Nessa pinimba entre o presidente Jair Bolsonaro e o ministro Alexandre de Moraes (imagem), todos nós saímos perdendo. A cada movimento desses dois personagens, vai aumentando a expectativa de uma crise irreversível entre Poderes e o surgimento de uma situação incontornável. Não é mais o caso de se perguntar quem começou essa queda-de-braço. O fato é que a disputa foi longe demais e precisa de panos quentes.
Vamos deixar de lado, por um instante, quem tem razão do ponto de vista técnico. Quando se está em uma disputa como essa, é preciso entender o outro lado e saber seus limites. Moraes, pelo jeito, acredita que pode dobrar o presidente Bolsonaro aumentando a pressão sobre ele ou seus familiares. Ledo engano. Essa atitude somente alimenta a cólera do presidente, que fica dando entrevistas nas quais descasca o ministro do STF e fica imaginando formas de neutralizar a força institucional do Supremo. O ministro quer dobrar alguém que não se conforma em ser provocado e derrotado.
A ideia de usar os parlamentares eleitos na Câmara e no Senado para propor novas vagas no STF nasceu justamente dessa tensão. Com a liberdade de indicar mais dois ou quatro votos, o presidente poderia equilibrar as forças no tribunal. O problema é que essa ideia pode ser interpretada como um arroubo ditatorial em função do que já ocorreu antes na história do Brasil e da América Latina.
Dois exemplos explicam esses receios. O primeiro veio em 1965, no Ato Institucional número 2 (AI-2), que elevou o colegiado do Supremo de 11 vagas para 16. O segundo foi o movimento feito por Hugo Chavez, na Venezuela, que ampliou as vagas no Supremo local e alinhou os três poderes abaixo de si, oficializando sua ditadura.
As duas lembranças são ruins e levantam suspeitas de quem acredita existir fogo quando se vê fumaça. Some-se isso ao estilo brucutu de Bolsonaro, que exagera no discurso agressivo, e teremos uma enormidade de pessoas que enxerga maneirismos antidemocráticos por parte do presidente neste movimento.
Se as últimas pesquisas estiverem certas, a rejeição de Bolsonaro continua alta. Mas, como esses estudos são justamente do Datafolha e do Ipec, os que mais erraram sobre a performance do presidente no primeiro turno, podemos levantar o benefício da dúvida sobre os números divulgados (o quadro deve ficar menos confuso quando as demais enquetes forem publicadas).
O que se percebe, no entanto, é que existe no centro uma rejeição à figura de Bolsonaro, mas não em relação à administração. É como se Bolsonaro fosse rejeitado na pessoa física e aprovado na jurídica. Outro dia, escutei de um empresário que tem verdadeira ojeriza aos modos do presidente: “Vou votar no Paulo Guedes”. Uma amiga, também empresária, abandonou a Terceira Via ainda no primeiro turno e abraçou a candidatura Lula. Outro amigo, do mercado financeiro, vai simplesmente anular o voto. Esses três cenários são compatíveis com os índices de reprovação que correm pelos institutos de pesquisa.
Mas há também uma significativa massa de apoio ao presidente vinda de um eleitorado conservador que fecha os olhos às deficiências de Bolsonaro ou aos arroubos populistas – tão criticados, antes, quando praticados por Lula ou Dilma Rousseff. Os conservadores, no fundo, apostam no pragmatismo para derrotar o PT. Será que haverá tempo hábil para conseguir virar o jogo e trazer os eleitores que se abstiveram ou votaram nulo e branco para o segundo turno? Trata-se de uma tarefa hercúlea, mas não impossível.
Outro dia, fontes do comando geral bolsonarista estavam animados com a perspectiva de Lula ter batido em seu próprio teto de eleitores. Mas e se Bolsonaro também chegou ao seu limite de crescimento? Neste caso, a única saída é tentar desconstruir o adversário.
Os eleitores, pelo jeito, estão em sintonia com essa estratégia. Segundo a pesquisa Ipec, 46% do eleitorado devem votar em Lula para derrotar Bolsonaro. Na via oposta, 33 % dos eleitores devem votar no presidente para evitar uma vitória petista. Isso claramente mostra que, para a maioria da população apta a votar, o sufrágio é mais contrário a um candidato do que a favor de outro. Neste cenário, críticas exacerbadas e fake news devem dominar as discussões entre eleitores e postulantes à presidência.
Portanto, preparem-se. Os próximos debates prometem todo o tipo de pancada – incluindo golpes abaixo da cintura.