Um estudo feito pela consultoria Bain & Company mostra que 50 milhões de consumidores, ao redor do mundo, deixaram de comprar bens de luxo ao longo deste ano. Com isso, as grandes empresas do setor, como LVMH, Burberry e Kering (YSL, Gucci, Bottega Veneta e Balenciaga, entre outras marcas) devem registrar resultados abaixo das metas estabelecidas para 2024.
Uma das consequências deste fenômeno é o fato de a LVMH deixar de ser a empresa mais valiosa de Europa, com uma capitalização de mercado de US$ 311,43 bilhões. Agora, a companhia do Velho Continente com maior capitalização regional (US$ 428 bilhões) é a Novo Nordisk, da Dinamarca. Trata-se do laboratório que fabrica os medicamentos Ozempic e Wegovy.
Os analistas da Bain apontam duas razões para isso. A primeira é de cunho macroeconômico. A inflação na China fez com que o poder de compra dos chineses caísse, ao mesmo tempo que minou a confiança desses consumidores. Outro motivo seria o aumento de muitos preços nesse mercado sem que houvesse um crescimento correspondente em qualidade, serviços ou inovação no design.
Mas outra razão pode explicar a queda do consumo de alto luxo: a forte expansão das redes de lojas das grifes mais elegantes do mercado. Com pelo menos uma loja em todas as grandes cidades do mundo, essas marcas deixaram o status inatingível e passaram a ser incorporadas ao dia a dia dos consumidores.
Um dos poucos exemplos de faturamento crescente neste segmento é justamente de uma empresa que faz uso de um conceito chamado luxo silencioso: a Hermés. No último trimestre, a empresa faturou cerca de US$ 4 bilhões, o equivalente a um crescimento de 11,3% em relação ao mesmo período do ano passado.
O conceito explorado pela Hermés refere-se a um estilo de luxo que não chama atenção de forma ostensiva ou exagerada. O que empresas com essa estratégia fazem? Valorizam a qualidade, a ideia de que seus produtos são feitos a mão, a exclusividade e a elegância discreta. O resultado é uma sensação incontestável de exclusividade.
Isso pode ser visto em dois ícones da marca, as bolsas Kelly e Birkin, ambas batizadas em homenagem a atrizes (Grace Kelly e Jane Birkin). A princesa de Mônaco ganhou uma bolsa com seu nome depois que Edith Head comprou um modelo desses para que sua personagem, Frances Stevens, a usasse no filme “Ladrão de Casaca”. A atriz gostou tanto da bolsa que ficou com ela e deixou-se fotografar com o acessório, já na condição de princesa. As fotos correram o mundo e houve uma enorme procura pelo exemplar, que ficou conhecido mundialmente como “bolsa Kelly” (embora só tenha sido batizada oficialmente dessa forma em 1977).
Já o modelo feito em homenagem à atriz inglesa radicada na França surgiu por acaso. Jane Birkin encontrou com Jean-Louis Dumas, do grupo controlador da Hermés, em um voo de Paris a Londres. Ela reclamou que não encontrava para comprar uma bolsa para viajar com algumas características específicas. Dumas ouviu o que ela desejava e a atendeu, criando o modelo que ganharia o sobrenome da intérprete de “Je T’aime (Moi Non Plus)”.
Essas duas bolsas têm um preço inicial de US$ 10.000 e não têm pronta entrega. Quem quiser adquiri-las terá de esperar até seis meses para recebê-las. Mas há modelos que podem custar até US$ 500.000, dependendo do acabamento.
Esse modelo de negócios há muito tempo chamou a atenção da LVMH, que é acionista minoritária da Hermés e já tentou comprar a empresas em várias ocasiões. Até quando as famílias controladoras vão resistir ao assédio da gigante do luxo? Caso não resistam, aqui vai um conselho à LVMH: não mexam em um time que está ganhando.