Todos nós prezamos a lealdade e consideramos essa característica algo imprescindível na formação do caráter e da retidão de uma pessoa. Minimizada, a fidelidade a alguém ou a algum propósito pode gerar situações constrangedoras. Levada ao extremo, no entanto, pode colocar o indivíduo leal em perigo.
O presidente Jair Bolsonaro, em gratidão ao trabalho do ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, retardou ao máximo a sua saída do ministério (o novo ministro, Marcelo Queiroga, acaba de tomar posse). A ideia é colocá-lo em algum outro cargo, oferecendo ao general a famosa saída honrosa.
Pazuello, porém, acabou por personalizar (ao lado do presidente, diga-se) toda a trapalhada que se abateu sobre o combate à pandemia, em especial na demora na compra de vacinas e na insistência em seguir um discurso obscurantista. Sua presença no governo traz dois problemas. Um é a lembrança eterna dessa fase ruim, em que a Covid-19 bateu recordes seguidos de contaminação e de mortes. A outra é a possibilidade de que o general possa novamente praticar uma lambança em outra freguesia.
Bolsonaro, em meio à lealdade que cultiva por Pazuello, talvez pudesse tirar proveito de uma frase geralmente atribuída ao general Charles de Gaulle (foto), líder da resistência francesa sob o nazismo e presidente da França entre 1959 e 1969: “A ingratidão é um dever do governante”. Em outra versão, essa sentença é citada diferentemente: “A maior virtude de um estadista é a ingratidão”.
Não se sabe ao certo qual versão é a verdadeira – ou se de Gaulle disse mesmo algo do gênero (outra máxima atribuída a ele – “O Brasil não é um país sério” – é de autoria do embaixador Carlos Alves de Souza Filho). Mas o teor desta frase é algo que poderia ser estudado com atenção pelo presidente. Ao acomodar Pazuello no governo, ele passa uma mensagem subliminar muito ruim – a de que a incompetência pode ser premiada em função da lealdade.
Em política, o nome dessa prática é compadrio.