Nos últimos tempos, em maior ou menor escala, na cidade de São Paulo vota-se mais contra alguém (ou alguma corrente política) do que a favor de um candidato específico. Trata-se de um fenômeno que permite a ascensão de nomes desconhecidos ou de políticos que não têm grande carisma, mas se transformam em símbolos de resistência a alguma candidatura que é rejeitada.
Alguém dúvida? Vamos revisitar brevemente o que aconteceu nas três últimas eleições.
Em 2016, João Doria conseguiu vencer no primeiro turno ao insistir em um bordão que agradou em cheio os eleitores paulistanos: “Não sou político, sou gestor”. Essa foi a primeira eleição que refletiu os efeitos da Operação Lava Jato, com prisões de gente ligada ao PT, o partido do então prefeito Fernando Haddad. Aquele foi o início de um processo de rejeição aos políticos profissionais, que aumentaria fortemente em 2018 e favoreceu alguém que surgia como uma alternativa ao sistema e era frontalmente contrário ao Partido dos Trabalhadores.
No pleito municipal seguinte, Bruno Covas era o prefeito em exercício e teve como adversário no segundo turno o candidato do PSOL, Guilherme Boulos. Já naquela época, Boulos sofria uma grande rejeição do centro e da direita. Covas não era exatamente um político carismático, passava por um sério problema de saúde e sua atuação durante a pandemia tinha sido alvo de grandes críticas. Mas ele representava a alternativa a Boulos, cuja imagem era tida como radical demais para boa parte da classe média. Resultado: o placar final foi de 60% a favor do prefeito.
Em 2024, pela segunda vez consecutiva, tivemos um vice que virou titular concorrendo com Guilherme Boulos. E as primeiras pesquisas mostram uma vantagem folgada de Ricardo Nunes em relação à candidatura da esquerda. Chama bastante atenção, inclusive, os primeiros registros de rejeição de Boulos: segundo o Datafolha, 58% dos eleitores paulistanos não votariam nele de jeito nenhum.
Ou seja, uma eventual vitória de Nunes poderá ser creditada a um movimento contrário a Boulos. Portanto, mais uma vez a maioria do eleitorado de São Paulo estará contra alguém, favorecendo Nunes porque não quer o deputado federal do PSOL.
Dentro deste escopo, uma parte dos votos destinados a Pablo Marçal também são de protesto. Há uma insatisfação latente contra os políticos profissionais, como Nunes, e em direção à esquerda, representada por Guilherme Boulos. Neste caso específico, porém, houve uma multidão que se encantou com a figura de Marçal e votou a favor dele.
Pode-se gostar ou não do ex-coach, mas é inegável que ele, sem tempo nenhum no rádio ou na televisão, conseguiu uma votação expressiva e quase foi ao segundo turno. O que poderia ter acontecido se ele tivesse acesso ao fundo eleitoral ou à campanha eleitoral gratuita? Trata-se de uma incógnita interessante, pois Marçal teria maior exposição para o bem e para o mal – e seus tropeços (como a divulgação de um laudo falso sobre Boulos) também teriam maior repercussão.
Quando o público se alinha pragmaticamente ou ideologicamente a um candidato, seus defeitos ou suas falhas são automaticamente relevadas. O importante, neste cenário, é derrotar alguém que representaria um mal maior. É exatamente o que observamos hoje em São Paulo. Boulos possui 58% de rejeição, apesar dos esforços do candidato em se colocar como um político mais ponderado e longe dos radicalismos. A imagem do deputado, no entanto, parece estar solidificada no imaginário do eleitor. Por isso, sua rejeição deve reeleger o prefeito em 27 de outubro.