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Exame: Shein cresce 300% no Brasil e fatura R$ 8 bilhões

Relatório do BTG Pactual estima resultados da varejista chinesa e aponta que players brasileiros voltados para a alta renda devem ter sucesso em 2023

A Shein faturou R$ 8 bilhões no Brasil em 2022, um salto de 300% em relação a 2021. Em outros termos: há dois anos, a empresa chinesa era do tamanho da Hering, maior varejista de moda básica do país. Hoje, já ultrapassou a projeção anual para todo o Grupo Soma, como mostram os analistas Luiz Guanais, Gabriel Disselli e Victor Rogatis, do BTG Pactual. Em um cenário econômico ainda bastante incerto, com os efeitos da inflação persistindo no bolso do consumidor, o banco aponta que a varejista não deve parar tão cedo. Uma dor de cabeça e tanto para quem compete no mesmo nicho, mas uma bem menor para quem está direcionando seu olhar para a alta renda. 

É esse o veredito que fica da cuidadosa análise. E que ganha ares práticos: enquanto os papéis da C&A tiveram um downgrade de “Compra” para “Neutro”, o BTG aponta que as principais escolhas no setor ficam com Arezzo, Grupo Soma e Track&Field, expostas a um público que pode gastar mais e que tem carregado os resultados do setor: a maior parte do crescimento do varejo de moda (de 21% em 2021 e de 16% no acumulado até novembro de 2022) foi sustentada por marcas voltadas para os consumidores mais abastados, comportamento que também deve permanecer em 2023.

“A indústria global da moda se recuperou de forma acentuada nos últimos dois anos. Mas, em um mercado frágil como o de hoje, as expectativas de uma recuperação contínua podem desaparecer rapidamente. E, como a economia continua a mostrar sinais contraditórios [menor desemprego, mas ainda alto endividamento das famílias e erosão do poder de compra], a desaceleração deve permanecer heterogênea, como foi o caso há cerca de dois anos, quando o segmento começou a se recuperar”, afirmam os analistas.

De olho no cenário macroeconômico mais duro para as varejistas locais, levando em consideração todos esses fatores e o custo de capital mais caro com os juros em patamares elevados por mais tempo, o banco refez as estimativas de ganhos para sete delas (Arezzo, Renner, Grupo Soma, Track&Field, Vulcabras, Marisa e C&A) para os próximos quatro anos. Na média, as estimativas de receita desse grupo ficaram 3,5% menores, seguidas por um Ebitda reduzido em 10%. Por fim, o lucro líquido ficou 17% menor.

O relatório mostra que a maior receita anual, nas estimativas de 2022, fica para a Renner, com R$ 11,6 bilhões, resultado 22% maior do que o registrado em 2021. A menor, dentro dessa análise, fica com a Marisa, com R$ 2,2 bilhões, crescimento de 11% na mesma base de comparação. Nenhuma das empresas analisadas, nem mesmo as que vendem para a alta renda, estão no mesmo patamar de crescimento do que a Shein. Para direcionar a atenção a quem compete por um nicho similar, a primeira linha do balanço da varejista chinesa equivale à soma de C&A e Marisa. Lembrando que a marca de fora do país, totalmente digital, desembarcou por aqui em plena pandemia. E já arrasta uma legião de “fãs”.

De acordo com dados da SimilarWeb compilados pelo BTG, em novembro do ano passado, 45% do tráfego da empresa vem de mecanismos de busca (Google) e o tráfego direto é de 43%, indicando uma alta proporção de consumidores leais. O que isso significa em perspectiva? Bem, olhando principalmente para o tráfego direto, Arezzo e Schutz são as únicas empresas nacionais a superarem a varejista chinesa, o que já é um ponto positivo. Mas ainda não superaram a Shein no tempo gasto dentro do aplicativo. Isso porque, em grande parte, a empresa de fora do país conseguiu transformar a experiência de olhar o app como um passatempo, uma forma de diversão, um ponto ainda não alcançado em totalidade pelas empresas nacionais. 

