Pesquisar
PATROCINADORES
PATROCINADORES

A guerra cultural nas ciências econômicas

O grande desafio é sacudir a contrarrevolução reacionária que insiste em justificar o poder coercitivo e monopolista dos estados e governos

A Economia é a mais jovem de todas as ciências e tem sido um marco importante na história da humanidade. Pela primeira vez, a Economia mostrou como a cooperação social voluntária, livre de coerção institucional e sistemática, cria uma ordem espontânea de prosperidade e civilização que ninguém projetou ou organizou. A economia é a ciência da interação humana e foi expandida em uma teoria completa da liberdade, entendida como a característica mais fundamental da natureza humana. Liberdade significa que toda interação humana ocorre voluntariamente, ou seja, sem qualquer coerção externa ou violência sistematicamente imposta de cima para baixo pelo pequeno grupo de seres humanos que exercem o poder político.

A essência dessa nova ciência, a Economia, é revolucionária. Pela primeira vez na história da humanidade, foi demonstrado cientificamente que o Estado, em qualquer de suas formas, é desnecessário. Foi demonstrado que a sociedade, entendida como o processo de interações humanas voluntárias, não precisa de ninguém para governá-la, porque ela se organiza espontaneamente. Foi demonstrado que é impossível coordenar a sociedade com base em comandos coercitivos emanados do Estado, e que qualquer tentativa nesse sentido está fadada ao fracasso, causando violência e conflitos.

A Ciência Econômica também refuta Thomas Hobbes: O “estado de natureza” não era uma situação inevitável e terrível, nem havia um “contrato social” para manter a ordem e garantir a paz. Pelo contrário, a evolução natural consistiu precisamente no surgimento espontâneo e voluntário do comércio, enquanto, ao mesmo tempo, os estados surgiram como instituições coercitivas compostas pelos seres humanos mais antissociais e violentos, que desejavam (e desejam) viver saqueando cidadãos produtivos (Oppenheimer, 1926). Assim, a Economia, como uma nova ciência, mostra que o que Étienne de La Boétie chamou de “servidão voluntária” é uma aberração anti-humana à qual os seres humanos têm sido submetidos desde tempos remotos. Em outras palavras, pela primeira vez na história, a ciência econômica abriu os olhos da humanidade: Não há necessidade de continuar seguindo o costume de obedecer ao Estado; nem os governos têm, de fato, qualquer prestígio superior (na verdade, eles são literalmente desprovidos de qualquer atributo intelectual ou moralmente superior); nem o establishment de políticos é intocável; nem devemos nos permitir ser comprados, seduzidos e enganados pelos subsídios ou vantagens destinados a ganhar a lealdade dos seres humanos explorados para que eles voluntariamente consintam em ser saqueados (de La Boétie, 2008).

A ciência econômica atingiu seu mais alto nível de desenvolvimento pelas mãos da Escola Austríaca de Economia, que deveria ser conhecida como a “Escola Espanhola” [Escola de Salamanca], já que os escolásticos da Idade de Ouro espanhola foram seus precursores. A ciência econômica formulada pela Escola Austríaca está fundamentada no realismo de suas premissas analíticas e na abordagem dinâmica de sua análise baseada na capacidade criativa, empreendedora e de coordenação de cada ser humano e na ordem espontânea do processo social de interações humanas voluntárias (Huerta de Soto, 2008). Esse processo dá origem a uma série de instituições vitais que, por sua vez, o tornam possível e o estimulam: o direito – especialmente o direito de propriedade – entendido como uma descoberta baseada em costumes e inseparável da natureza humana; a família como uma instituição essencial que permite e promove a expansão da humanidade; os princípios morais, que atuam como um verdadeiro “piloto automático” para a liberdade e que os seres humanos internalizam e transmitem de geração em geração, graças à família e a outras instituições comunitárias e religiosas; instituições econômicas e, particularmente, o dinheiro, que evolui espontaneamente e deve ser considerado a instituição social por excelência, pois, ao resolver os problemas de troca, possibilita um aumento exponencial nas interações humanas voluntárias, nas quais todas as outras instituições são descobertas, moldadas e aperfeiçoadas.

No entanto, essa mensagem científica fundamental da Economia, até o momento, teve um impacto muito limitado sobre a inércia da realidade política dominada pelo poder coercitivo do Estado e de seus governos. Esse impacto muito limitado, no máximo, tomou a forma de uma série de revoluções “liberais” com o objetivo ingênuo, arrogante e malsucedido de alcançar uma meta impossível: a separação e a limitação do poder político por meio de constituições e “democracias liberais” (Rothbard, 2009). Mesmo assim, a humanidade foi impulsionada como nunca antes nos momentos históricos em que, apesar de tudo, houve uma certa liberação parcial do poder do Estado. Devemos mencionar o período iniciado com a Revolução Industrial, que foi apenas o primeiro capítulo da nunca concluída “Revolução Capitalista alimentada pelos ensinamentos sobre liberdade revelados pela Ciência Econômica”, que, apesar de todos os tipos de obstáculos e oposição, possibilitou um aumento da prosperidade e da população nunca antes visto na história da humanidade. E não podemos sequer imaginar o padrão de vida e o volume populacional que poderíamos alcançar se a humanidade pudesse aproveitar ao máximo e culminar os ensinamentos da Economia implementando e possibilitando a recepção total de sua teoria revolucionária da liberdade. Como escreve Hayek, “Podemos ser poucos e selvagens [em um contexto de servidão ao Estado] ou muitos e civilizados [em um contexto de liberdade]” (Hayek, 1988, p. 133). O globo terrestre está praticamente vazio de seres humanos. (A população atual da Terra caberia em uma área um pouco maior do que a metade do território da Argentina, com uma densidade populacional igual à de Bruxelas). E não podemos nem imaginar a prosperidade que poderia ser alcançada em um mercado livre no qual oitenta bilhões ou até 800 bilhões de seres humanos participassem diariamente…

