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As intermináveis mentiras governamentais sobre o mercado

“O Federal Reserve System tem autoridade supervisora e regulatória sobre uma vasta gama de atividades e instituições financeiras”. Essa talvez seja a exposição mais incompleta e suavizada do século

O propósito de todo o governo é permitir que aqueles que estejam em seu comando possam pilhar aqueles que não estejam.  Por toda a história, os governos utilizaram da violência, da intimidação, da coerção e do homicídio em massa para impor esse sistema.  E as “justificativas” do governo para tal comportamento são, em todas as circunstâncias, um dilúvio de mentiras — que misturam sua suposta benevolência, altruísmo, heroísmo e grandeza, com mentiras igualmente graves sobre os “malefícios” da sociedade civil, em especial do livre mercado.

A atual crise econômica mundial, provocada pelos bancos centrais — comandados pelo Fed — e suas políticas monetárias de crédito fácil, entre outras intervenções, fez com que, mais uma vez, os culpados de sempre fossem apontados: “pouca regulamentação” e muita liberdade.

Será que as pessoas algum dia irão se dar conta de que essa é a maior de todas as grandes mentiras dos governos?

Peguemos exemplos da história americana.

Quando os Peregrinos [primeiros colonos ingleses, calvinistas, que fundaram em 1620 a colônia de Plymouth, no Nordeste dos EUA] chegaram à América, eles quase morreram de fome, pois adotaram um sistema de agricultura comunal.  Ao perceber esse erro, William Bradford, líder da expedição Mayflower, reorganizou os peregrinos de Massachusetts em um regime de propriedade privada sobre a terra.  Os incentivos criados pela propriedade privada prontamente criaram uma impressionante reviravolta econômica, e o resto da história todos sabem.  Entretanto, a maioria dos livros de história ignora essa realidade, e coloca a culpa da fome dos Peregrinos na ganância corporativa da companhia Mayflower.

Após a Revolução Americana, havia se tornado imperativo construir estradas e canais para que o comércio pudesse se expandir e a economia, prosperar.  Alexander Hamilton, o Secretário do Tesouro do presidente George Washington, declarou em seu famoso Relatório sobre Manufaturas que a construção de estradas e canais privados jamais daria certo sem subsídios do governo.  Albert Gallatin, o Secretário do Tesouro do presidente Thomas Jefferson, concordou.  Enquanto os políticos discutiam, os mercados de capitais privados e a indústria privada de “estradas com pedágio” estavam ocupados financiando milhares de quilômetros de estadas privadas sem qualquer assistência governamental.  Quando o governo de fato interveio nessa fase inicial de construção de estradas, foi uma catástrofe financeira em quase todas as regiões.  O estrago foi tanto que, já em 1860, apenas dois estados — Missouri e Massachusetts — ainda não tinham feito emendas em suas constituições proibindo que o dinheiro do contribuinte fosse utilizado em “melhorias internas”.

Os americanos foram ensinados em suas escolas públicas que a Revolução Industrial pós-1864 foi ruim para a classe operária, o que tornou necessária a regulação governamental sobre o trabalho e os salários, bem como a criação e o desenvolvimento de sindicatos.  Na realidade, as pessoas saíram das fazendas agrícolas e foram para as fábricas porque estas ofereciam salários e condições de trabalho muito melhores.  Entre 1860 e 1890, os salários reais aumentaram em 50% nos EUA, e uma miríade de novos produtos foi inventada e disponibilizada em abundância para o trabalhador comum, graças ao baixo custo da produção em massa.  Foram os investimentos em capital que aumentaram dramaticamente a produtividade da mão-de-obra, permitindo que as horas trabalhadas declinassem de uma média de 61 horas por semana em 1870 para 48 horas por semana já em 1929.

Essa maior produtividade laboral, estimulada em sua maior parte pelos investimentos em capital feitos por empreendedores e investidores privados, também permitiu que as famílias não mais fossem forçadas a colocar seus filhos para trabalhar.  O trabalho infantil já vinha minguando ao longo de décadas quando o governo resolveu regulá-lo e proibi-lo.  E quando ele o fez, foi visando proteger a mão-de-obra sindicalizada contra a concorrência, e não para proteger as crianças das severas condições de trabalho.

