A foto de Jair Bolsonaro comendo uma fatia de pizza em uma calçada de Nova York é emblemática. Ela é a comprovação de que o presidente, apesar de todas as chances que teve, ainda não se vacinou contra a Covid-19 – uma das medidas mais importantes no combate à Covid-19 e responsável pelo esvaziamento das UTIs por todo o país.
Essa pizza reflete a teimosia de Bolsonaro. Ele teve tempo suficiente para se vacinar, viajando sem criar caso com os nova-iorquinos e mostrar que seguia as orientações sanitárias que vigoram em todo o mundo. No entanto, preferiu marcar uma posição que, do ponto de vista prático, para nada serve.
Esse pedaço de pizza ficará marcado como uma espécie de símbolo nacional do negacionismo, pois está imbuído daquela soberba que toma conta de vários indivíduos que embarcam na onda das teorias da conspiração. Para Bolsonaro, se ele foi contaminado uma vez, estará imune para sempre – mesmo que as autoridades sanitárias recomendem a imunização total dos adultos e especialmente quem passou dos 60 anos de idade.
A pizza de Bolsonaro se junta a outras iguarias consumidas por políticos que marcaram época e viraram símbolos, para o bem e para o mal.
Um dos exemplos disso é o uísque Logan, consumido com generosidade pelo presidente Fernando Collor no início de seu mandato. Descendente de duas oligarquias alagoanas e ex-marido de uma das herdeiras mais tradicionais do Rio de Janeiro, Collor se comportava como um novo rico. O scotch Logan, a versão doze anos do White Horse (ao qual os mais velhos só se referem como “Cavalo Branco”), ajudava a compor a persona de um emergente social.
Como se sabe, Fernando Collor sofreu impeachment e foi substituído por Itamar Franco. Saiu o uísque Logan e entrou o pratinho de pão de queijo, servido em horários estratégicos – ao lanche matutino e vespertino. Ele simbolizava as raízes mineiras de Itamar, que preferia costurar acordos políticos no âmbito privado e desfazê-los em público.
Quando assumiu a presidência, em 1995, Fernando Henrique Cardoso já estava estigmatizado por um prato em especial: a buchada de bode. Em plena campanha no Nordeste, foi a ele oferecida a ele uma pratada dessas. Pressentido a gozação, o então candidato disse que gostava muito da receita – e que havia até uma parecida em Paris. Estava ali criado o prato que melhor definia FHC: uma receita popular travestida de algo elegante e europeu.
Antes de falar de Luiz Inácio Lula da Silva, é bom lembrar um pouco de Jânio Quadros, que sempre será ligado à figura de um sanduíche de mortadela (hoje, por sinal, um ícone petista). Dizia a lenda que Jânio não era exatamente um fã da combinação, mas sempre levava um do bolso para mostrar que ele circulava tanto e fazia tanta campanha que não tinha tempo de almoçar.
Hoje também ligado à mortadela, Lula não foi exatamente um político marcado por alguma iguaria comestível – mas, como Collor, é associado a algo alcoólico. No caso do petista, cachaça ganhou uma simbologia especial e foi o epicentro de uma crise política.
Em maio de 2004, o jornalista Larry Rohter, correspondente do New York Times, escreveu o seguinte: “O presidente Luiz Inácio Lula da Silva nunca escondeu sua inclinação por um copo de cerveja, uma dose de uísque ou, melhor ainda, um copinho de cachaça, o potente destilado brasileiro feito de cana-de-açúcar. Mas alguns de seus conterrâneos começam a se perguntar se sua preferência por bebidas fortes não está afetando sua performance no cargo”. Como Rohter insinuou que Lula era alcoólatra, criou-se uma confusão sem fim no Planalto. O presidente, inclusive, quis expulsar Rohter do Brasil, coisa que não aconteceu.
Essa galeria etílico-gastronômica que reúne sanduíches de mortadela, buchadas de bode, pães de queijo, pizzas, uísques e cachaças, representa algumas características marcantes de nossos presidentes. Tirando o uísque doze anos de Collor, todos os exemplos são de alimentos e bebidas que fazem sucesso junto ao povão, o que denota uma certa dose populista nessas situações.
A pizza de Bolsonaro substitui o leite condensado com pão, servido à mesa de café da manhã do candidato recém-eleito. Embora faça parte de um contexto político desfavorável, é bem mais palatável que a mistura indigesta do leite evaporado com o pão – essa, pelo jeito, apenas representava uma falta de noção do ponto de vista gastronômico.
Uma resposta
Risível esse texto do começo ao fim. Primeiro, o “não vacinado” testou negativo pra covid19 após retornar ao Brasil enquanto que, os “vacinados” foram contaminados como o Ministro Queiroga. O Presidente da Russia comeu na rua com os seus subalternos também. E pra finalizar, falar mal de pão com leite condensado, sendo isso até tipico dos fluminenses, é comprovar a dor de cotovelo com o Presidente Bolsonaro.