E isso é bom para a Argentina!
O movimento austro-libertário tem as melhores ideias. Elas continuam sendo discutidas, elaboradas e defendidas intelectualmente. Mas como as ideias certas podem ser implementadas? De que adianta estar certo se a realidade é de esquerda? Na verdade, a maior parte da população, ou pelo menos a opinião pública, parece estar se afastando cada vez mais para a esquerda, com a cultura do cancelamento, a histeria climática, um estado de bem-estar social em expansão e impostos e taxas cada vez mais elevados.
As ideias e teorias certas existem, mas ainda não foram postas em prática com sucesso. Como isso pode ser mudado? É claro que as ideias são importantes, mas também devem ser divulgadas, de baixo para cima, das raízes à superfície. É um processo árduo. E houve um progresso inegável nos últimos anos. No entanto, o zeitgeist de esquerda está passando por cima das liberdades dos cidadãos quase sem impedimentos; mais chocantemente durante a crise de Covid. A esquerda tenta pintar qualquer um que se interponha no caminho do zeitgeist como um extremista ou mesmo um nazi.
Neste contexto, o que seria uma estratégia bem-sucedida? Murray Rothbard abordou esta questão num artigo no Relatório Rothbard-Rockwell intitulado Populismo de Direita: Uma Estratégia para o Movimento Paleo. Sua contribuição é inovadora e voltada para o futuro. Ele antecipa os sucessos de Donald Trump nos Estados Unidos e, mais recentemente, de Javier Milei na Argentina.
O fenômeno Javier Milei
Javier Milei está causando impacto em todos os lados, desde que venceu as primárias para a presidência da Argentina, em 13 de agosto de 2023. Na mídia alemã, ele é descrito como de ultradireita e ultralibertário. Recentemente, o Financial Times tratou do anarcocapitalista confesso numa coluna, na qual o autor insinuava que o libertário Milei seguiria a estratégia do populismo de direita desenhada por Murray Rothbard em 1992. Isso levanta a questão de se essa afirmação é verdadeira e o que é exatamente este populismo de direita.
Segundo o paleolibertário Rothbard, o programa do populismo de direita inclui oito pontos principais:
- Cortes fiscais radicais;
- Redução radical do estado de bem-estar social;
- Abolição de privilégios para minorias “protegidas”;
- Esmagar criminosos;
- Livrar-se dos vagabundos;
- Abolição do Federal Reserve;
- Um programa America First (antiglobalista e isolacionista);
- Defesa dos valores familiares tradicionais.
Na verdade, o manifesto eleitoral de Milei está muito alinhado com o populismo de direita e o paleo-libertarianismo de Rothbard. Milei quer reduzir radicalmente os impostos. Ele não se cansa de chamar os impostos pelo que são, roubo. Ele também quer destruir radicalmente o estado de bem-estar e gosta de ilustrar a redução dos gastos do governo e a sua proposta de reduzir os ministérios argentinos de 18 para oito com uma serra elétrica. Seu “Plano Motosserra” pretende reduzir radicalmente o estado.
Milei fala repetidamente da igualdade perante a lei como um princípio liberal fundamental e quer abolir os privilégios para as minorias. Como resultado, ele entra repetidamente em conflito com feministas radicais que defendem privilégios legais para as mulheres.
A prisão de criminosos também está na agenda de Milei. A liberdade de armas está em seu programa para que as vítimas possam se defender dos criminosos. Aqueles que se recusam a trabalhar não serão mais suportados pelo estado na sua Argentina.
Milei também tem o sexto ponto de Rothbard em sua agenda: Milei quer abolir o banco central da Argentina. Usando a retórica populista de direita, ele pretende fisicamente explodir o banco central. Ao fazê-lo, eliminaria o poder de um dos bancos centrais mais inflacionários, que financiou voluntariamente todos os programas de gastos peronistas e kirchneristas. Ele quer dolarizar o país e abri-lo à concorrência monetária.
Milei também coloca seu próprio país em primeiro lugar: Argentina em primeiro lugar. O populismo de direita opõe-se à agenda globalista. Ele corta a ajuda ao desenvolvimento, os programas climáticos e as aventuras militares. Milei gosta de salientar que a Argentina era um dos países mais ricos do mundo no início do século XX graças às políticas liberais clássicas e foi destruída pelo socialismo no século XX. Em 35 anos, promete Milei, a Argentina poderá ser uma superpotência novamente. O pré-requisito para que isso aconteça é um retorno ao libertarianismo.
