Estão em discussão as perspectivas de futuro além do ambiental e da economia verde. Para pensar em questões macro, especialistas, analistas, ensaístas e cientistas também olham para as relações de trabalho e a vida cotidiana. A pandemia exigiu adaptação ao home office para quem pôde fazê-lo. Agora a jornada híbrida está voltando. O trabalho daqueles que conseguiram manter seus empregos sustentou o consumo. Agora, imagine pedir aos cidadãos que desacelerem pelo bem do planeta? Como explicar que trabalhar consome kWh de energia, assim como café, roupas, comida, água – e que tudo isso que nos sustenta na rotina prejudica o planeta e, por consequência, a economia. É uma abordagem contraintuitiva de tudo que a larga maioria da humanidade urbana pós-industrial não está preparada para admitir. E como dizer isso aos dirigentes das empresas que estão buscando se reerguer?
São questionamentos legítimos, honestos e até capazes de gerar riqueza. Basta usar aquele tipo de inteligência que chamam de disruptiva. É aí que pode repousar o segredo do sucesso do uso dos recursos que nos dão qualidade de vida: acesso barato à água de qualidade, alimentos saudáveis a preços viáveis, ar limpo, algum verde e destinação correta aos dejetos e embalagens. Parece pouco para alguns, para outros, uma utopia. Mas se virarmos a chave, quem sabe a vida não fique tão pesada.
Como está desenhado, o mundo é anticíclico até para a política, como explica o artigo de Simon Kuper no Financial Times (FT), na última semana: “No momento em que a vida dos eleitores é prejudicada, com o aumento dos preços da energia, os governos abandonam o ativismo climático e lutam para que continuemos a aquecer o planeta”. Os governos correm para dar às populações mais poder de compra em troca de um melhor bem-estar social e maior produto interno bruto (PIB). De acordo com o FT, os governos deveriam dar às populações algo intangível e escasso: tempo.
O consumo é responsável por mais de 60% de todos os gases do efeito estufa na atmosfera, estimaram pesquisadores da Universidade Norueguesa de Ciência e Tecnologia em 2016. Quando os países ficam mais ricos, emitem mais CO2, pois ficam mais industrializados. Em 2018, as emissões dos EUA aumentaram 2,7%, um ano após o país deixar o Acordo de Paris. A semana de quatro dias úteis está sendo testada em alguns países, incluindo o Japão, e já é comum na Islândia. A semana de trabalho holandesa média é de 30,3 horas, a mais curta da Europa. E não é coincidência que a Holanda esteja entre os países mais felizes do mundo. Por lá, ninguém está ficando mais pobre por causa disso.
Um estudo global da Gallup estimou que apenas um em cada 5 trabalhadores de tempo integral se sente motivado. As pessoas precisam de atividade para se sentirem realizadas. Desde Paul Lafargue é sabido que o ciclo de oito horas diárias é a “dose mais eficaz” para o bem-estar, confirmaram pesquisadores das universidades de Cambridge e Salford em 2019, depois de avaliarem mais de 70 mil colaboradores britânicos. As sociedades mais ricas, não necessariamente são mais felizes. Vale observar o Japão. Desconsiderando alguns fatores culturais e indo ao extremo, um levantamento do Ministério da Saúde japonês divulgado em janeiro deste ano revelou que em 2020 foram registrados 20.919 suicídios no país, 750 a mais que em 2019. A quarta economia do mundo tem a maior taxa de infelicidade absoluta. É preciso refletir sobre o que pretendemos deixar para os que virão depois.
O filósofo sul-coreano Byung-Chul Han é implacável com o que chama de “sociedade do cansaço”, na qual vivemos pressionados, esgotados e deprimidos pelas exigências sociais, afetivas e profissionais de modo que nenhum entretenimento nos revigore. Contra o que chama de hiperprodução e hiperconsumo, ele prega “as coisas queridas”. Ou seja, criar o que nos apraz no ambiente do trabalho e em todos os locais. Ele defende rituais como zonas de conforto mentais que permitam a cabeça de qualquer sujeito funcionar de modo produtivo. É daí que ressurge uma abordagem que anda por aí sem despertar grandes atenções. Mais do que trabalhar, os profissionais querem alguma autonomia, que em outros termos, significa fugir dos processos padronizados. Sem isso, não há criatividade, portanto, a inovação fica enclausurada, estagnando a produção de conhecimento, que um passo adiante vai gerar o valor tão prezado e necessário à qualidade de vida e o progresso. Por isso, o desafio pode começar na produtividade. Trabalhe menos, trabalhe melhor, salve sua sanidade e o mundo. Senão, outros farão isso no seu lugar no futuro, mas será mais difícil para eles do que para você.