Brigar só por brigar é um esporte que as pessoas praticam desde a Idade da Pedra Lascada. Neste mundo polarizado politicamente e vivido cada vez mais nas redes sociais, porém, percebe-se que essa atividade se expandiu como nunca. Vemos centenas de milhares de indivíduos, diariamente, em busca de discussões inócuas e que não levam a lugar algum. Infelizmente, esse fenômeno já deixou de ser exclusivo das redes: ganhou os podcasts e os portais de notícias, chegando até a imprensa tradicional.
Há colunistas, de direita e de esquerda, que adoram entrar em uma discussão interminável apenas porque são fissurados em uma polêmica (percebe-se ainda que, para alguns desses debatedores do inútil, uma discussão é apenas o veículo para extravasar seus sinais exteriores de vaidade).
Há dois ingredientes principais nessas narrativas, além da imodéstia: a raiva e o desprezo pelo outro lado. Em alguns casos, o furor pela discussão sai do veículo onde o articulista trabalha e chega aos grupos de WhastApp que frequenta. Este é o momento em que o círculo se fecha. A agressividade das redes ganha a imprensa, que retroalimenta o universo digital.
Grupos de WhatsApp, desde que foram criados, vão se moldando à narrativa que prevalece entre a maioria dos participantes. Dessa forma, vários membros acabam atuando para reforçar o ponto de vista dos colegas e criar um consenso aparente. Mas, recentemente, pudemos ver outra ocorrência: uma mudança no comportamento dos voyeurs cibernéticos, aqueles que nunca emitem uma opinião, mas seguem a convicções dos outros, lendo-as cuidadosamente mesmo sem concordar com elas. Entretanto, esses seguidores calados começaram a se manifestar – e, com isso, acabaram criando confusões em determinadas comunidades digitais.
Grupos que reuniam entusiastas da chamada Terceira Via começaram a sofrer deste fenômeno. Há, obviamente, aqueles que se aglutinaram em torno de uma das candidaturas de segundo turno sem grande fricção. Mas, em outros, começou-se uma discussão fomentada pelos que antes ficavam quietos e agora colocam suas opiniões em cima da mesa.
Há casos em que a pressão é muito forte, com direito a mensagens do administrador do grupo a quem está em desacordo. Esse tipo de atitude ocorre até porque existem hoje poucos elementos racionais na discussão política brasileira. Quando os ânimos ficam exaltados, os debates saem prejudicados.
Nessas horas em que os grupos pegam fogo, criam-se trincheiras virtuais, acompanhadas de discussões paralelas. Um post discordante acaba gerando uma combinação entre os membros que se unem diante de uma só ideia — a postagem de várias mensagens seguidas, na esperança de soterrar digitalmente aquele texto indesejável. Mas os debatedores estão ficando espertos e republicam a sua opinião, mantendo o desconforto em alta.
Não seria mais fácil, para o bem dos nossos relacionamentos futuros, tentar entender por que as pessoas têm posições diferentes das nossas? Talvez isso possa revelar um pouco mais sobre quem está próximo de nós – ou de nós mesmos. O fato é que, daqui a três semanas, um dos lados vai prevalecer. E teremos de lidar com esse lado vencedor durante quatro anos. Se a polarização se estender por este período (o que é provável), a gestão do novo presidente será sacudida constantemente no próximo quadriênio. Se isso realmente ocorrer, teremos um fenômeno que se autoalimentará, ampliando rivalidades e radicalismos. O final deste filme não pode ser feliz – e, pelo andar da carruagem, todos poderão sair perdendo no final.