A vitória de Donald Trump nos Estados Unidos animou o conservadorismo brasileiro e propiciou um debate sobre as verdadeiras chances da direita nas próximas eleições presidenciais. O ex-presidente Jair Bolsonaro, por exemplo, disse que a eleição do republicano foi “um passo importantíssimo” para voltar ao poder. “É igual a uma caminhada de mil passos, você tem que dar o primeiro, tem que dar o décimo”, afirmou Bolsonaro.
O sucesso trumpista nos EUA, de fato, mostra que um ícone do conservadorismo pode voltar à presidência após perder uma eleição para um rival ideológico — e Bolsonaro já disse que é o único candidato que poderia derrotar o petismo no próximo pleito. Mas, antes de mais nada, é preciso perguntar: ele poderá se candidatar daqui a dois anos?
Por enquanto, não. Ele continua, segundo o Tribunal Superior Eleitoral, inelegível. O Congresso se articula para tentar reverter a inelegibilidade através de uma anistia – mas isso pode gerar uma batalha jurídica, uma vez que o Supremo Tribunal Federal não deve concordar com uma inciativa dessas.
Uma das esperanças do bolsonarismo é que Trump faça algum tipo de pressão – inclusive de tarifas alfandegárias – para pressionar o governo de Luiz Inácio Lula da Silva a permitir a candidatura do ex-presidente. Mas será que o novo mandatário americano iria se meter em uma questão interna para favorecer um aliado? Se pressionar Lula, Trump estará jogando o Brasil no colo da China e da Rússia. Isso não seria bom para a política externa dos Estados Unidos.
Muitos petistas, no entanto, torcem para que Bolsonaro seja candidato em 2026, pois consideram que a polarização será revivida e isso pode elevar as chances de Lula – ou de quem for o nome da esquerda.
É por isso que o secretário de comunicação do PT, Jilmar Tatto, disse que seria hora de retomar a tal frente ampla criada em 2022. “Qual é a tarefa do governo Lula agora? Recompor o governo à luz do que aconteceu na disputa municipal, na eleição do Trump e do que está acontecendo no Congresso. O momento é agora. Temos que começar a olhar os partidos que estarão conosco efetivamente. Partidos de centro”, afirmou Tatto à “Folha de S. Paulo”.
O problema, para os petistas, é que existe um desafio maior do que amplificar o apoio das legendas centristas ou turbinar a comunicação do governo. Tanto nos Estados Unidos como aqui, a grande questão é lidar com a rejeição que se cria após quatro anos de poder.
Foi assim com Trump e Bolsonaro em 2020 e 2022, respectivamente. Ocorreu com Joe Biden e os democratas em 2024 e pode ocorrer com Lula daqui a dois anos. Por isso, é preciso fazer uma leitura apurada do que está ocorrendo na sociedade para corrigir o rumo do barco.
Mas, aparentemente, o PT não quer mudar muita coisa. E o discurso do próprio Tatto indica essa predisposição. “Temos que trazer o centrão para o nosso lado. Não tem nada de levar o PT para o centro. O PT está no lugar dele. É um partido de esquerda que quer fazer reformas estruturantes e que no momento está nessa grande articulação para evitar retrocessos do ponto de vista da democracia e da sociedade”, disse.
Gleisi Hoffmann, presidente do Partido dos Trabalhadores, vai na mesma toada. “Eles [a direita] vêm com tudo. O Bolsonaro já deu a linha. A gente tem qie se preparar para o enfrentamento. Fizemos isso em 2022. Faremos de novo”, avaliou a petista.
A derrota de siglas como PT e PSOL nas eleições municipais e a vitória de Trump nos Estados Unidos mostram que há sinais de desgaste no discurso da esquerda. O apelo de programas sociais como o Bolsa Família já não é o mesmo de antes – e pautas ligadas à cultura woke, como o identitarismo, fazem as forças conservadoras se unirem em torno de um candidato de direita.
Parece que o PT deseja, de um lado, atrair os moderados e, ao mesmo tempo, aprofundar o discurso raiz. Há, no entanto, uma flagrante incompatibilidade entre as duas intenções. Só haveria uma solução para o dilema petista: aproximar o partido do centro. Mas isso, pelo menos por enquanto, está fora de questão.
Enquanto não fizer uma correção de rumo, o PT ficará à deriva. Será que vai conseguir se recompor a tempo? Isso vai depender da boa vontade do presidente Lula. Por ora, Bolsonaro está adorando ver o parquinho da esquerda pegando fogo.