Nos anos 1980, a IBM, até então um dos maiores fabricantes de PCs, tinha um apelido entre os clientes da Apple. Naquela época, esses computadores tinham uma interface gerenciada pelo sistema DOS, da Microsoft, que era feio e sem praticidade – especialmente quando comparados com os Macintosh, criados por Steve Jobs, que tinham um ambiente gráfico e intuitivo (bastante parecido com as máquinas Apple de hoje). O apelido dado pelos macmaníacos à IBM era “incredibly boring machines” (“máquinas incrivelmente monótonas”). Isso ocorria não só pelo uso da plataforma DOS, mas também pelo fato de que os lançamentos da marca eram marcados apenas por upgrades de memória e capacidade. Raramente a IBM surgia com alguma novidade tecnológica ou rompia paradigmas, encantando usuários.
Ontem, a Apple lançou o iPhone 15 e repetiu a saga da antiga IBM, lançando um aparelho que apresenta mais do mesmo. Os grandes destaques? Tem agora uma câmera com resolução altíssima e mudou o plugue com o qual é carregado (agora, usa-se a tomada USB-C, que também é utilizada no sistema Android). Diante desse lançamento, que não traz nenhuma novidade significativa, é o caso de pensar: Steve Jobs autorizaria um lançamento tão sem graça?
Provavelmente não.
A Apple iniciou a revolução digital de fato com o lançamento do primeiro smartphone. E foi surpreendendo os usuários a cada nova versão do iPhone, ampliando sua utilidade e tornando-o uma ferramenta imprescindível no cotidiano de qualquer pessoa. Isso fez surgir uma infinidade de concorrentes – e vários, hoje, oferecem aparelhos que são até melhores que os da Apple em termos estritamente técnicos.
Depois que Jobs morreu, em 2011, a Apple foi se acomodando irremediavelmente. Hoje, parece ser uma sombra do furacão inovador que já foi, quando era comandada por um líder que não se conformava com a evolução comportada. Jobs tinha ideias e desafiava sua equipe a criar soluções técnicas para viabilizá-las. Exemplos disso não faltam: a tela sensível ao toque, a possibilidade de criar sequências aleatórias de música e a possibilidade de usar o recurso de zoom em uma imagem. Jobs teve a ideia e mandou a equipe encontrar um jeito de viabilizar o que havia imaginado.
Hoje, não existe na companhia alguém com esse tipo de visão. Um executivo que, como Jobs, consiga enxergar algo que as pessoas desejam ansiosamente, mas ainda não sabem que possuem essa necessidade. Ou que quebre paradigmas ao pensar de um jeito diferente e muito longe do lugar-comum.
A enorme quantidade de memes que surgiram na internet na tarde de ontem mostra que o consumidor está cansado de pagar caro pela mesma coisa que já tem – ou com alguns upgrades que maquiam o resultado final. Atualmente, há vários celulares da concorrência que possuem a mesma eficiência e estão à frente da Apple em termos de tecnologia.
A empresa ainda sobrevive da imagem do passado e de soluções de design que começam a cansar. Até quando sobreviverá a mística da companhia? A Apple precisa desesperadamente de um novo líder, que a coloque de vez nos trilhos da inovação e torne, novamente, o iPhone em um objeto de desejo.