A economia mostra e explica que o aumento da prosperidade para uma população mundial cada vez maior de seres humanos nunca resulta de planos coercitivos de redistribuição, nem do crescimento dos gastos públicos, subsídios, dívidas ou inflação, mas apenas do sistema capitalista. Esse é um processo que consiste nas interações voluntárias de empreendedores (e, em última análise, somos todos empreendedores) capazes de detectar e calcular, com base no sistema de preços do livre mercado, a urgência e a necessidade relativa de cada bem e serviço; e de investir trabalho e recursos materiais necessários para produzi-los a fim de superar sua escassez. Dessa forma, os empreendedores satisfazem todos os dias, da melhor maneira humanamente possível, os desejos e as necessidades de bilhões de consumidores. Os empresários que obtêm sucesso nesse processo interminável de busca de lucro acumulam uma riqueza considerável que, por sua vez, é poupada e investida em bens de capital e novas tecnologias que tornam o trabalho cada vez mais produtivo. Isso aumenta os salários e o padrão de vida dos trabalhadores e cria um círculo virtuoso de prosperidade que não tem limites.

Portanto, é crucial para o futuro da humanidade que sejamos capazes de tirar proveito dos ensinamentos que a Ciência Econômica nos dá em favor da liberdade humana. Entretanto, isso apenas será possível se, primeiramente, conseguirmos desmascarar e analisar cuidadosamente as poderosas – pseudocientíficas e contrarrevolucionárias – forças reacionárias que se juntaram para formar um front unido para previnir a realização da teoria da liberdade desenvolvida pela Ciência Econômica. Apesar de suas diferentes origens, todas essas forças reacionárias têm o mesmo objetivo: manter a coerção estatal a todo custo e justificá-la com um aparente respaldo científico e bloquear a realização das imensas possibilidades da humanidade em um ambiente sem essa coerção.

Identificaremos agora as principais escolas de pensamento pseudocientíficas e reacionárias cujos defensores conspiram contra a Economia e que constituem, nas palavras de Hayek, a Contrarrevolução da Ciência (Hayek, 1955).

Pensamento pseudocientífico reacionário

O denominador comum de todas essas escolas de pensamento é a tentativa de justificar, com a aparência de respaldo científico, a continuação da coerção estatal e da correspondente servidão da humanidade. Sistemas completos de pensamento pseudocientífico foram formulados, com a aura, o prestígio e o suposto apoio da ciência, para despertar todos os tipos de dúvidas e desacreditar a mensagem essencial da Ciência Econômica em favor da liberdade.

Essas formulações pseudocientíficas contrarrevolucionárias baseiam-se na arrogância fatal (Hayek, 1988) de muitos pensadores visionários e “especialistas” que se julgam tão inteligentes a ponto de melhorar o resultado de processos sociais espontâneos, é claro, usando o poder violento e coercitivo do estado para impor suas ideias a todos. Essas ideias caem no terreno fértil de uma humanidade acostumada a servir ao estado e a seus governos, e ao establishment privilegiado de políticos e funcionários públicos, cujos privilégios e vício pelo poder exigem que a revolução iniciada pela Economia seja bloqueada, e não se permita que ela prevaleça e seja realizada. Em suma, para o establishment, é vital diluir e substituir os ensinamentos da Economia por uma série de disciplinas que justifiquem a manutenção do estatismo coercitivo. As principais escolas de pensamento pseudocientíficas e reacionárias que se uniram em um movimento contrarrevolucionário contra a Economia e se infiltraram nela como um vírus mortal (Huerta de Soto, 2023) são as seguintes:

