Por Luciano Costa
SÃO PAULO (Reuters) – Grandes petroleiras como a norte-americana Exxon Mobil, a britânica BP e a anglo-holandesa Shell têm avaliado com crescente interesse a possibilidade de entrar como sócias em projetos de geração de energia no Brasil para impulsionar vendas de gás ou aproveitar uma produção futura esperada em áreas do pré-sal, disseram à Reuters especialistas e uma fonte da indústria.
Com a movimentação, um leilão do governo brasileiro que contratará novas usinas de geração em agosto recebeu um recorde de inscrições de investidores com projetos de termelétricas a gás: 39 usinas, em um total de 28,6 gigawatts em capacidade, o que equivaleria a duas hidrelétricas como Itaipu, a maior do mundo em produção.
A capacidade em termelétricas cadastradas para o leilão ainda ultrapassou a de usinas eólicas, que somaram 27,1 gigawatts e têm sido tradicionalmente a fonte com maior volume de empreendimentos nas licitações dos últimos anos.
“Em 2017, foi uma boa surpresa a quantidade de investidores em empreendimentos a gás natural, e com investidores de grande porte, com as ‘majors’ do mercado de petróleo e gás vindo junto com os empreendedores, lastreando os combustíveis para essas térmicas. Foi uma grande surpresa e que se mantém para o leilão de 2018”, disse à Reuters o superintendente de projetos de geração na estatal Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Bernardo Folly de Aguiar.
A contratação efetiva nos leilões, no entanto, depende da demanda por energia, e o governo não divulga quantos projetos serão viabilizados para não interferir na competição.
Aguiar não citou os nomes das empresas que podem participar do leilão, mas um executivo de uma grande petroleira estrangeira disse à Reuters que existe uma tendência geral no setor de olhar para os projetos de geração de energia no país, até com mais intensidade do que em 2017.
“Vale para todas as companhias, para a indústria de petróleo como um todo. É um movimento óbvio e comum para todos”, disse o executivo da indústria, que falou sob a condição de anonimato porque não tem autorização para conversar com jornalistas.
Os investimentos de petroleiras estrangeiras não seriam os primeiros em térmicas no Brasil, mas a atuação dessas empresas ainda é embrionária no setor de termelétricas, dominado pela Petrobras.
Em dezembro passado, a BP assinou um acordo de investimento com a Prumo Logística para a aquisição de até 30 por cento de um projeto termelétrico da empresa no Porto do Açu, com 1,2 gigawatt em capacidade.
Já a Shell deverá fornecer gás para uma termelétrica que venceu um leilão de energia no final de 2017, a usina Vale Azul II, um empreendimento de 466 megawatts da Mitsubishi Hitachi Power Systems orçado em mais de 1,2 bilhão de reais.
Procurada, a Shell confirmou que “há neste momento um memorando de entendimento” para negociar o fornecimento de gás à usina Vale Azul II, que será construída no Rio de Janeiro.
A petroleira, no entanto, não quis comentar se pode se tornar sócia nessa usina ou em outro projeto de termelétrica no Brasil.
“De maneira geral, a Shell está continuamente avaliando oportunidades de investimentos que sejam compatíveis com seus objetivos financeiros e com o seu objetivo estratégico de ampliar seu negócio de energia elétrica em todo o mundo”, disse a companhia, em nota.
A Exxon não respondeu a um pedido de comentário. A BP não quis comentar.
PETROLEIRAS SE MEXEM
A busca das petroleiras por negócios no setor elétrico do Brasil vem em meio a uma grande oferta global de projetos para produção de Gás Natural Liquefeito (GNL) e com a perspectiva de uma futura produção de gás associado ao petróleo em áreas do pré-sal brasileiro, disse o professor do Grupo de Economia da Energia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (GEE-UFRJ), Edmar de Almeida.
“Esse é, vamos dizer, o ‘plano A’ das petroleiras para o gás delas no Brasil, já que a Petrobras controla os outros mercados. O que sobra para elas é tentar vender o gás para os projetos termelétricos”, afirmou.
Ele disse ainda que os contratos oferecidos nos leilões de energia brasileiros, que preveem a compra a produção das térmicas a gás por 25 anos, são vistos como valiosos porque garantem uma demanda de longo prazo para o fornecedor de combustível e podem ser até utilizados como lastro para financiamentos.
“Isso para elas é muito importante, porque há muitos projetos de GNL no mundo, e elas têm dificuldade de arrumar contratos de longo prazo. Por isso o interesse crescente dessas grandes empresas internacionais, como BP, Exxon e outras”, apontou.
Além disso, muitas das petroleiras apostam no gás como uma tecnologia “de transição” entre os poluentes combustíveis fósseis e a eletricidade, que tem crescido como fonte energética até para o abastecimento de veículos, em um movimento que só deve ganhar velocidade.
“Essas empresas são muito grandes e têm muita capacidade de investimento. E estão enxergando estrategicamente um futuro com talvez uma desaceleração do mercado de petróleo, mas com potencial de crescimento no mercado de energia elétrica”, disse o sócio da área de eletricidade da EY, Marcos Quintanilha.
“A maneira de as petroleiras transformarem a expertise que já têm em óleo e gás em energia elétrica é esse, geração a gás. E parece que isso está se constituindo em algo bastante interessante”, adicionou.
As termelétricas a gás respondem atualmente por menos de 10 por cento da capacidade de geração elétrica instalada no Brasil, onde predominam as hidrelétricas.
Mas especialistas têm comentado que o papel do gás deve crescer na matriz, devido à dificuldade do país para avançar na construção de novas usinas hídricas e à expansão de fontes com geração variável, como os parques eólicos e solares.
(Edição de Roberto Samora)