Além de olhar a “vitrine”, fato é que consumidores compram cada vez mais por lá. Mesmo as cifras não sendo as mais baratas praticadas pela varejista em comparação a outros países: no Brasil, os itens são 111% mais caros do que nos Estados Unidos (ajustando por poder de compra). Um dos pontos que podem levar a isso, segundo o BTG, tem a ver com complexidades regulatórias e logística, pontos que já fizeram outros varejistas de fora desanimarem com o país. Em certa medida, é o caso da Zara, que tem seus produtos 102% mais caros no Brasil do que nos EUA (ajustado por poder de compra). Mas no qual, curiosamente, varejistas chinesas triunfam. Além da Shein, a Shopee já tem 30% do seu GMV no país vindo de categorias ligadas ao vestuário, o que dá aproximadamente R$ 6 bilhões, nas contas dos analistas. 

Ou seja, em meio aos efeitos persistentes de inflação elevada e de uma consequente recuperação desigual na retomada do consumo, o que o consumidor — especialmente o de classes menos abastadas — quer, mesmo, é preço baixo para ficar na moda. A empresa lança 10 mil produtos por mês, o que dá, em dois meses, o equivalente da produção da Zara em um ano. Além disso, encontrar um local em que possa encontrar roupas que sirvam ao seu tamanho. Dois pontos atendidos pela varejista chinesa, mesmo que os “looks” ainda demorem por volta de 20 dias para chegarem à casa dos consumidores. 

São trunfos que vêm acompanhados de uma série de poréns, igualmente difíceis de serem esquecidos: critérios ESG nada claros, denúncias de plágio e questões em relação ao pagamento de impostos no país também estão frequentemente associados à imagem da Shein. Mas, a percepção que fica no Brasil de 2023 é que não são suficientemente nocivos para que o consumidor deixe de comprar ali para optar por uma produção mais cara. 

Até quando esse preço tão mais baixo vai durar é uma questão importante, que também aparece no relatório. Com a varejista chinesa optando por um marketplace com cada vez mais vendedores locais, diversificação de estoque e lojas temporárias (pop-up), os analistas apontam que há um futuro promissor ainda à frente, mas que vai demandar queimas de caixas maiores, o que vai colocar em jogo a estratégia dessas empresas. Lembrando que a maré não está para peixe, mesmo com todos os avanços: uma matéria publicada pelo Financial Times mostrou que a Shein pode perder US$ 36 bilhões em valor de mercado na próxima rodada de captação. O que demanda cuidado extra com os gastos e pode, sim, gerar aumento de preços.

“Apesar de desenvolver uma proximidade maior com o Brasil, esses movimentos também significam que a Shein deve competir dentro das mesmas condições do que fabricantes e varejistas locais, o que pode levar a preços maiores, e enfrentar desafios similares para escalar a produção local, um desafio e tanto para outros pares globais como a Zara, o que nós vemos como uma vantagem competitiva para players estabelecidos, como Renner, Arezzo e Soma”, afirmam os analistas.

A potencial vantagem não traz, necessariamente, um jogo ganho. Apesar de o varejo de moda no Brasil ter crescido 16% no acumulado até novembro de 2022, os analistas apontam uma alta sensibilidade a preços, com os volumes próximos aos do pré-pandemia. Some isso a um ambiente mais complexo, com novos desafios relacionados a cadeia logística, atrasos de produção, altos custos de envio e falta de matéria-prima e inflação no setor ainda elevada. O resultado são preços maiores, que podem ainda minar espaço de quem compete por quem é mais sensível ao preço.

Não tem jogo ganho, mas o crescimento da varejista chinesa não deixa de impressionar. Por todo esse conjunto, os analistas continuam vendo a Shein como um destino importante de compras no Brasil, com potencial de se tornar ainda maior em breve. Para uma empresa que cresceu 300% em um ano no país, a mensagem já ficou clara: a varejista chinesa está longe de ser moda passageira.

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Por Karina Souza

Publicado originalmente em: bityli.com/D7BdK

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