Primeiro: positivismo e cientificismo. Por “cientificismo” queremos dizer a aplicação indevida do método das ciências naturais, que estudam seu objeto de pesquisa como algo externo, mensurável e quantificável, à esfera da Economia, que estuda as implicações das interações humanas voluntárias. Dada a natureza criativa dos seres humanos livres, as chamadas “evidências” empíricas coletadas em qualquer momento específico podem ter, na melhor das hipóteses, apenas um valor superficial, parcial e sempre historicamente contingente. Em outras palavras, ela pode refletir, nas palavras de Bastiat, “aquilo que é visto” – ou melhor, aquilo que se acredita ter sido visto – mas não “aquilo que não é visto” (Bastiat, 2007, 2009, 47-105). Na pior das hipóteses, tais evidências inevitavelmente implicam a noção de que os seres humanos, como sujeitos de pesquisa, são tão fáceis de manipular quanto todos os outros elementos do mundo exterior estudados pelas ciências naturais. Isso invariavelmente introduz a suposição de que o Estado e seus governos são responsáveis por detectar e diagnosticar todos os problemas e, por meio de seu poder coercitivo, melhorar as coisas como eles acreditam que as veem. Mas os dados empíricos não podem refletir a essência dinâmica subjacente dos processos sociais espontâneos, muito menos o que já está ocorrendo espontaneamente para coordenar e solucionar desajustes. Portanto, não é de surpreender que, desde os primeiros passos da Economia liderada pela Escola Austríaca, seus oponentes mais ferozes tenham sido os socialistas acadêmicos reunidos em torno da Escola Histórica Alemã, apoiados na França pelos empiristas da Escola de Saint-Simon, o insano Comte e Durkheim. Esses homens queriam criar uma pseudociência social nova e alternativa, e sua influência doentia se espalhou ao longo do tempo por meio do institucionalismo americano e chegou até os dias atuais com a coleta em massa de dados históricos e a abordagem ultraempírica de pessoas como Wesley C. Mitchell e Henry Schultz, que exerceriam forte influência sobre seu assistente Milton Friedman e, por meio dele, sobre a Escola de Chicago.

Segundo: a pseudociência da economia neoclássica é caracterizada pela visão de que a única economia verdadeira é a que ela favorece; em outras palavras, aquela baseada exclusivamente nos princípios de equilíbrio, maximização e constância. Além disso, à irrealidade essencial de suas premissas, acrescenta-se o reducionismo de uma linguagem matemática que surgiu principalmente para atender às necessidades e exigências das ciências naturais. Entretanto, essa linguagem matemática é incompatível com o conceito subjetivo de tempo e com a criatividade empresarial, que são inseparáveis da natureza e do livre-arbítrio de cada ser humano. Em contraste, os neoclássicos baseiam o desenvolvimento de sua pseudociência em “tipos ideais”, que são simplesmente como pinguins robóticos que, mesmo em seus sofisticados modelos dinâmicos estocásticos de equilíbrio geral, simplesmente se movem e reagem a eventos e à coerção do Estado como se fossem bonecos de palito em um videogame. Apesar da aparente e sempre crescente sofisticação dessa “economia de videogame”, a pseudociência da economia neoclássica não consegue explicar a vasta complexidade do mundo real e se rebela contra a ideia da ordem de mercado livre e espontânea de duas maneiras igualmente prejudiciais à liberdade humana: por um lado, ao promover a “engenharia social” coercitiva de bancos centrais, estados e governos para forçar a realidade ou, pelo menos, ajustá-la para mais perto do ótimo matemático de seus modelos matemáticos; e, por outro lado, ao rotular como “falha de mercado” tudo o que eles acreditam observar em seus estudos empíricos da realidade e que não se ajusta aos seus modelos de equilíbrio (Milei, 2023, 2024). Essas chamadas “falhas”, obviamente, refutariam as recompensas da ordem espontânea do mercado e da liberdade humana e justificariam a coerção do Estado e dos governos para eliminar as falhas o mais rápido possível. Além disso, observe que a pseudociência neoclássica precisa e encontra apoio nos estudos empíricos da primeira pseudociência mencionada, o positivismo, para justificar suas conclusões contra a liberdade humana e a favor da coerção estatal e, assim, positivistas e neoclássicos dão as mãos e, em última análise, reforçam a agenda reacionária um do outro.

Terceiro: o keynesianismo e a macroeconomia como pseudociência. A abordagem “macro” em si envolve inevitavelmente uma tendência à justificativa da intervenção estatal, agressão e coerção contra a ordem espontânea do mercado. Como F. A. Hayek deixou claro em seu discurso de aceitação do Prêmio Nobel de 1974 (Hayek, 2008b), os processos econômicos que realmente ocorrem, mas que não podem ser medidos, são ignorados, enquanto certos agregados estatísticos que parecem fornecer informações empíricas são erroneamente considerados como existentes na vida real. Aqui vemos novamente como a pseudociência da macroeconomia trabalha em conjunto com a pseudociência do positivismo, e as duas se tornam aliadas em sua resposta contrarrevolucionária à Ciência Econômica. Além disso, o keynesianismo tem sido especialmente perverso, não apenas por sua negação absoluta de qualquer capacidade de coordenação do empreendedorismo e da ordem espontânea do mercado, mas também por elaborar, como explicação alternativa, um modelo inteiro, novamente de equilíbrio, mas agora com desemprego permanente, o que obviamente justificaria a intervenção coercitiva do Estado na vida dos seres humanos. Aqui, vemos como a pseudociência keynesiana se apoia no enfoque pseudocientífico da Escola Neoclássica, a ponto de a chamada “síntese neoclássica-keynesiana” ter se tornado, ao longo do século XX, o principal movimento reacionário contra a revolução original da economia. Infelizmente, os keynesianos e os macroeconomistas se tornaram os apoiadores da farra do estatismo e do poder político que fornece a estrutura (orquestrada por governos e bancos centrais) na qual, infelizmente, todos nós nos acostumamos a viver. É um contexto que, assim como o Estado e os impostos, é falsamente considerado tão inevitável quanto a própria morte e, repetidamente, desestabiliza a ordem do mercado, provoca crises profundas e conflitos sociais e impede continuamente a prosperidade e a expansão da vida.

