Durante muito tempo, uma das maiores queixas dos empresários brasileiros era a falta de previsibilidade em nosso país. Desde a gestão de Dilma Rousseff (com intervalo para o mandato de Michel Temer), o Brasil vive uma montanha russa, cujas curvas de ângulos radicais são moldadas por decisões intempestivas ou declarações desastradas vindas do Palácio do Planalto.
Ocorre que a imprevisibilidade deixou de ser uma exclusividade brasileira desde que Donald Trump assumiu a presidência dos Estados Unidos. Muito do discurso do então candidato Trump esteve orbitando em torno da agenda conservadora, em declarações contrárias à chamada cultura “woke”. Esta agenda, embora incomodasse eleitores progressistas, não tinha efeitos econômicos. Mas bastou Trump se alojar na Casa Branca que o mundo inteiro foi abalado por decisões de impacto ou balões de ensaio que geraram muita polêmica.
Os palpites na política externa trouxeram discussões apaixonadas – desde o tuíte dirigido a Vladimir Putin, exigindo o fim da guerra contra a Ucrânia, até a proposta para retirar todos os palestinos da faixa de Gaza, passando pela anexação do Canadá aos Estados Unidos.
Mas foi a guerra de tarifas que acabou gerando insegurança nos mercados, especialmente por conta da imprevisibilidade que tomou conta da economia. Em primeiro lugar, Trump elevou os impostos alfandegários cobrados ao México e ao Canadá em 25% — para congelá-los por um mês em seguida. Depois, decretou um tarifaço generalizado em relação ao aço e ao alumínio que vai prejudicar vários países.
Houve uma gritaria generalizada nos fornecedores de aço – que gerou uma onda de sobretaxações do aço americano como contra-ataque. Mas uma das declarações mais contundentes contra a elevação de tarifas em geral veio do CEO da Ford, Jim Farley.
“O presidente Trump tem falado muito sobre fortalecer a indústria automotiva dos EUA e trazer mais produção para o país, mas, até agora, o que estamos vendo é muito custo e muita confusão, disse Farley. “Sendo bem realista, no longo prazo, uma tarifa de 25% sobre importações do México e do Canadá causaria um impacto na indústria automobilística americana que nunca vimos antes”.
Para Farley, esse novo cenário pode abrir espaço para que fabricantes asiáticos e europeus possam oferecer automóveis mais baratos aos americanos, em uma concorrência que seria maléfica para empresas dos EUA que possuem plantas mexicanas ou canadenses.
Mas sempre existe a possibilidade de Trump aumentar as tarifas da indústria automobilística estabelecida nos países orientais e europeus. O problema, neste caso, é que os preços neste setor iriam subir freneticamente, o que pode causar reflexos na inflação – e nunca é tarde para esquecer que o presidente foi eleito devido vários fatores, entre os quais a percepção de que a inflação tinha crescido e que Donald Trump teria plena condições de combatê-la.
Como presidente do país mais importante do planeta, Donald Trump pode ser considerado uma espécie de CEO do mundo. Suas decisões têm impacto direto nas demais nações e suas declarações (especialmente quando ele parece estar pensando em voz alta) podem mexer com mercados de forma brusca.
Se Trump pensasse um pouco antes de falar, talvez pudesse trazer a boa e velha previsibilidade de volta à economia mundial. Mas, convenhamos, se ele agisse dessa forma, não seria o Donald Trump de sempre – aquele que, mesmo com todas as bravatas e provocações, foi eleito com folga nas últimas eleições.