O tarifaço provocado pelo presidente Donald Trump atingiu dois aliados e parceiros comerciais de pelo, o México e o Canadá (além da China, que está longe de ser uma nação amiga dos Estados Unidos). Como era de se esperar, os dois países fronteiriços reagiram, apesar das ameaças americanas. Trump havia avisado que haveria retaliação (outro aumento de sobretaxas) caso os vizinhos resolvessem responder ao aumento de tarifas dos EUA.
Para piorar, Trump tentou associar autoridades mexicanas ao crime organizado. A presidente do México, Claudia Sheinbaum, refutou “categoricamente a calúnia da Casa Branca sobre o governo mexicano de ter alianças com organizações criminosas, bem como qualquer intenção de interferir em nosso território”. No final, o México se comprometeu a reforçar suas fronteiras com 10 mil novos agentes — e os Estados Unidos interrompeu a cobrança de sobretaxas em relação aos produtos mexicanos. Por um mês.
A primeira resposta às retaliações comerciais partiu do Canadá, que elevou as tarifas de quase 800 produtos americanos em uma lista inicial – mas outras mercadorias serão sobretaxadas mais adiante. Também ganhou um mês de trégua fiscal, que valerá para os dois lados.
A primeira resposta do presidente americano à reação de seu vizinho do Norte foi agressiva. Ele escreveu em suas contas na rede social o seguinte: “Nós pagamos centenas de bilhões de dólares para SUBSIDIAR o Canadá. Por quê? Não há motivo. Não precisamos de nada do que eles têm. Temos energia ilimitada, deveríamos fabricar nossos próprios carros e temos mais madeira serrada do que jamais poderemos usar. Sem esse subsídio maciço, o Canadá deixa de existir como um país viável. É duro, mas é verdade! Portanto, o Canadá deve se tornar nosso querido 51º Estado”.
Ao confrontar seus vizinhos com um discurso arrogante e prepotente, Trump mexeu com os brios canadenses. O hino americano foi vaiado em um jogo de hóquei e vários políticos locais deram declarações exaltando a soberania de seu país.
A União Europeia está na lista de do tarifaço do presidente americano. Ele disse que a elevação de taxas de importação “definitivamente iria acontecer”. A reação foi imediata, em uma nota oficial que dizia o seguinte: “A UE está firmemente convencida de que tarifas baixas promovem o crescimento e a estabilidade econômica, mas responderá com firmeza se tarifas injustas forem aplicadas”.
Entende-se o movimento de Donald Trump em relação à China. Do ponto de vista econômico, bélico e científico, os chineses são os maiores rivais dos americanos neste Século 21. Mas por que comprar briga com vizinhos e aliados históricos? Por que fazer amigos se tornarem inimigos?
Trump não está errado quando diz que os Estados Unidos têm a economia mais poderosa do mundo. Mas isso não quer dizer que os EUA sejam independentes e não precisem de ninguém.
A ideia de Trump é devolver a competitividade das empresas americanas, que foram engolidos por concorrentes internacionais que conseguem produzir com preços melhores que os dos EUA. Com as tarifas, produtores dos Estados Unidos ganhariam espaço no mercado interno e poderiam investir, criando novos empregos.
O mote “Make America Great Again” traz em si uma nostalgia em relação à “golden age” do país, que cresceu avassaladoramente no pós-guerra. Ocorre que leva tempo para que as empresas americanas voltem a produzir em um nível suficiente para substituir importações. Portanto, é de se esperar que haja um período de transição com desabastecimento e inflação – isso na possibilidade de o presidente obter sucesso em sua estratégia.
A pergunta que não quer calar, neste caso, é: como Trump vai conseguir retomar o crescimento americano sozinho, ao criar um clima negativo com seus aliados? A perda de competitividade dos EUA não é um reflexo somente da expansão industrial global. Este mesmo fenômeno pode ser visto no setor de tecnologia, com a ferramenta de inteligência artificial DeepSeek desenvolvida com uma verba de US$ 5,6 milhões. Como se sabe os concorrentes americanos, que apresentam resultados piores, foram realizados com investimentos entre US$ 100 milhões e US$ 1 bilhão.
Como Trump pretende neutralizar o avanço chinês nesta seara? Vai cobrar tarifas de produtos que são oferecidos de graça?
Ao cutucar seus aliados com um discurso que beira o autoritarismo, o presidente americano corre o risco de colocar estes países no colo da China, ampliando o poderio econômico dos orientais. A aposta de Trump é alta – mas os riscos são igualmente estratosféricos.