Quarto: o marxismo como uma pseudociência “quase religiosa”. Deixamos para o final o misticismo quase religioso da pseudociência do marxismo, porque intelectualmente ele foi morto quase antes de nascer. De fato, o marxismo foi completamente demolido pela teoria da preferência temporal e pela revolução subjetivista da ordem espontânea do mercado liderada pela Escola Austríaca de Economia. Os austríacos, desde o início, revelaram as contradições e os profundos erros científicos do marxismo, expondo-o como, essencialmente, uma fraude intelectual (Böhm-Bawerk, 1890, 1949). Além disso, tudo isso foi historicamente ilustrado pela queda da antiga União Soviética e de quase todos os outros países comunistas, após muitas décadas de indescritível sofrimento humano suportado por uma grande parte da população mundial. Posteriormente, a teoria da impossibilidade do estatismo e de uma economia sem mercado livre – desenvolvida pela Escola Austríaca, começando com o ensaio de Mises de 1920 (Mises, 1990, 2019) – foi o último prego no caixão da pseudociência do marxismo (Huerta de Soto, 2010). No entanto, como ninguém ainda havia produzido uma análise crítica detalhada, quase seção por seção e parágrafo por parágrafo, dos volumes de chumbo de Marx, que, lamentavelmente, ainda são ensinados em algumas universidades, principalmente na América Latina, meu estimado discípulo, o professor Juan Ramón Rallo, preencheu essa necessidade com uma obra monumental intitulada Anti-Marx: Crítica a la economía política marxista (Rallo, 2022). Esse livro será considerado a crítica final da pseudociência quase religiosa do marxismo.

No entanto, apesar dessa clara derrota intelectual e do fracasso histórico dos experimentos sociais marxistas, um movimento complementar de “marxismo cultural” se espalhou com vigor. Originalmente previsto por Gramsci e outros, ele tem sido notavelmente bem-sucedido em se infiltrar nos campos sociais, culturais, religiosos ou científicos mais significativos, inclusive em nossa própria ciência econômica.

Marxismo cultural

Vemos que nossa disciplina foi de fato invadida e corrompida por uma guerra cultural travada por estatistas de fora e de dentro da economia. A semelhança com a guerra travada pelos marxistas culturais na sociedade não poderia ser mais óbvia. Um fracasso histórico e científico é a base do marxismo, embora esteja sendo feita uma tentativa de reverter esse fracasso em nível social seguindo uma estratégia muito clara: evitar o confronto direto e minar lenta, mas constantemente, os princípios básicos da cultura ocidental. Assim, as atitudes mais distantes dela são apresentadas como alternativas igualmente aceitáveis por meio da repetição constante de slogans e da manipulação e controle da educação, da mídia e do maior número possível de instituições, intelectuais e líderes sociais. A estratégia do marxismo cultural envolve evitar o confronto direto e, ao mesmo tempo, minar, pouco a pouco, cada um dos princípios fundamentais da ordem espontânea do mercado: Por exemplo, a divisão biológica dos sexos não é explicitamente negada, mas argumenta-se que, em última análise, o sexo é uma construção intelectual que permite que cada pessoa escolha o seu próprio. A família tradicional não é atacada diretamente, mas argumenta-se que ela é apenas um entre muitos outros tipos de arranjos de vida igualmente respeitáveis. O cristianismo não é atacado abertamente, mas qualquer outro sistema de crença religiosa ou moral é apresentado como igualmente bom e aceitável. A igualdade perante a lei não é criticada diretamente, mas é enfatizado que o que é realmente importante é a igualdade de oportunidades e, acima de tudo, de resultados. A livre iniciativa não é rejeitada, mas o setor público é elogiado e sempre prevalece sobre o setor privado. A riqueza não é condenada em si, mas ouvimos ad nauseam que, se há pessoas ricas, é às custas das pessoas pobres, e assim por diante. E quando esses e outros slogans semelhantes são repetidos inúmeras vezes, como aconselhou Goebbels, eles se transformam em verdades “oficiais” que a maioria das pessoas acaba aceitando automaticamente e que entram na ideologia “politicamente correta” e hegemônica. Além disso, em seu processo de se tornar e permanecer forte, o marxismo cultural se concentra em vencer a agenda reformista dos principais partidos políticos (esquerda e “direita”).

Agora, em paralelo ao “marxismo cultural”, um “estatismo cultural” começou a emergir em nossa Ciência desde o momento em que os economistas descobriram os processos de criatividade e coordenação que surgem espontaneamente da interação livre entre os seres humanos. Como esses processos geraram uma prosperidade nunca antes vista na história da humanidade, isso expôs e causou grande ansiedade entre os estatistas e membros do establishment político (de todas as vertentes), que tradicionalmente exploraram e geriram coercivamente a vida dos seres humanos.

