O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra é uma espécie de nêmesis do agronegócio. Ao ouvir o nome do líder do MST, João Pedro Stédile, os empresários do agro têm calafrios ou ataques de raiva. Stédile é considerado um dos símbolos máximos de esquerdismo no país e constantemente considerado um aliado de todas as horas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Mas, ultimamente, ele anda insatisfeito com os rumos do governo. À Folha de São Paulo, o comandante dos sem-terra disse o seguinte: “Não bastam mais propaganda, retórica, eventos e atos no Palácio. Anunciaram a tal prateleira de terras e tantas outras promessas embaladas como presentes de Natal. A impressão que temos é que, em geral, os ministros não falam a verdade para o presidente”.
Para Stédile, as promessas de desapropriações, compra de terras e transferências de fazendas de devedores da União para o movimento não devem se concretizar até o final do ano, embora ele tenha uma reunião marcada em breve com Lula para tratar do assunto.
Há uma espécie de consenso entre o empresariado de que o terceiro mandato do presidente é muito diferente dos dois primeiros porque tem uma pegada bem mais esquerdista – do discurso às ações. Muitas falas de Lula remetem a um certo radicalismo, com uma intenção explícita de jogar pobres contra ricos.
Além disso, existe a sensação permanente de que não há empenho para conter os gastos públicos, com demonstrações de apreço pela irresponsabilidade fiscal. O atual patamar do dólar, acima dos R$ 6,00, reflete essa percepção, ao mesmo tempo que existem previsões de que a dívida pública pode chegar a 82% do Produto Interno Bruto em 2027.
O governo Lula, assim, está vivendo uma situação curiosa, que beira uma crise de identidade. Os empresários estão insatisfeitos porque acham o governo muito esquerdista. Mas os sem-terra, do outro lado do espectro ideológico, também estão desgostosos, por julgar que a gestão federal não está tão à esquerda como gostariam.
Ou seja, qualquer que seja a direção escolhida pelo Planalto daqui para frente, vai desagradar uma parcela da sociedade – e, atualmente, já está criando desavenças com empresários e líderes de movimentos sociais.
Se Lula decidir acelerar na curva e buscar soluções antimercado, terá de enfrentar a continuação de ocorrências macroeconômicas que podem prejudicar a popularidade do governo. O dólar pode continuar seu processo de alta, ameaçando um repique da inflação e provocando altas seguidas de juros.
Lula deseja um mundo que não existe: gastos públicos desenfreados sem contrapartidas. Se optar por jogar para a torcida de Stédile e apostar nesta realidade paralela, o cenário pode ainda ficar mais complicado. Basta seguir o caminho da demagogia.