O surgimento das redes sociais criou mudanças profundas em nossas vidas. De uma hora para outra, começamos a interagir com pessoas que não conhecíamos ou com quem pouco falávamos. E, ao entrar nesse território, passamos a falar com pessoas que penavam diametralmente diferente de nós. Enquanto estávamos em redes como Facebook e Instagram, o nível dessa interação era intenso, mas limitado. Com o surgimento de ferramentas como WhatsApp e Telegram, porém, a possibilidade de se criar embates diários se consolidou.
As pessoas têm um comportamento diferente quando estão diante dos outros. A polidez e as regras de etiqueta social acabam por nos reprimir. É constrangedor, para a maioria das pessoas, usar de uma linguagem agressiva ao vivo e em cores. Em frente a uma tela de smartphone, no entanto, tudo pode acontecer. Pessoas polidas ao extremo podem perder as estribeiras em questão de milésimos de segundo.
Isso trouxe debates acalorados, que se intensificam durante as eleições, e estragou vários relacionamentos – incluindo amizades de anos. Assuntos como política, religião e futebol têm esse poder destrutivo. Mas, presencialmente, o nível de agressividade dificilmente chega ao nível da ruptura. No mundo digital, contudo, é olho por olho e dente por dente, sem nenhum limite.
Já temos alguma vivência digital. A experiência nos mostrou o quão destrutivo é esse comportamento. Muitas pessoas, diante deste aprendizado, resolveram não mais brigar na ribalta digital.
Além disso, o convívio através da tecnologia foi ensimesmando os indivíduos. Não é à toa, portanto, que aplicativos de inteligência artificial que fazem os usuários interagirem com chatbots que emulam seres humanos estão crescendo no mundo inteiro. Os que mais ampliam suas bases de usuário, hoje, são o Replika e Character AI.
Quando juntamos a falta de vontade de discutir com uma certa tendência ao egocentrismo, chegamos a um fenômeno recente: o falso diálogo. Essa prática também pode ser definida como a existência de monólogos simultâneos.
Como isso ocorre?
Alguém posta um determinado assunto em um grupo ou rede social. Outra pessoa coloca uma resposta na qual discorda discretamente. Em seguida, há uma tréplica que reforça os argumentos de quem iniciou a interação. Mas o que se vê, em seguida, é cada um demostrando opiniões sem necessariamente se engajar em um debate direto. Cada um está circunscrito dentro de um campo e defende sua posição. É como um jogo de futebol no qual a bola está no centro e os dois times encastelados em duas defesas.
Ainda que esse tipo de comportamento não cause brigas diretas, pode ser prejudicial para um determinado relacionamento, mesmo que virtual. Sem o confronto, as pessoas não resolvem diferenças e ficam restritas a uma relação superficial.
Talvez seja melhor copiarmos o que diz as campanhas publicitárias de bebidas alcoólicas: brigue com moderação. Mas não deixe de pôr à prova seus argumentos e ponto de vista. O debate é uma das grandes ferramentas para evoluirmos intelectualmente. Portanto, se for o seu caso, abandone o falso diálogo. A vida é melhor com a troca de ideias.