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Os velhinhos roqueiros e rebeldes

Nesta semana que passou, a ex-premiê Angela Merkel pediu que tocassem em sua festa de despedida uma canção da cantora Nina Hagen. A música (“Du hast den farbfilm Vergessen” – “Você esqueceu o filme colorido”) foi um sucesso de meados dos anos 1970 e gravada antes que Hagen (imagem) se tornasse um ícone da cultura punk. Merkel, de 67 anos, viveu sua juventude em uma década que não foi necessariamente marcada pela rebeldia dos anos 1960 ou pela estética contestadora dos anos 1980. Mas sua escolha musical mostra que estamos entrando em uma era na qual temos uma geração de velhinhos roqueiros em contraposição a jovens que idolatram gêneros musicais bem mais comportados.

Não deixa de ser bastante curioso. O conflito de gerações sempre contrapôs a rebeldia dos jovens contra o conservadorismo dos mais velhos. E essa visão conservadora cobria todos os aspectos da vida humana, do comportamento à política, passando principalmente pela estética (roupas, cabelo e música) e pela linguagem.

Um pessoa mais velha, dos anos 1950 até bem recentemente, trazia um pacote completo de conservadorismo consigo. Criticava o que achava ser promiscuidade dos jovens, o uso de drogas, as roupas espalhafatosas e os cabelos esquisitos. O cabelo masculino, inclusive, vale destaque nesse conflito de gerações: o topete dos anos 1950, os cabelos compridos da década de 1960, as madeixas andróginas de 1970 e os moicanos de 1980. Todas essas rebeldias capilares foram fruto de inúmeras discussões entre pais e filhos.

Evidentemente, aqueles que hoje estão se aproximando da chamada terceira idade (ou já estão nessa fase) têm uma visão mais antiquada de mundo. Foram criados na era analógica e podem não compreender direito o comportamentos dos jovens de hoje. Muitos criticam, por exemplo, a visão da juventude atual em relação à diversidade e opções individuais. Ou um eventual mimimi. Ou o alinhamento com práticas politicamente corretas.

O que temos de diferente, então?

No terreno da música, pelo menos, os velhinhos serão os rebeldes daqui para frente.

Quando eu era jovem nos anos 1980, usava um vistoso topete, me vestia de preto e frequentava uma casa noturna chamada Madame Satã, repleta de punks e skinheads. O som, pilotado pelos meus amigos Marquinhos MS e Magal (de vez em quando eu mexia nas pick-ups, pois tinha sido deejay profissional um pouco antes) era recheado de bandas independentes da Inglaterra.

Meu cabelo, além do topete, era quase raspado na base e não ostentava nenhuma costeleta. Naquela época, meu pai perguntou porque usava um penteado desses. Respondi questionando a razão pela qual ele não gostava do meu estilo capilar. Ele, então, disse: “Não consigo entender isso. Para mim, não ter costeleta é como não ter orelha”.

Naqueles anos 1980, eu era fanático por bandas como The Cure, Siouxsie & The Banshees e New Order (respectivamente, os líderes destes grupos são: Robert Smith, com 62 anos de idade, Siouxsie Sioux, 63, e Bernard Sumner, 64) Trata-se de um gênero musical que escuto até hoje, incluindo o rock clássico, como Beatles, Rolling Stones, Led Zeppelin, Deep Purple e Queen. Ou músicas dançantes dos anos 1970. Ou MPB antiga. Ou canções pop das décadas de 1970, 1980 e 1990. Como se vê, os mais velhos não acompanham a evolução (ou involução) musical e se mantêm escutando coisas antigas até seus últimos dias.

Talvez isso ocorra pela falta de identificação com a música atual. Ou por uma necessidade de relembrar o passado através do Spotify (o poder de retroceder no tempo através das canções antigas é impressionante).

Bem, enquanto eu era adolescente ou até um pouco mais crescido, os adultos ouviam Ray Conniff e similares (Paul Mauriat, Richard Clayderman e Percy Faith) – um tipo de música careta e bastante óbvia. Naquela época, inclusive, se esperava que, ao envelhecer, uma pessoa deveria abraçar esse gênero musical, que John Lennon definiu como “muzak” e muitos chamam de “música de elevador”.

Neste ponto, assim, os velhinhos (pelo menos a maioria) de hoje não perderam um traço de rebeldia – a sonora. Para mim, trata-se de um motivo de orgulho achar que música boa de verdade era a feita por John Lennon e Paul McCartney ou Robert Plant e Jimmy Page. Mas, ao mesmo tempo, fico imaginando o que a geração de minha filha de 13 anos vai dizer quando passar dos 50 anos de idade. Talvez algo na linha “bom mesmo era na época de Taylor Swift, Pedro Sampaio e Juliette Freire”. Será?

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