Foi em reação a essa realidade, extremamente perigosa para o status quo coercitivo e estatista, que, uma a uma, surgiram as escolas de pensamento pseudocientíficas que já mencionamos. Elas compartilham um denominador comum: uma tentativa incessante de minimizar a importância revolucionária do respaldo científico que a economia dá à liberdade humana, ao livre mercado e à livre iniciativa; e um esforço para justificar, a todo custo, a manutenção do instrumento de coerção sistemática — ou seja, o estado — apresentando-o como algo necessário e altamente benéfico para a humanidade e argumentando que, portanto, os seres humanos devem continuar a aceitar sua condição de servidão como algo não apenas inevitável, mas até mesmo benéfico para eles próprios. Além disso, a estratégia do marxismo cultural é copiada, assumindo-se um “consenso” a favor do estado dentro da Economia, o qual é repetido incessantemente até que seja amplamente considerado como óbvio e indiscutível.

E assim, dentro da pseudociência empírica, todas as áreas da vida social são submetidas ao mais intenso escrutínio empírico, com o objetivo ilusório de obter, em cada período histórico, “evidências objetivas” para orientar a intervenção coercitiva dos governos e políticos. A cada ano, milhares e milhares de pesquisas empíricas são financiadas e promovidas por governos, universidades e instituições e fundações públicas e privadas, proporcionando trabalho, emprego e subsídios a milhares e milhares de economistas jovens e nem tão jovens, que acabam acreditando erroneamente que, ao trabalhar como os cientistas naturais, serão capazes de entender o que acontece na economia real (Hansen, 2019). Ao mesmo tempo, como vimos, a pseudociência neoclássica mina o máximo possível a fé na liberdade humana e nos mercados livres. De fato, os economistas neoclássicos argumentam que resultados ótimos só são alcançados em certas circunstâncias idealizadas que nunca existem na vida real e que, obviamente, como os mercados não atendem aos critérios “perfeitos” neoclássicos e tais circunstâncias ideais não existem, a intervenção coercitiva do governo é essencial para aproximar a realidade do ideal descrito nos modelos neoclássicos. Nunca lhes ocorre – e rejeitam até mesmo a ideia – que, embora os mercados sejam processos humanos que nunca estão em equilíbrio, nem sejam “perfeitos” nos termos estreitos e reducionistas da teoria neoclássica, eles impulsionam a criatividade, a coordenação e a prosperidade de uma maneira que nenhum sistema de ajuste coercitivo do Estado pode igualar ou melhorar (Huerta de Soto, 2010, cap. 3).

E uma multidão de economistas profissionais colabora na gestão estatal da economia por meio do “ajuste fino” e da engenharia social. Hoje, essa abordagem atingiu seu nível mais característico de intervencionismo por meio da pseudociência macroeconômica, aplicada por governos e banqueiros centrais determinados a alcançar o objetivo impossível de garantir estabilidade financeira e prosperidade através da manipulação do dinheiro e das taxas de juros (Romer, 2016). A paixão por controlar, ordenar, comandar, regulamentar, gastar, contrair dívidas e fixar preços e (especialmente) taxas de juros está se tornando a característica definidora das economias modernas. Essa mentalidade é compartilhada por uma legião de “economistas” cuja arrogância os leva a defender com grande energia e até agressividade verbal a ideia de que apenas o que eles fazem é a verdadeira ciência econômica e que os mercados devem ser constantemente monitorados por meio de estudos empíricos e regulamentados sempre que aquilo que os economistas acreditam ver neles não coincide com o que seus sofisticados modelos indicam.

Além disso, eles inventam continuamente e repetem indefinidamente narrativas ad hoc; por exemplo, que apenas a intervenção ativa dos bancos centrais evitou enormes males não apenas após a Grande Recessão de 2008 (que, aliás, foi provocada pelos próprios bancos centrais), mas também durante a Pandemia de 2020 (quando os bancos centrais criaram as bases para a maior inflação dos últimos quarenta anos, que nenhum desses economistas previu). E quando os (sempre teimosos) fatos já não permitem ocultar a impossibilidade de gerir coerciva e centralmente as economias e seus mercados, os economistas mais ilustres e representativos dessas escolas de pensamento pseudocientíficas jamais admitem seus erros e limitações. Em vez disso, apressam-se em declarar, como fez Ben Bernanke a respeito do modelo utilizado pelo Banco da Inglaterra (Financial Times, 12 de abril de 2024), que o problema foi que os modelos correspondentes não eram sofisticados o suficiente e que, por exemplo, as quinhentas variáveis e 170 equações do modelo FRB/US do Federal Reserve (Wall Street Journal, 19 de abril de 2024) eram claramente insuficientes, tornando-se necessário aumentar significativamente o número de variáveis e equações para descrever melhor a realidade extremamente complexa. E, embora a própria presidente do Banco Central Europeu, Christine Lagarde, tenha finalmente reconhecido que seu principal erro foi acreditar no modelo econômico do BCE (Financial Times, 27 de outubro de 2023), esse surto de honestidade não serviu de nada, já que ela continua tentando conduzir a política monetária da zona do euro com base nas “evidências” empíricas e nos modelos (supostamente aprimorados) fornecidos por seu “Economista Chefe”.