Os “barões ladrões” [adjetivo dado aos industriais americanos do final do século XIX] não roubaram ninguém.  A maioria deles ganhou sua fortuna fornecendo bens e serviços valiosos — para não dizer revolucionários — para as massas a preços bons e baixos durante décadas.  John D. Rockefeller, por exemplo, fez com que o preço do petróleo refinado caísse de 30 centavos de dólar por galão em 1869 pra 8 centavos em 1885, e continuou derrubando seus preços por muitos anos seguintes.  James J. Hill construiu a mais eficiente e lucrativa ferrovia transcontinental sem utilizar um centavo de subsídio governamental.  Como recompensa por seus extraordinários feitos no livre mercado, o governo processou ambos — em um tribunal faz-de-conta — lançando mão de leis “antitruste” protecionistas.  Os verdadeiros “ladrões” foram empresários que tinham conexões políticas.  Empresários como Leland Stanford, um ex-governador da Califórnia e senador, que teve êxito em aprovar leis que garantiam à sua empresa um monopólio sobre as ferrovias californianas.

As leis federais antitruste foram aprovadas — começando pela Lei Sherman Antitruste de 1890 — porque o governo disse aos americanos que a indústria estava se tornando “desenfreadamente cartelizada” ou monopolizada.  Na realidade, os preços em todos os lugares estavam despencando, e novos produtos e serviços estavam sendo inventados por todos os cantos.  Todo o período entre 1865 de 1900 foi um período de deflação de preços.  Como mostrei em meu livro How Capitalism Saved America, todas as indústrias acusadas de serem monopólios pelo Congresso em 1889-1890 vinham derrubando seus preços havia pelo menos uma década, graças a uma vigorosa concorrência.  E isso não foi resultado da estúpida teoria da “precificação predadora” [quando empresas vendem seus produtos a preços abaixo de custo para aniquilar a concorrência atual e/ou potencial].  Nenhum empresário racional iria intencionalmente perder dinheiro durante décadas precificando abaixo de seus custos na esperança de que, de alguma forma, ele iria espantar toda a concorrência para sempre.

Outro embuste: “todo mundo sabe” que o presidente Herbert Hoover foi um firme defensor da economia laissez-faire, e que foi sua ausência de intervencionismo que causou a Grande Depressão.  Essa é de longe a maior mentira governamental da história americana.  Hoover era um “progressista” (como os socialistas atuais gostam de se autodenominar).

Hoover intimidou e coagiu os executivos das empresas a aumentar os salários dos trabalhadores em uma época em que os salários precisavam se reajustar para baixo, seguindo a lógica do livre mercado, para que o desemprego fosse minimizado.  Ele direcionou 13% do orçamento federal para um fracassado programa de “estímulos” — que consistia em gastanças desmesuradas — e impôs alguns dos maiores aumentos de impostos da história para poder financiar toda a farra.  Ele foi um protecionista que assinou a famosa Tarifa Smoot-Hawley, que aumentou as alíquotas médias de importação para quase 60%, o que gerou uma guerra comercial mundial que fez com que o comércio mundial encolhesse 66% em três anos.  Ele cartelizou a agricultura criando “conselhos agrícolas” que inventaram a insana prática de pagar fazendeiros para não cultivar suas plantações ou não criar gado.  Ele foi o pioneiro da politização dos mercados de capital ao criar a Reconstruction Finance Corporation [empresa do governo americano criada para fazer empréstimos para vários setores da economia, principalmente bancos e ferrovias].  E fazia inúmeras invectivas e diatribes contra os “capitalistas gananciosos”, lançando inúmeras “investigações” governamentais sobre investidores e o mercado financeiro.  Rexford Tugwell, o principal conselheiro de Franklin Roosevelt, disse que ele e seus companheiros do New Deal “devemos muito a Hoover”, que foi quem começou muitas das políticas que eles simplesmente continuaram e expandiram.

Atualmente nos EUA, toda vez que o preço da gasolina aumenta significativamente o Congresso convoca inquisições para investigar executivos da indústria petrolífera, fazendo-os depor perante uma comissão no Senado bem ao estilo dos julgamentos de Nuremberg.  Essa prática começou na década de 1970, quando a própria — e estúpida — política de congelamento dos preços da gasolina adotada pelo governo provocou uma enorme escassez, fazendo com que o governo tivesse de encontrar alguém em quem colocar a culpa.  As petrolíferas nunca são elogiadas quando os preços da gasolina caem, como ocorreu no ano passado nos EUA, quando o preço caiu de US$ 4/galão para menos de US$ 2/galão em várias regiões do país.

