalidade a quem decide revender o título antes do prazo de vencimento, e esse spread pode consumir boa parte do rendimento acumulado.
Além disso, o investidor que recompra esses títulos pode exigir um “prêmio” na operação, em razão da incerteza quanto ao cenário de juros no médio e longo prazo.
Por Bianca Alvarenga
Publicado originalmente em https://exame.com/invest/com-alta-da-selic-no-horizonte-e-hora-de-vender-titulos-prefixados/