A ficção científica tem o poder de atiçar nossa imaginação e nos fazer imaginar, no escuro do cinema, como será o nosso futuro. Os roteiristas de Hollywood, no entanto, sempre foram otimistas em relação à evolução tecnológica da humanidade e previram algumas conquistas que estão ainda por vir.
Tomemos como exemplo a série “Perdidos no Espaço” produzida nos anos 1960. A família Robinson, no enredo, embarca em um disco voador, chamado “Júpiter 2”, para chegar ao sistema solar Alpha Centauri, em busca de um planeta para colonizar. O ano em que a trama ocorre? 1997. Este também, curiosamente, o ano em que as máquinas se rebelaram contra os humanos em “O Exterminador do Futuro”, produzido em 1984.
Se dependesse dos filmes “Blade Runner” e “De Volta Para o Futuro 2”, já teríamos carros voadores zanzando pelos nossos céus há muito tempo. A película estrelada por Harrison Ford se passa em 2019; já a produção em que Michael J. Fox faz o papel de Martin McFly mostra, dos anos 1980, o que aconteceria em 2015. Além de carros voadores, o ano de 2019 em que “Blade Runner” se passa tem androides construídos geneticamente e funcionando como escravos. Há colônias interplanetárias, o mundo é dominado pelos orientais e a poluição deixa o céu constantemente escuro.
Uma dos maiores sucessos do gênero é “2001 – Uma Odisseia no Espaço”. Mostra a história de um computador que se rebela em uma estação especial gigantesca (o nome da máquina – HAL – foi inspirado em “IBM”. Para batizar a inteligência cibernética do filme, utilizou-se uma letra anterior a cada uma que está no nome da empresa gigante da computação). A estação espacial internacional de hoje, bem menor que a imaginada pelo cineasta Stanley Kubrick, começou a ser montada pelos russos somente em 2001. Este filme teve uma continuação, chamada “2010 – O Ano em que Faremos Contato”. Como se sabe, os humanos ainda não conheceram nenhuma civilização extraterrestre.
Outro clássico da ficção científica é “Rollerball – Os Gladiadores do Futuro”, de 1975. A película apresenta um cenário alarmante, no qual o mundo é gerido pelas empresas, sem governo. O jogo que dá nome ao filme é violento e usado como uma ferramenta de catarse mundial. O ano em que essa distopia se passa? 2018.
“O Demolidor”, com Sylvester Stallone e Sandra Bullock, se passa em 2032 e teoricamente não deveria estar nessa lista. Mas parte do princípio de que o herói passou por um processo de animação suspensa em 1996 e mantido vivo por 36 anos. Como se sabe, não temos essa tecnologia nos dias de hoje, muito menos ela estaria disponível 26 anos atrás. Essa produção, aliás, tem uma ação de merchandising muito interessante. Todos os restaurantes do futuro são da rede “Taco Bell”, desde os mais simples até os ultrassofisticados. Quando Stallone pergunta a Bullock a razão disso, ela responde: “É que a Taco Bell ganhou a guerra das franquias”.
Voltando aos seriados de TV: “Terra de Gigantes” (produzido por Irwin Allen, também responsável por “Perdidos no Espaço” e outras séries, como “Viagem ao Fundo do Mar” e “O Túnel do Tempo”) tem como trama uma nave que faz um voo suborbital para Londres e enfrenta uma anomalia climática. Tripulação e passageiros vão parar em um lugar em que todos são enormes e eles, pequeninos. O ano quem que teríamos voos suborbitais comerciais? 1983.
Por que Hollywood tem essa tendência de apressar a evolução tecnológica de datas, criando um futuro que nunca aconteceu?
Entre as décadas de 1950 e 1960, o mundo experimentou quebras seguidas de parâmetros na tecnologia. Em setembro de 1962, John Kennedy disse: “Podem muito bem perguntar, por que escalar a montanha mais alta? Por que, 35 anos atrás, voar pelo Atlântico? Nós escolhemos ir para a Lua… Nós escolhemos ir para a Lua nesta década e fazer as outras coisas, não porque elas são fáceis, mas porque elas são difíceis; porque esse objetivo servirá para organizar e medir o melhor das nossas energias e habilidades, porque o desafio é um que estamos dispostos a aceitar, um que não estamos dispostos a adiar e um que temos a intenção de vencer, e os outros, também”. Em 20 de julho de 1969, Neil Armstrong cumpriu o objetivo traçado por Kennedy (e os russos, que até então disputavam a corrida espacial com os americanos, nunca mandaram uma tripulação para explorar o solo lunar).
Com a tecnologia se desenvolvendo rapidamente, a conclusão de todos os escritores de ficção científica foi a de que estaríamos criando colônias em Marte em questão de poucos anos. Mas, na década de 1970, os Estados Unidos resolveram diminuir a velocidade de seu programa espacial – e, assim, as conquistas cibernéticas começaram a rarear.
De qualquer forma, Hollywood sempre se pautou por estabelecer filmes de ficção cientifica com datas razoavelmente próximas às da atualidade, com o intuito de criar um elo mais próximo com o público. Uma exceção à regra é a série “Guerra nas Estrelas”, que usa o mote “muito tempo atrás, em uma galáxia muito, muito distante”.
Segundo um dos papas do gênero, Ray Bradbury, essa proximidade de tempo é necessária. “Ficção científica é qualquer ideia que surja em sua cabeça e ainda não existe, mas surgirá logo, mudando a vida de todos”, diz Bradbury. Ele, que criou a história que deu origem ao termo “efeito borboleta”, foi uma das maiores autoridades no assunto – e autor de “Fahrenheit 451”, uma história na qual uma ditadura torna os livros ilegais e prende leitores nos hospícios. Este roteiro também é um exemplo de futuro que nunca ocorreu. Mas, ao contrário dos exemplos anteriores, é o tipo de ficção que infelizmente tem ingredientes colhidos no presente e no passado da humanidade.