A tecnologia pode ser interessante, mas ainda não resiste a um questionamento com trocadilho de quinta série
“Lugar de repórter é na rua atrás de notícias”; “Quando não se sabe como está a clima lá fora, a missão do jornalismo é abrir a janela”. Esses adágios contaminam a mente de qualquer jornalista desde a faculdade e jamais devem ser abandonadas. Ir atrás, escutar pessoas de qualquer grau de importância para compor mapas mentais, ter uma agenda gorda, contar com a confiança de autoridades ou especialistas que possam lhe confiar bastidores de questões de interesse público sem serem revelados, checar, conferir, fazer contas e depois empacotar tudo em texto, áudio, vídeo, gráfico e imagem. Pelo manual, é assim que deve ser feito – mas nem sempre conseguimos.
Daí vem um executivo amigo comentar que a inteligência artificial vai superar o trabalho dos jornalistas. Sorri com enfado. De novo isso? É o que o Google está prometendo essa semana. Na quarta-feira (19), um porta-voz da big tech declarou que a ferramenta de IA apelidada de Genesis poderá ajudar jornalistas em opções de títulos ou diferentes estilos de escrita para aumentar a produtividade dos profissionais. Também afirmou que essa tecnologia está no estágios iniciais e que jamais iria substituir o elemento humano na “reportagem, criação e verificação de artigos”.
O New York Times publicou que o Google manteria conversas com Washington Post, Wall Street Journal e o próprio NYT. Antes, a Association Press (AP) anunciou uma parceria com a OpenAI, dona do ChatGPT, para sua aplicação em notícias. E o que se tira daí, pelo menos por enquanto, é que a IA quer fazer tudo, menos o principal. Menos o que sustenta as empresas noticiosas.
E é o principal que conta, afinal. Olhar na cara do sujeito e perceber que ele está mentindo ou te enrolando, como já vi fazerem políticos, artistas, empresários, criminosos e gente comum vale dinheiro. Artificial e gabineteira por natureza, a IA não faz campana em matagal para flagrar uma empresa despejando lixo em manancial, nem atrairia a confiança de uma mãe que teve o filho executado, muito menos receberia uma ligação no meio da noite de uma fonte contando que aconteceu tal coisa, tampouco escutaria de um presidenciável que a vida só anda direito com terapia, ansiolítico e fins de semana ao lado de amigos do ensino médio para falar bobagens.
O melhor exemplo para o planeta corporativo é colocar uma máquina para tocar uma negociação complicada. Sem a certeza do olho no olho, a observação do gestual, os detalhes mínimos ficariam para trás. Justamente o que dá a certeza subjetiva de que um negócio meio ruim naquele momento pode ser a salvação logo adiante. Um fotógrafo já falecido me contou que certa vez, no início da carreira, topou um trabalho que pagaria mal só para não ficar parado em casa. Foi para um lugar lá no fim do Brasil. Voltou com imagens fantásticas do formigueiro humano do então garimpo de Serra Pelada, no Pará, ainda desconhecido do mundo. Só com os direitos de reprodução das fotos resolveu sua vida financeira e deu um salto na carreira.
A IA pode ser divertida, mas ainda não resiste a um questionamento com trocadilho de quinta série – todos os filhos fazem isso. Seus bancos de dados não se traduzem em sabedoria, lampejos de compreensão e interconexões aleatórias de informação – sem contar a consideração pelo ponto de vista das minorias ou os indiretamente prejudicados por alguma decisão político jurídica, incidente ou acidente. Isso ainda é com os humanos. Pelo menos para aqueles que não ficam apenas sentados em sua mesas só olhando para a tela.
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Uma resposta
Muito bom.
Ainda não temos IA que suje os sapatos…