Finalmente, Milei também defende os valores familiares tradicionais e se opõe à assunção estatal das responsabilidades familiares. O veemente oponente do aborto defendeu diversas vezes o direito à vida em debates com feministas radicais.
Milei foi economista-chefe de diversas instituições e professor de economia. Ele é um seguidor da Escola Austríaca de Economia – um de seus cães se chama Murray. Ele contribuiu com um capítulo ao Festschrift em dois volumes em homenagem a Jesús Huerta de Soto, editado por David Howden e por mim. Há alguns anos, ele foi convidado via zoom no meu seminário no nosso mestrado em Economia Austríaca, que oferecemos em Madrid, e falou sobre a sua estratégia.
Resumindo, Milei é um de nós. E ele pode vencer as eleições. Ele pode se tornar presidente da Argentina. Um austríaco. Um anarcocapitalista. Com um programa eleitoral libertário abertamente radical. Num país que há décadas presta homenagem ao socialismo. Incrível!
Milei está há anos muito presente no debate público na Argentina. Ele ganhou fama como convidado de um talk show polarizador, discutindo ferozmente. Mais tarde, ele decidiu criar o seu próprio partido para liderar a guerra cultural contra o socialismo e o estatismo de forma mais eficaz e para levar as ideias certas a mais pessoas.
A sua estratégia retórica nos debates é vociferante, beligerante e por vezes percebida como ofensiva (se é que a verdade pode ser ofensiva). Ele não se deixa intimidar ou menosprezar pelos formadores de opinião de esquerda. Num debate, ele simplesmente grita mais alto que os esquerdistas, a quem chama de “zurdos”, e os interrompe para dizer-lhes na cara que estão dizendo uma estupidez absoluta e não têm ideia do que estão falando. ‘Vocês deveriam ler Hayek, Mises e Rothbard primeiro”, Milei recomenda a eles. Ele também chama esquerdistas e políticos de parasitas e ladrões, num debate. Pois impostos são roubo.
Mantendo a estratégia de populismo de direita de Rothbard, ele nomeia claramente os aproveitadores do aparelho estatal. Ele critica repetidamente a casta de políticos e burocratas. Ele os chama de parasitas que vivem às custas dos cidadãos trabalhadores e decentes. Os políticos são completamente inúteis e não poderiam viver sem os argentinos produtivos. A política não é a solução, mas o problema. E os políticos são parte do problema. Desta forma, Milei conquista os argentinos decentes que mais sofrem com o jugo do estado. Igualmente claras são as suas observações sobre o conceito de justiça social. A chamada justiça social é uma injustiça monstruosa porque significa tratamento desigual das pessoas perante a lei. É uma válvula de escape para a inveja e o ressentimento.
A natureza emocional e polêmica de Milei ressoa em muitos, especialmente entre os jovens. Depois de vencer as primárias em meados de agosto, ele tem esperanças legítimas na presidência argentina.
Uma boa revolução
Os sucessos de Milei tornaram-se um tema de conversa diária, especialmente no mundo hispânico. Fala-se de Milei com espanto e apreço. Conhecidos e amigos enviam pequenos vídeos de suas joias retóricas. As ideias libertárias estão de volta à moda. As pessoas estão se aventurando com opiniões libertárias, em todos os lugares e de forma inesperada. A janela das opiniões públicas e permissíveis está mudando na direção da liberdade. Obrigado a Milei.
Independentemente de o carismático Milei vencer as eleições, a sua campanha desencadeou um movimento libertário jovem e poderoso. O seu triunfo nas primárias pode ser mais significativo do que a Revolução Ron Paul de 2008 e 2012. O fato incrível é que ele é bem-sucedido. Com um populismo de direita que Rothbard recomendou, num país degradado, com a sua personalidade carismática, com uma retórica agressiva. Nada é impossível. Até um libertário pode vencer uma eleição democrática. É a estratégia que conta. Vamos Javier! Viva la libertad, carajo!
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Por Philipp Bagus
Publicado originalmente em: https://curt.link/i2lG