Mesmo os mais bem-sucedidos enfrentam o espectro do fracasso. A questão é saber aprender
Você quer empreender, mas tem medo de falhar? Você não está sozinho. Todos temos esse medo.
Mas há duas maneiras de se viver:
1) esquivando-se do fracasso e não correndo riscos — e, consequentemente, diminuindo as chances de ser bem-sucedido; ou
2) colocando a pele em jogo — o que também é passível de fiasco, mas com uma maior chance de sucesso.
Em um discurso proferido em 2008 na Universidade de Harvard, a autora de Harry Potter, JK Rowling, afirmou: “É impossível viver sem falhar em algo, a menos que você viva com tanto cuidado, evitando todo e qualquer tipo de risco, que, no final, acabará não vivendo – nesse caso, você já fracassou, por definição”.
A importância do fracasso para se chegar ao sucesso
Inúmeros empresários famosos fracassaram antes de terem sucesso; ou fracassaram em algo após já serem bem-sucedidos. Aprender com o fracasso é uma regra fundamental do empreendedorismo.
A diferença entre um mau e um bom empreendedor não é o fracasso, mas sim o que ele fará após o baque – ele deixará que o tropeço o ensine ou o abata por completo?
O palestrante motivacional Dennis Waitley certa vez disse: “O fracasso deve ser nosso professor, não nosso coveiro. O fracasso é um revés, e não uma derrota. É um desvio temporário, não um beco sem saída. O fracasso é algo que só conseguimos evitar se não fizermos nada, não falarmos nada e não sermos nada”.
Correr risco é algo inevitável em um mundo incerto e em constante mudança. E você não pode evitar o fracasso ao tentar evitar o risco. Você simplesmente fracassará no esforço e reduzirá suas chances de sucesso.
O empreendedor é aquele que organiza e direciona os fatores de produção (bens de capital e mão-de-obra) na expectativa de que suas decisões de hoje serão validadas pelas condições de mercado que ele imagina que ocorrerão no futuro. O empreendedor é, na realidade, é um especulador, alguém que possui uma estimativa quanto às futuras condições do mercado e está ávido para realizar empreendimentos que, caso antecipem corretamente as futuras demandas dos consumidores, irão resultar em lucros.
Mas nem mesmo o ser humano mais inteligente do mundo sabe tudo sobre o amanhã que ainda não aconteceu. O risco de fracasso é inerente a qualquer investimento em um futuro incerto.
Assim como seu pai, o fabricante de doces Milton Hershey fracassou várias vezes antes de prosperar. O mesmo ocorreu com o cartunista, cineasta e pioneiro de parques temáticos Walt Disney. Sendo bons empreendedores, eles não desistiram. Eles aprenderam e perseveraram.
Razões para o fracasso incluem mau planejamento ou má implementação de um plano, má gestão de pessoas, capital abaixo do necessário, falta de iniciativa, marketing ruim, baixa (ou lenta) inovação, subestimação da concorrência, tornar-se sobrecarregado com imprevistos, e até mesmo não aprender com as falhas anteriores.
Você pode fracassar porque não pensou grande o suficiente. Você pode fracassar porque pensou grande demais. E você pode fracassar por uma série de razões intermediárias.
Há um trecho do um famoso discurso de Theodore Roosevelt, de abril de 1910, intitulado Man in the Arena, que resume perfeitamente o que foi dito:
Não é o crítico que interessa. Pouca relevância tem aquele que aponta por que o outro tropeçou ou o que ele deveria ter feito de diferente.
O crédito pertence ao indivíduo que está realmente batalhando na arena, cujo rosto está manchado de poeira, suor e sangue; que se esforça bravamente; que erra; que falha repetidamente, pois não há esforço sem erro, fracassos e decepções; que realmente se esforça para fazer as tarefas; que conhece os grandes entusiasmos e as grandes devoções; que se gasta em uma causa digna; que, na melhor das hipóteses, conhece no final o triunfo das grandes conquistas, e na pior, se ele falha, pelo menos falha tendo ousando grandemente, de modo que seu lugar jamais estará com aquelas almas frias e tímidas que não conhecem a vitória nem a derrota.
