Em detrimento do interesse público e da livre concorrência, algo caro ao mercado e ao consumidor, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), deu celeridade ao requerimento de urgência do Projeto de Lei (PL) 3819/20, o PL do Transporte Rodoviário de Passageiros – ou PL do Ônibus. Se aprovado do jeito que está, coloca em risco 14 mil linhas de ônibus, 2,5 milhões de passageiros e 180 mil empregos, critica a Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia (Amobitec). Apesar de não ser ligado ao ramo, Lira atende aos interesses do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que tem participação societária em duas viações mineiras, a Real e a Santa Rita.
O texto cria uma série de empecilhos para que pequenas viações possam operar, principalmente em âmbito regional, fazendo com que as grandes empresas consolidadas se beneficiem, podendo prejudicar inclusive cooperativas de transporte fora dos grandes centros.
Para a Amobitec, as regras atuais já preveem um modelo de autorização para a prestação de serviços que garante segurança e qualidade para os usuários. “A promoção da concorrência no setor significa mais empregos, mais renda e serviços de melhor qualidade a um preço menor para todas e todos. A ANTT [Agência Nacional de Transportes Terrestres] trabalha desde o ano passado em uma nova regulamentação para organizar procedimentos de autorização e incorporar novas tecnologias ao mercado. Medidas restritivas afetam o novo marco regulatório, que já está em fase final após as audiências públicas”, afirma Flávio Prol, diretor-executivo da Amobitec.
De acordo com a ANTT, o mercado rodoviário brasileiro se caracteriza oligopólio e monopólio, em 66% das linhas há apenas uma empresa atuando, em 26%, duas e em somente em 8% operam três ou mais. Só setor de transporte rodoviário interestadual faturava, em média R$ 7 bilhões ao ano. O PL não muda o cenário, apenas aprofunda vícios em um momento que em outro modais de transporte, como o ferroviário e o marítimo de cabotagem, há modernizações vísiveis chegando.
O que diz o texto
Em tramitação na Câmara, a matéria tem origem no Senado, de autoria do senador Marcos Rogério (DEM-RO). O ponto central é criar regras para a prestação não regular de serviços de transporte terrestre coletivo de passageiros por meio de autorização, alterando a Lei de Reestruturação dos Transportes Aquaviário e Terrestre.
- Indicação: as empresas interessadas em operar linhas interestaduais e internacionais de passageiros serão obrigadas a indicar os mercados pretendidos especificando o itinerário, os horários e a frequência das viagens;
- Comprovação: a proposta exige que a empresa tenha frota própria capaz de atender a 60% das linhas pretendidas, capital social mínimo de R$ 2 milhões e inscrição tributária nos estados onde atuará, além da apresentação de um estudo de viabilidade econômica;
- Entraves: salvo no caso de inviabilidade técnica, operacional ou econômica, conforme o texto, não haverá limite para o número de autorizações de linhas. Ao analisar os pedidos, no entanto, a ANTT deverá considerar os mercados ofertados, o itinerário, os horários e as frequências mínima, a obrigatoriedade da oferta de gratuidades, os descontos tarifários previstos em lei, e requisitos de acessibilidade, segurança e capacidade técnica, operacional e econômica da empresa;
- Multas: no máximo de R$ 3 mil por infrações cometidas na prestação dos serviços. Estabelece que, até a data de publicação, as penalidades serão convertidas em advertência. Após a aprovação da lei, o valor será direcionado para ações de fiscalização e de educação.
Críticas
- Impede a entrada de novos atores no mercado;
- Pode deixar 416 municípios sem linhas regulares, já que muitas empresas pequenas não teriam como cumprir as regras;
- Coloca em risco 14 mil linhas de ônibus que atendem mais de 2,5 milhões de brasileiros;
- Dificulta o uso de novas tecnologias, como aplicativos que viabilizam viagens por demanda;
- Atropela todo o processo de criação de um novo marco regulatório que até já concluiu as audiências públicas.
O PL 3819/20