Muitas pessoas fazem comparações sobre Donald Trump e Jair Bolsonaro. Há, de fato, vários pontos em comum no discurso, comportamento e estratégias de comunicação. Ainda há uma dúvida: haverá semelhanças também na estratégia de reeleição? Estamos prestes a abrir os trabalhos de uma campanha eleitoral e, assim, a curiosidade a respeito da tática a ser adotada pelo presidente começa a surgir.
Muitos acreditam que Bolsonaro irá repetir a estratégia de 2018, batendo no PT, defendendo o conservadorismo de costumes e se mostrando como uma única solução de direita. Temos de lembrar, no entanto, de que houve uma pandemia entre os dois pleitos – e isso mudou muita coisa.
No caso de Trump, ele sofreu uma queda abissal de popularidade durante o combate à Covid-19 em seu país. Apesar disso, o ex-presidente americano continuou convencido até o último minuto (e talvez siga assim até hoje) que tinha feito um excelente trabalho e que as pesquisas de opinião eram mentirosas. Como ele perdeu as eleições, houve um sinal claro de descontentamento do eleitorado em relação à gestão republicana. Biden venceu por 306 votos a 232 no Colégio Eleitoral e também obteve a maioria dos votos populares (51,3 % contra 46,8 % — a diferença é decorrente dos sufrágios conquistados pelos candidatos independentes).
No livro “I Alone Can Fix It” (“Eu Posso Resolver Isso Sozinho”), de Carol Leonnig e Philip Rucker, sobre o último ano de Trump, há uma passagem interessante sobre a insistência do presidente em repetir o mesmo discurso de quatro anos antes.
Em maio de 2020, Trump foi procurado pelo ex-governador de Nova Jérsei, Chris Christie (republicano como o presidente). Christie começou a conversa dizendo que Trump iria perder a eleição se mantivesse o mesmo discurso. Ele disse o seguinte:
– Você está repetindo a campanha de 2016, mas não deveria fazer isso. Esse truque nunca funciona. Os tempos são diferentes. Você é uma pessoa diferente. O jeito que as pessoas percebem a sua candidatura é diferente. Seu oponente é diferente. Portanto, não faz a menor lógica repetir a mesma campanha.
Havia, porém, uma diferença: Trump também estava falando do passado, listando seus feitos como se fossem trunfos especialíssimos. O ex-governador percebeu essa sutileza e a criticou:
– Candidatos que vencem são aqueles que falam sobre o amanhã, não a respeito de ontem. Você está falando muito sobre o passado e precisa parar com isso. […] Os eleitores querem saber o que você vai fazer em seguida. Eles não querem saber o que você fez. Eles viveram esse passado e foram beneficiados ou não por suas ações.
Aqui talvez esteja a chance de Bolsonaro para virar o jogo: há algo que pode ser acrescentado em seu discurso. Essa novidade seria o novo programa de assistencialismo social, que ganhará uma expansão e cujo valor sofrerá um reajuste significativo em relação ao benefício já pago pelo extinto Bolsa-Família.
Ainda há dúvidas se o presidente poderá contar com o apoio da parcela mais miserável da população. Mas, se isso ocorrer e uma estratégia nova de campanha surgir, as chances de reeleição aumentam.
O problema é que, como Trump, Jair Bolsonaro também padece de uma teimosia titânica. Conseguirá ele se livrar do discurso lacrador que tanto agrada seus apoiadores mais fanáticos? Difícil. Muito difícil.