A única maneira de entender essa situação inacreditável é considerar o controle quase total que essas escolas de pensamento contrarrevolucionárias e pseudocientíficas adquiriram dentro da estrutura institucional da Ciência Econômica. A grande maioria dos departamentos de economia pertence a universidades que são estatais ou recebem considerável financiamento público. Os programas de ensino em economia são decididos por funcionários públicos a serviço do Estado ou das próprias universidades e, para esses burocratas, o principal objetivo das universidades é formar especialistas em intervenção pública nos mercados ou professores para pesquisar e promover a ideologia estatista. Ao mesmo tempo, todo o processo de seleção e promoção do corpo docente é essencialmente condicionado pelo “estatismo cultural”, assim como os periódicos científicos “mais prestigiados” (JCR), nos quais jovens professores e pesquisadores são constantemente obrigados a publicar se desejam progredir em suas carreiras profissionais. O mesmo viés pró-estatista pode ser encontrado nas agendas econômicas de agências públicas e privadas internacionais, bem como nos prêmios nacionais e internacionais mais “prestigiados” em economia. Em suma, o “estatismo cultural” está alcançando uma vitória clara e retumbante na Ciência Econômica e, de fato, em termos relativos, seu triunfo pode até ser considerado superior ao sucesso crescente e já evidente do marxismo cultural na batalha das ideias.

O papel de “inocentes úteis”

 Devemos também mencionar o papel muito significativo e frequentemente prejudicial que, nessa guerra cultural a favor do estatismo na Ciência Econômica, vem sendo desempenhado por diversos economistas renomados, jornalistas, meios de comunicação e até escolas inteiras dentro da disciplina. Embora geralmente se apresentem como defensores da liberdade e da economia de mercado, poderíamos descrevê-los como “inocentes úteis”, para usar a terminologia de Mises (Mises, 2010). Pois, ainda que oficialmente se oponham ao estatismo e defendam a liberdade, eles aceitam – mesmo que parcialmente – algumas das premissas das escolas de pensamento pseudocientíficas e reacionárias que descrevemos. Dessa forma, acabam (muitas vezes sem querer e para seu próprio desgosto) impulsionando ainda mais a reação estatista dentro da nossa disciplina – especialmente quando insistem em aconselhar os Estados com propostas sobre como melhorar na execução de tarefas que, na realidade, não deveriam realizar de forma alguma.

Por exemplo, um pensador que poderia se enquadrar nessa categoria de “inocente útil” é o inquestionavelmente liberal clássico Karl Popper, autor de A Sociedade Aberta e Seus Inimigos (1945) (Popper, 1966, 396). Nele, Popper não apenas admira a capacidade científica e até o humanismo de Karl Marx, mas também (o que é ainda pior) acaba propondo como alternativa uma estratégia de “engenharia social gradualista”, que deveria ser realizada, obviamente de forma coercitiva, pelos estados e autoridades, com o suposto objetivo de avaliar, caso a caso e à luz dos resultados empíricos, a adequação de cada intervenção estatal coercitiva. Na mesma linha, outro exemplo (entre muitos) seria George Stigler (vencedor do Prêmio Nobel em 1982), que chegou a afirmar (Stigler, 1975, 1–13) que apenas a evidência empírica poderia esclarecer qual sistema econômico – socialismo ou capitalismo – poderia funcionar e qual não funcionaria; uma afirmação que, obviamente, pressupõe que, antes de decidir, seria necessário “experimentá-los”, a um custo humano imenso que, como infelizmente sabemos, pode ser um resultado desse tipo de “experimento”.

Apesar de seu liberalismo, tanto Karl Popper quanto George Stigler propõem que especialistas em intervenção atuem por meio da engenharia social (mesmo que “gradualista”) e de estudos empíricos, uma abordagem que, como vimos, está no cerne das mais estatistas entre as escolas de pensamento reacionárias e pseudocientíficas da nossa disciplina. Tal comportamento poderia ser comparado ao de cientistas que, no campo da biologia e das ciências naturais, defendem, por exemplo, a manipulação genética de vírus inofensivos ao homem em seu estado natural, com o objetivo de torná-los capazes de infectar o corpo humano (o chamado gain of function), sob o pretexto de avançar na pesquisa, mas correndo o terrível risco de, no fim, desencadear pandemias muito severas (como parece já ter ocorrido).

Outros que podem e devem ser incluídos nessa categoria de “inocentes úteis” na guerra do estatismo cultural contra a Economia são, de modo geral, os membros da chamada Escola de Chicago e, em particular, economistas de livre mercado tão proeminentes como, por exemplo, Gary Becker ou até mesmo Milton Friedman (ambos laureados com o Prêmio Nobel de Economia, em 1992 e 1976, respectivamente). Becker defendeu até o fim o reducionismo metodológico da pseudociência neoclássica e sempre insistiu em considerar como “ciência” econômica apenas aquela formulada dentro dos estritos limites do equilíbrio, da constância e da maximização.

