A permissão para que as empresas – em conjunto com estados e municípios – adquiram vacinas contra a covid-19 está em vigor desde 10 de março, mas só terá real utilidade daqui meses, já que a produção global de imunizantes está dirigida aos governos e consórcios de países, seus clientes de primeira e segunda hora. Mesmo assim, essa possibilidade pode ser fundamental para os brasileiros, diante das políticas erráticas do governo federal durante a pandemia. Porém, seus pontos principais precisam ser conhecidos para evitar euforias e frustrações desnecessárias. Não há milagres no horizonte.
De autoria do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), a lei só nasceu por causa da demora do Ministério da Saúde em aprovar e adquirir vacinas. Enquanto a covid perdurar intensa, às empresas só será permitido que atuem como entidades filantrópicas, para evitar as furadas de fila dos grupos prioritários para imunização (lista no final do texto). Assim, tudo que a iniciativa privada comprar será doado obrigatoriamente ao SUS para dar corpo à campanha nacional. É o que o senador Pacheco denominou de “garantias da missão social”. A solução não é inédita. Na Indonésia, onde uma lei similar foi aprovada, mais 6,5 mil empresas se inscreveram para adquirir lotes que serão direcionados ao sistema de saúde.
Por aqui, quando passar a vez dos prioritários e o período de insegurança sanitária estiver amenizado, as empresas poderão adquirir os imunizantes, retendo 50% e doando o restante ao SUS. A comercialização direta, como já ocorre com a H1N1, apenas com a volta do “antigo normal”.
Entre os interessados em participar da iniciativa estão o Sindicato da Habitação (Secovi-SP), que reúne as empresas da construção civil, e o empresário Carlos Wizard, fundador da rede de escolas de línguas que carrega seu sobrenome. Outros grupos têm agenda própria. Um conjunto de bancos já doou mais de R$ 380 milhões à Fiocruz e ao Instituto Butantan, enquanto a coalizão Unidos pela Vacina, capitaneada por Luiza Trajano, presidente do conselho do Magazine Luiza, foca seus esforços em ajudar na logística de distribuição. BTG Pactual, Gerdau, Península e Suzano se uniram ao Hospital Albert Einstein e à Prefeitura de São Paulo para instalar 40 leitos de UTI no Hospital Municipal Vila Santa Catarina. A gestão e a operação ficarão com o Einstein e os leitos serão permanentes.
Se tudo der certo, só a partir do final do segundo semestre de 2022 as empresas poderão vacinar seus funcionários e qualquer cidadão poderá procurar uma clínica particular para escolher o inoculante – aprovado – que quiser. “Minha opinião de cidadão é que essa autorização desonera o SUS. É um bom advento que vem do Congresso e foi reiterado pelo STF. Acredito que a MP 1026 vem agregar para melhor combater a pandemia”, afirmou Antônio Barra Torres, diretor-presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Detalhe: os compradores devem assumir a responsabilidade civil caso alguém sofra com eventuais efeitos colaterais comprovados.
Os laboratórios indianos devem ser os primeiros a atender o mercado privado brasileiro. Só que antes precisam ajudar a brecar o avanço do vírus entre os quase 1,4 bilhão de indianos. Produtora da Covaxin, a Bharat Biotech firmou um acordo com a brasileira Precisa Medicamentos para abastecer clínicas particulares. Seu imunizante ainda está em processo aprovação pela Anvisa.
Apesar dos benefícios da lei, a solução da crise não depende só dos brasileiros. Quanto mais cedo os fabricantes de insumos farmacêuticos ativos (IFA) indianos e chineses conseguirem acelerar o fornecimento, mais rápido as empresas brasileiras poderão agir como doadoras ao SUS. O ex-diretor e fundador da Anvisa, Gonzalo Vecina, já declarou que a efetividade da iniciativa é duvidosa, já que não há vacinas para vender por enquanto. A afirmativa do sanitarista faz sentido, porém desconsidera o fator de pressão sobre o governo, que temeria perder apoio por deixar milhões de doses na conta direta dos grandes contribuintes.
Conheça os grupos prioritários pela ordem de vacinação
- Pessoas com 60 anos ou mais que estejam institucionalizadas (em asilos ou clínicas);
- Pessoas com deficiência que estejam institucionalizadas (em asilos ou clínicas);
- Indígenas vivendo em terras indígenas;
- Trabalhadores da saúde;
- Pessoas de 80 anos ou mais;
- Pessoas de 75 a 79 anos;
- Povos e comunidades tradicionais ribeirinhas;
- Povos e comunidades tradicionais quilombolas;
- Pessoas de 70 a 74 anos;
- Pessoas de 65 a 69 anos;
- Pessoas de 60 a 64 anos;
- Indivíduos que possuam comorbidades (doenças que favorecem o agravamento da covid-19);
- Pessoas com deficiências permanentes graves;
- Pessoas em situação de rua;
- População privada de liberdade (presidiários e detidos);
- Funcionários do sistema carcerário;
- Trabalhadores da educação do ensino básico;
- Trabalhadores da educação do ensino superior;
- Forças de segurança e de salvamento;
- Forças Armadas;
- Trabalhadores do transporte coletivo rodoviário de passageiros;
- Trabalhadores do transporte metroviário e ferroviário;
- Trabalhadores do transporte aéreo;
- Trabalhadores do transporte aquaviário;
- Caminhoneiros;
- Trabalhadores portuários;
- Trabalhadores industriais.
Fonte: Ministério da Saúde