Sou um grande fã do comediante americano Jerry Seinfeld (ele não é exatamente uma unanimidade, sei disso). Não perdia um episódio de seu programa de TV – e até hoje vejo as reprises no streaming, me divertindo como se estivesse assistindo pela primeira vez. Aquele programa, por não ter exatamente uma trama forte, era recheado de situações do cotidiano para piadas aleatórias. Por isso mesmo, muita gente dizia que era um seriado sobre o nada – pois nada de relevante acontecia com os personagens.
Nesta semana, no entanto, vi um trecho do “Tonight Show”, no qual Jimmy Fallon entrevistava Seinfeld sobre o lançamento de seu mais recente filme. Parecia um stand-up a dois, com o anfitrião generosamente servindo de escada para que seu entrevistado brilhasse. Logo de início, ele diz que odeia férias em família. E solta a seguinte pérola:
“Quando eu faço uma coisa que eu não gosto, isso não me incomoda. Eu sou uma pessoa muito feliz, odiando tudo o que eu faço durante a minha vida. É assim que eu me descreveria. Isso é difícil para a minha mulher. Ela fica chateada quando eu não tenho uma boa experiência, mas eu não fico [chateado]. Por quê? Porque eu sabia que aquilo ia ser chato. E daí eu vou me queixar – e isso é uma coisa que eu realmente gosto de fazer. Eu adoro me queixar. O meu show inteirinho se resume às minhas queixas. Eu tento fazer com que tudo soe como entretenimento, mas, no fundo, sou eu me queixando sobre as coisas”, disse ele.
Foi uma verdadeira revelação sobre o programa “Seinfeld”. Não é um show sobre o “nada”. É um seriado a respeito de queixas e reclamações sobre coisas que não têm muito sentido, mas fazem parte de nosso dia a dia.
A declaração de Jerry Seinfeld, no entanto, me fez refletir: será que eu também sou uma pessoa que gosta de reclamar?
Durante a minha reflexão, percebi que tenho vários amigos que adoram reclamar das coisas. Alguns deles, como Seinfeld, parecem viver para isso. Aliás, tenho até a impressão de que eles (e elas) entram em algumas roubadas apenas como pretexto para poder se queixar sobre o que aconteceu com os outros.
Infelizmente, esses amigos não têm a mesma verve e humor do comediante americano – e não parecem ser pessoas felizes o tempo inteiro. E quanto a mim? Bem, eu me queixo com frequência, é verdade. Mas geralmente reclamo de meia dúzia de acontecimentos específicos, tendo o trânsito insuportável de São Paulo no topo do pódio (olha a reclamação implícita…).
Voltando a Seinfeld: na mesma época em que esteve no programa de Jimmy Fallon, ele deu uma entrevista ao podcast da revista New Yorker, chamado “Radio Hour”. Neste bate-papo com um dos editores da publicação, David Remnick, ele voltou as suas baterias para os esquerdistas e os ativistas politicamente corretos. Ele se queixa, basicamente, do final de comédias agudas ou seriados cômicos que lidavam com temas controversos. “Agora, onde elas estão? Onde estão? Este é o resultado da extrema-esquerda e da m… politicamente correta – e das pessoas que se preocupam tanto com a possibilidade de ofender outras pessoas”. A saída para o humor, ele diz, é o stand-up.
“As pessoas vêem comédia stand-up porque ela não é policiada. O público faz isso. Sabemos quando estamos fora do tom. Sabemos instantaneamente. E nos adaptamos a isso, também instantaneamente. Mas quando você escreve um roteiro e ele passa por quatro ou cinco mãos, comitês, grupos diferentes (‘aqui está nossa opinião sobre essa piada’), bem, esse é o fim da comédia”, cutuca ele.
Muitas vezes, eu quero me queixar também das barreiras estabelecidas pelos arautos do movimento politicamente correto. Mas será que vale a pena fazer isso? Isso, porém, é tema para outra coluna.