Podemos considerar ainda mais grave o caso de Milton Friedman, cujo sincero amor pela liberdade e forte apoio midiático aos mercados livres contrastam diretamente com sua abordagem pseudocientífica, baseada no empirismo positivista e no método agregado (de origem keynesiana) utilizado na macroeconomia. Essa é a única forma de compreender a longa lista de erros graves e concessões científicas de Friedman, que, para seu próprio desgosto, invariavelmente acabaram fortalecendo o intervencionismo estatal. Por exemplo, quando ele deixou de fora de sua teoria mecanicista da quantidade de moeda o fator mais importante: a distorção que a inflação causa nos preços relativos. Ou quando, ignorando a teoria austríaca do capital e dos ciclos, atribuiu as recessões exclusivamente à falta de injeção monetária por parte dos bancos centrais, incentivando, assim, um intervencionismo futuro ainda mais letal.

Um exemplo clássico disso foi sua alegação de que a Grande Depressão de 1929 ocorreu devido à intervenção insuficiente do Federal Reserve (!), um argumento repetido ad nauseam (por Bernanke e muitos outros) para justificar as políticas monetárias ultraflexíveis e não convencionais de quantitative easing, adotadas em larga escala após a Grande Recessão de 2008 e, posteriormente, durante a Pandemia de 2020—políticas que acabaram gerando uma inflação histórica. Além disso, Friedman defendeu a introdução do imposto retido na fonte para tornar o sistema tributário americano mais “eficiente” na arrecadação após a Segunda Guerra Mundial. Os estatistas também se apropriaram de sua ideia de um “imposto de renda negativo” para justificar sistemas de “renda mínima social” sob o pretexto de combater a pobreza.

Quanto à sua tão celebrada, mas fundamentalmente fraca “crítica” a Keynes, no final das contas ela se resume ao frágil argumento empírico de que o consumo parece se comportar como uma função permanente da renda. Mas podemos nos perguntar: “O que aconteceria se esses dados empíricos, cuja validade é, no máximo, historicamente contingente, se comportassem de maneira diferente no futuro? Isso poderia fazer com que a abordagem macroeconômica keynesiana voltasse a justificar suas conclusões mais grosseiras e equivocadas?” Mais uma vez, parece haver justificativa mais do que suficiente para descrever o monetarismo de Friedman como uma “inocência útil.” E, à luz de todas essas implicações dos erros metodológicos de Friedman, Hayek (vencedor do Prêmio Nobel em 1974) parece ter estado absolutamente certo ao afirmar que, depois da Teoria Geral de Keynes, o livro que mais prejudicou a Ciência Econômica foi Essays in Positive Economics, de Friedman (Hayek, 2008a). De fato, na guerra cultural contra os estatistas dentro da Ciência Econômica, com “amigos” e “inocentes úteis” como esses, parece que os defensores da grande mensagem da Economia em favor da liberdade já têm desafios suficientes a enfrentar – não precisando sequer de inimigos adicionais na forma dos estatistas culturais “oficiais.”

Finalmente, no campo do jornalismo, que Hayek chamou de “mercadores de ideias de segunda mão”, também existe uma legião de “inocentes úteis”, talvez liderada hoje pelo prestigiado colunista do Financial Times, Martin Wolf. Especialmente à medida que se aproxima do fim de sua carreira, Wolf continua a justificar prescrições marcadamente estatistas para solucionar todos os problemas econômicos do mundo. No âmbito institucional, até mesmo importantes universidades que defendem o livre mercado e instituições privadas, por medo de perder sua “respeitabilidade científica” e serem rotuladas como politicamente incorretas, não hesitam em se render completamente aos dogmas das escolas de pensamento pseudocientíficas. O mesmo pode ser dito sobre a maioria dos prêmios e honrarias acadêmicas, onde a abordagem predominante é sempre jogar pelo seguro e “evitar erros”, o que faz com que os critérios de seleção deem prioridade à tirania do consenso e do politicamente correto.

Agora, apresentaremos um breve esboço do que poderia ser uma estratégia eficaz para reverter esse estado lamentável de nossa disciplina, hoje dominada pelos estatistas culturais.

Como vencer os estatistas

Somente uma busca constante e incansável por uma estratégia clara e o uso de princípios táticos apropriados tornarão possível a vitória da verdade científica na guerra contra o “estatismo cultural” dentro da Ciência Econômica.

O objetivo estratégico primário a longo prazo é continuar estudando e pesquisando todas as implicações da ordem espontânea do mercado e dos processos criativos e de coordenação da cooperação social voluntária, cujo conhecimento constitui a principal contribuição da Economia. Assim, nossa disciplina se torna a Ciência da interação humana voluntária e, ao mesmo tempo, a Ciência que constantemente expõe e revela todos os desalinhamentos, conflitos e descoordenações que resultam continuamente do estatismo em cada área social sob sua influência e na medida de seu impacto sobre a interação humana voluntária. De fato, toda intervenção coercitiva do Estado repousa sobre observações parciais e empíricas, invariavelmente desatualizadas e contingentes historicamente, e não reflete os processos espontâneos já em movimento para resolver cada problema. A intervenção estatal bloqueia esses processos e, assim, impede que os problemas sejam resolvidos, tornando-os realmente piores (Kirzner, 1995, 136–145). Claramente, um imenso campo de ação está aberto para pesquisadores e estudiosos independentes que não estão comprometidos com o viés estatista das escolas de pensamento pseudocientíficas e reacionárias. Portanto, devemos dedicar nossos maiores esforços à incansável busca pela verdade científica no campo da Economia, sem qualquer tipo de viés estatista. E aqui, a liderança está com os cultivadores da Escola Austríaca de Economia, que, desde sua fundação, têm lutado em cada batalha intelectual para defender a liberdade e avançar a Ciência Econômica.