Os dois fracassos empresariais narrados abaixo têm como personagens dos empreendedores americanos que atuaram com décadas de diferença no mesmo país da América do Sul: o Brasil. Como disse Theodore Roosevelt, eles “ousaram grandemente”.
Fracasso à brasileira: Henry Ford e a Fordlândia
O nome de Henry Ford já era mundialmente conhecido à época. Quando seu último Modelo T saiu da linha de montagem em Michigan, em 1927 (abrindo espaço para seu sucessor, o Modelo A), ele havia vendido 15 milhões de unidades a um preço médio de poucas centenas de dólares cada.
Por ter sabido enriquecer tantas pessoas com o primeiro automóvel produzido em massa e a preços acessíveis, Ford se tornou um homem rico.
Porém, solucionar problemas sempre foi mais interessante e desafiador para Ford do que apenas ganhar dinheiro. Mesmo com todo o seu sucesso, ele não se deu por satisfeito, e tentou resolver um de seus principais problemas: o monopólio britânico da borracha, que dificultava a produção de pneus.
Sabendo que a região amazônica do Brasil estava repleta de árvores seringueiras cuja matéria-prima produzia o látex de que precisava para fazer os pneus de seus automóveis, Ford decidiu construir sua própria operação borracheira no local.
Ele negociou com o governo brasileiro e, em 1927, finalizou um acordo pelo qual assegurou 1 milhão de hectares ao longo do rio Tapajós, 160 quilômetros ao sul de onde ele deságua no Rio Amazonas, na cidade de Santarém (estado brasileiro do Pará). Em troca, ele teria de dar ao governo uma participação de 9% dos lucros.
A peça central do projeto seria uma nova cidade, que o magnata dos automóveis batizou de “Fordlândia“.
Isso é que é pensar ousadamente.
O empreendedor vislumbrou não apenas uma maciça operação de produção de borracha a mais de 6 mil quilômetros de Detroit, como também uma vila utópica onde seus valores do Meio-Oeste americano transformariam uma sociedade estrangeira. Foi um desafio hercúleo em todos os sentidos – logística, ambiental, cultural e economicamente.
Todavia, não demorou mais do que seis anos para que a Fordlândia entrasse em colapso. Os trabalhadores brasileiros não gostavam da comida americana e se irritaram enormemente com a proibição do consumo de álcool na cidade (o consumo era proibido até nas residências dos trabalhadores). Também ficaram insatisfeitos com regras que, à época, eram novas para os trabalhadores da região, como sirenes, relógios de ponto, crachá e regras de comportamento a que não estavam habituados, o que causava conflitos e baixa produtividade.
Tudo estava contra o projeto. Insetos e doenças atacaram impiedosamente as seringueiras plantadas pelos administradores na região. A Fordlândia fechou e a Ford moveu suas operações rio acima; porém, dentro de uma década, elas também fecharam. A invenção da borracha sintética na década de 1940 tornou a borracha natural obsoleta e desnecessária.
O neto de Ford, Henrique II, vendeu tudo de volta ao governo brasileiro em 1945 com uma perda, em dólares de hoje, de quase 300 milhões de dólares.
Da celulose à falência
Daniel K. Ludwig (1897-1992), também oriundo do estado americano de Michigan, nunca ganhou a notoriedade de Henry Ford, mas era isso mesmo que ele queria. Ludwig deliberadamente evitou os holofotes durante toda a sua vida.
Seu projeto no Brasil nos anos 1960 e 1970, porém, foi tão espetacular quanto o de Ford.
