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Gilberto Braga: uma parte da história brasileira se vai com ele

As novelas da TV Globo sempre foram criticadas pela esquerda brasileira. Os enredos ofereceriam ao povo uma válvula de escape aos problemas do país e serviriam para alienar o grande público, afastando-os da militância política, principalmente durante os anos de chumbo. Neste ponto, o de oferecer entretenimento instantâneo, o autor Gilberto Braga (assim como sua mentora, a também roteirista Janete Clair) era um mestre da narrativa – seja ao contar a saga de uma cativa de pele branca (“Escrava Isaura”) ou para falar dos embalos de sábado à noite (“Dancin’ Days”).

Seu universo favorito era o da zona sul carioca, que usava como cenário em praticamente de todos os roteiros. Aproveitava este pano de fundo para criar personagens que caíam no gosto popular e não tinha medo de reutilizar fórmulas consagradas. Em 1977, por exemplo, Janete Clair colocou o país em polvorosa para saber quem havia matado o personagem Salomão Ayala. No ano seguinte, o próprio Gilberto havia usado a rivalidade entre irmãs para criar uma trama paralela em “Dancin’ Days” (com as atrizes Sônia Braga e Joanna Fomm). Em 1980, foi a vez de Braga juntar esses dois elementos em “Água Viva’: o antagonismo entre Miguel e Nelson Fragonard (Raul Cortez e Reginaldo Faria) e o assassinato do personagem principal, revivendo o mote “quem matou?”.

Ele mesmo iria novamente utilizar essa fórmula em “Vale Tudo”, um de seus maiores sucessos. Braga matou Odete Reutemann – uma grã-fina esnobe e sem caráter – e deixou a audiência perplexa com o desfecho do mistério. Mais uma vez, o autor usava a zona sul carioca para encaixar sua trama – mas, desta vez, teceu uma crítica ácida ao Brasil corrupto e sem escrúpulos que existia na época e insiste em continuar existindo, apesar dos esforços em contrário.

A trilha sonora desta novela, “Brasil”, de autoria de Cazuza, marcou essa virada: “Não me convidaram/ Pra esta festa pobre/ Que os homens armaram/ Pra me convencer/ A pagar sem ver/ Toda essa droga/ Que já vem malhada/ Antes de eu nascer”. O tempo passou e muita coisa mudou em nosso país. Mas a crítica contida nesta canção e na novela de Gilberto Braga ainda consegue ser atual.

Descanse em paz, Gilberto.

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