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O alvo da vez é Alexandre Garcia. E depois?

Não sou e nunca fui fã do jornalista Alexandre Garcia. Acredito que um profissional de imprensa pode e deve ter suas convicções políticas, mas precisa ao menos tentar observar o cenário de forma ponderada, levando em consideração os diversos lados que cercam um determinado acontecimento. Com Garcia, depois que saiu da TV Globo, isso raramente acontece: ele sempre comenta algo sob um único viés. Às vezes concordo com ele; em outras ocasiões, discordo. Mas nunca leio seus textos ou vejo seus vídeos de forma relaxada.

Comecei a semana, no entanto, ao lado deste jornalista veterano. Em vídeo no qual comentava a tragédia climática que deixou 46 mortos no Rio Grande do Sul, ele disse que o problema não havia sido causado apenas pela chuva. “No governo petista foram construídas, ao contrário do que recomendavam as medições ambientais, três represas pequenas, que aparentemente abriram as comportas ao mesmo tempo. Isso causou uma enxurrada”, afirmou.

Em resposta, o ministro da Justiça, Flávio Dino, disse que irá mandar a Polícia Federal se ver com o jornalista de 82 anos. “Reitero que fake news é crime, não é ‘piada’ ou instrumento legítimo de luta política. Esse crime é ainda mais grave quando se refere a uma crise humanitária, pois pode gerar pânico e aumentar o sofrimento das famílias. A Polícia Federal já tem conhecimento dos fatos e adotará as providências previstas em lei”, escreveu o ministro em uma conta de rede social.

O comentário de Garcia, para variar, faz contorcionismos para culpar o PT por uma catástrofe natural. O conceito de represa pequena é relativo e precisa ser devidamente investigado. Além disso, o jornalista insinua alguma participação do governo tucano de Eduardo Leite na calamidade, pois as comportas dos reservatórios teriam sido abertas simultaneamente (ora, se as represas encheram ao mesmo tempo, o que poderia ser feito?).

Que Alexandre Garcia muitas vezes dá opiniões que não necessariamente correspondem à realidade não chega a ser novidade – e sua repercussão, geralmente, se dá dentro do universo de bolsonaristas ou conservadores independentes, onde ele ainda possui credibilidade. O problema, aqui, é a reação do ministro da Justiça.

Ao brandir a bandeira das fake news, Dino ameaça um profissional de imprensa com a polícia federal. Usar os instrumentos repressivos do Estado para ameaçar um jornalista? Já vimos esse filme no passado e protestamos. Por que deveríamos ficar calados agora?

Mesmo que nada aconteça com Garcia, fica a mensagem: não se meta com o PT, que podemos mandar a PF atrás de você.

Hoje, é um expoente da direita que é admoestado por Flávio Dino – e isso até provoca aplausos por parte de alguns sites de esquerda. Mas é o caso de perguntarmos: essa atitude repressora ficará restrita apenas aos direitistas empedernidos ou pode respingar no centro ou mesmo na esquerda?

Existe um caminho melhor para quem se incomoda com opiniões irresponsáveis – o da Justiça. Nos anos 1990, o jornalista Paulo Francis acusou, sem provas, a diretoria de Petrobras de assaltar os cofres públicos (bem antes da Operação Lava-Jato). “Os diretores da Petrobras todos põem o dinheiro lá… (Suíça) tem conta de 60 milhões de dólares…um amigo meu advogado almoçou com um banqueiro suíço e eles falaram que bom mesmo é brasileiro (…) que coloca 50 milhões de dólares e deixa lá”, disse, no programa Manhattan Connection.

A diretoria da estatal processou Francis em Nova York, pedindo uma indenização de US$ 100 milhões. Dizem que a preocupação com o processo foi uma das causas do infarto que matou o jornalista.

Não se deseja, evidentemente, o mesmo fim para outros profissionais de imprensa boquirrotos. Mas, ao mesmo tempo, não se pode ameaçar o uso da Polícia Federal a cada comentário indesejado que o ministro da Justiça ouvir. Vamos botar a bola no chão e deixar as chuteiras longe das canelas alheias. Ficou incomodado? Processe. Mas deixe a Polícia Federal longe desses assuntos.

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Comentários

Respostas de 2

  1. Se fake news precisa de investigação e cadeia, porque não investigam o Babysauro sobre ter enviado notícias falsas ao STF que resultou no ato do ministro Toffoli de não admitir as provas da delação da Odebrecht?

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