A primeira aventura empreendedorial de Ludwig assumiu a forma de transporte de madeira e melaço em cargueiros que operavam nos Grandes Lagos – conjunto de lagos situados entre os Estados Unidos e o Canadá. Ele tinha apenas 19 anos quando começou a empresa.
Ao longo dos 50 anos seguintes, construiu uma das maiores fortunas do mundo ao se tornar um especialista nas áreas de navegação cargueira (ele praticamente inventou o superpetroleiro), hotéis, seguros, pomares de laranja, refino de petróleo e pecuária.
Aos 70 anos de idade, podendo já se aposentar tranquilamente e usufruir uma vida de luxo, Ludwig teve sua grande ideia para o Brasil: comprou 1,6 milhão de hectares não muito longe das ruínas de Fordlândia, e construiu uma fábrica de celulose (o Projeto Jari). Mas antes, criou uma comunidade modelo chamada Monte Dourado, com hospital e escolas, e desenvolveu a agricultura local para alimentar os habitantes que ele esperava que fossem trabalhar na fábrica.
A tarefa difícil ficou ainda mais desafiadora quando Ludwig decidiu que, em vez de construir a fábrica do zero no local, era mais viável construí-la no Japão e enviá-la por meio do oceano para o Brasil. Isso mesmo. Ele construiu uma fábrica de papel inteira no Japão e rebocou-a em duas partes gigantes até o Brasil, e depois centenas de quilômetros rio acima no Amazonas.
Talvez o fato de que a ideia de tal empreendimento nunca teria me ocorrido, em qualquer idade, mostre o quão pouco empreendedor eu sou. Mas sou grato por haver pessoas no mundo que são obviamente mais corajosas e mais visionárias do que eu.
Assim que a fábrica foi montada em 1979, 750 toneladas de celulose passaram a ser produzidas por dia. Mesmo assim, o projeto como um todo gerou prejuízos que obrigaram Ludwig a vendê-lo totalmente para investidores brasileiros em 1981. Ao todo, Ludwig gastou 1,15 bilhão de dólares em valores da época.
Ele dedicou a década restante de sua vida ao financiamento de pesquisas sobre o câncer, doando centenas de milhões de dólares para esse fim.
Se quiser sucesso, não tema o fracasso
Quais lições podemos tirar de apostas gigantescas como Fordlândia e Monte Dourado?
Os mesquinhos e de mentalidade estreita serão rápidos em criticar. Provavelmente são os mesmos que desdenham dos sonhos dos atuais empreendedores de explorar o fundo do oceano mais profundo ou colonizar Marte. De mim, no entanto, você não ouvirá nada além de uma palavra de encorajamento quando alguém sonhar grande (especialmente se ele fizer isso com seu próprio dinheiro).
Tenho certeza de que Ford e Ludwig jamais quiseram falhar. Também tenho certeza de que nenhum dos dois gostou quando aconteceu. Mas também estou certo de que eles não temiam isso. O próprio Ford certa vez disse: “O fracasso é simplesmente a oportunidade de começar de novo, desta vez de forma mais inteligente”.
Não tenha medo do fracasso. Esteja preparado para aprender com ele. Não deixe de correr riscos porque tem medo de que o sonho não dê certo. Se o medo do fracasso bastasse para que os humanos deixassem de agir, estaríamos ainda vivendo em cavernas.
Quando grandes homens como Ford e Ludwig se arriscam, isso inspira outros a se arriscarem também, tímida ou ousadamente.
Ao contrário de muitos, penso ser extremamente inspiradores os fracassos que citei, e gostaria de ter tido metade da coragem que Ford e Ludwig tiveram para tentar empreendimentos tão notáveis. É indicativo de um espírito sem o qual a existência da humanidade seria monótona e estagnada.
Não é um elogio estar entre “aquelas almas frias e tímidas que não conhecem a vitória nem a derrota”.
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Lawrence W. Reed
Publicado anteriormente em: cutt.ly/Qne3UvR