Ainda mais recentemente, diz-se que a atual crise econômica foi causada pelos “excessos” da liberdade econômica e pela “escassa regulação” da economia americana, principalmente dos mercados financeiros.  Isso é dito por Obama e por inúmeros outros políticos, todos de cara lavada, não obstante o fato de haver uma dúzia de ministérios subordinados ao Executivo, mais de 100 agências federais, mais de 85.000 páginas no Federal Register [publicação diária do governo americano que contém as regulamentações emitidas pelas agências do governo], e mais dúzias de agências governamentais estaduais e municipais que regulam, arregimentam, tributam e controlam cada aspecto de cada empresa americana — e isso vem sendo feito há décadas.

O ‘frenesi laissez-faire’ nos mercados financeiros também é apontado como uma das causas da crise atual.  Mas apenas o Fed — uma organização secreta governamental que é isenta de prestar contas e que nunca sofreu uma auditoria — desempenha centenas de funções reguladoras, além de manipular imprudentemente a oferta monetária.  E ele é apenas uma das numerosas agências reguladoras do sistema financeiro (entre outras, há a SEC [cuja função é idêntica à nossa CVM], a Controladoria da Moeda [que licencia, regula e supervisiona todos os bancos dentro dos EUA], o Office of Thrift Supervision [que fiscaliza as instituições de poupança e crédito], a FDIC [agência federal que tem como objetivo garantir os depósitos feitos em bancos comerciais], além de várias outras reguladoras estaduais).

Em uma publicação do Fed intitulada “O Federal Reserve System: Propósitos e Funções”, lê-se que “O Federal Reserve System tem autoridade supervisora e regulatória sobre uma vasta gama de atividades e instituições financeiras”.  Essa talvez seja a exposição mais incompleta e suavizada do século.  Dentre as funções do Fed estão a regulação de

– Bank holding companies (companhias que controlam bancos)

– Bancos dos estados que são membros do Federal Reserve System

– Atividades estrangeiras de bancos membros

– Atividades nos EUA de bancos estrangeiros

– Edge and agreement corporations (instituições com o propósito limitado de contratar negócios com bancos estrangeiros)

– Agências no exterior de bancos membros;

– Agências nos EUA e representações de bancos estrangeiros;

– Atividades não bancárias de bancos estrangeiros;

– Bancos nacionais (com a Controladoria da Moeda)

– Instituições de Poupança

– Subsidiárias não bancárias de bank holding companies

– Thrift holding companies (companhias que controlam instituições de poupança)

– Informes financeiros

– Políticas contábeis dos bancos

– Continuidade dos negócios em caso de emergência econômica

– Leis de proteção ao consumidor

– Operações de títulos feitas pelos bancos

– Tecnologia da informação utilizada pelos bancos

– Investimentos estrangeiros feitos pelos bancos

– Sucursais bancárias

– Fusões e aquisições bancárias

– Quem pode ser dono de um banco

– “Critérios de suficiência” de capital

– Extensões de crédito para a compra de títulos

– Empréstimos que privilegiem a igualdade de oportunidades

– Transparência de informações sobre hipotecas

– Compulsórios

– Transferências eletrônicas de fundos

– Passivos interbancários

– Condições sobre empréstimos feitos a hipotecas subprimes sob os moldes do decreto CRA

– Todas as operações bancárias internacionais

– Arrendamentos (leasing)

– Privacidade das informações financeiras dos consumidores

– Pagamentos sobre depósitos à vista

– Relatórios sobre “crédito justo”

– Transações entre bancos membros do Fed e seus afiliados

– Gerenciamento da poupança

– Gerenciamento do crédito

Trata-se de uma lista bastante abrangente, resultado de 96 anos da construção de um império burocrático empreendido pelos burocratas do Fed.  Desmente por completo a noção de que houve “escassa regulação” dos mercados financeiros.  Qualquer um que faça tal argumento ou é ignorante ou é um mentiroso.

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Por Thomas DiLorenzo

Publicado originalmente em: https://encurtador.com.br/fuCFN

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