Pesquisadores em Ciência Econômica nunca devem cair no derrotismo nem permanecer em suas torres de marfim como testemunhas impassíveis do ataque diário lançado pelos seguidores das diferentes escolas de pensamento reacionárias. Pelo contrário, economistas honestos e imparciais devem constantemente, incansavelmente e sem hesitação denunciar toda manifestação da reação pseudocientífica: nunca devem baixar a guarda e devem desmontar os erros sempre que e onde quer que apareçam, explicar suas consequências – muitas vezes muito graves – e, em resumo, expor à Humanidade os responsáveis por eles. Pois no campo das ideias científicas, nenhuma concessão é permitida, e nenhum prisioneiro deve ser capturado.

Portanto, é um erro considerar sempre, de forma nobre, que os adversários possam ter sido vítimas de um simples erro ou engano científico. De fato, esse é o erro cometido até por alguns dos principais economistas austríacos, incluindo o próprio Hayek (que, aqui, pode ter se aproximado, ao menos aparentemente, de cair na categoria de “inocente útil”). Em vez disso, devemos ir muito mais longe e denunciar, sempre que necessário, as graves implicações sociais do suposto “simples erro”, assim como sua origem e natureza reacionária e pseudocientífica. Deve ser estabelecido um limite para as concessões à correção política na Ciência Econômica: há muito em jogo para a humanidade permitir tais concessões. Vistas de fora, elas podem ser mal interpretadas e, acima de tudo, podem fazer com que princípios econômicos essenciais passem despercebidos e sejam ignorados se forem apresentados de forma tímida e receosa.

Outro princípio tático importante é o de continuar entrando na estrutura institucional estatista predominante na Economia, com o objetivo de minar e desmontar essa estrutura, em termos científicos, de dentro para fora. Aqui, o principal risco reside na possível tentação de fazer concessões científicas inaceitáveis para garantir uma posição respeitável e uma carreira profissional. Pela minha própria experiência e a de alguns dos meus colegas, posso dizer que, embora ainda seja extremamente difícil, é perfeitamente possível ascender dentro do sistema de certificação governamental, publicação obrigatória em periódicos JCR, departamentos de economia e universidades financiadas publicamente, sem trair nenhum princípio científico fundamental e enquanto se conduz, de dentro do sistema, a crítica científica a ele e seu possível desmonte e reforma. Ao mesmo tempo, também é essencial fazer o melhor uso de todas as possibilidades táticas oferecidas pelas novas tecnologias de comunicação: redes sociais, vídeos no YouTube, podcasts, cursos online de economia, Inteligência Artificial etc. Essas ferramentas estão disponíveis hoje e tornam possível expor, literalmente na velocidade da luz, todos os viéses estatistas da contrarrevolução pseudocientífica que estão infectando a Ciência Econômica.

Além de usar essas táticas, devemos promover incansavelmente novos periódicos científicos (como a revista Procesos de Mercado) para publicar as pesquisas científicas mais promissoras, independentemente do monopólio de fato que, devido à legislação estatista, os periódicos mais eminentes (JCR etc.) têm – conquistado de forma artificial. A isso, devemos adicionar o papel que os economistas mais bem treinados podem desempenhar como influenciadores, a organização constante de conferências, o uso de redes sociais como X (anteriormente Twitter) e outras, a promoção de editoras independentes – como a União Editorial e outras – a concessão de prêmios nacionais e internacionais (como o Prêmio Juan de Mariana) não tendenciosos ao estatismo, e o estabelecimento de associações internacionais como a Mont Pelerin Society (fundada por Hayek em 1947) e a que Hans Hermann Hoppe fundou em 2006 (The Property and Freedom Society) para estudar e defender a liberdade e a propriedade etc.

Somente a busca entusiástica, sistemática e incansável desses objetivos estratégicos e táticos, por meio do uso, em todos os momentos, de todos os meios disponíveis ao nosso alcance, garantirá a vitória final na guerra cultural contra o estatismo desenfreado dentro da Ciência Econômica, independentemente dos resultados de curto prazo de cada batalha diária particular, que, em qualquer caso, devemos lutar e nunca fugir.

Anarcocapitalismo como a realização dos efeitos revolucionários

E agora, para concluir: Será possível desmontar o Estado com os ensinamentos da verdadeira Economia? Esse é o grande desafio atual da nossa Ciência Econômica: sacudir a contrarrevolução reacionária que insiste em manter e justificar o poder coercitivo, sistemático e monopolista dos Estados e seus governos; e abrir, de uma vez por todas, todas as áreas da sociedade para a cooperação voluntária e a interação humana baseada na liberdade. Até a Justiça, a ordem “pública” e a prevenção, repressão e punição do crime devem ser fornecidas pelos processos de mercado baseados na cooperação voluntária. Demonstrar cientificamente que esse objetivo estratégico não é apenas possível, mas também muito útil para o avanço da civilização e o crescente número e bem-estar ilimitado das pessoas, é o grande desafio que nossa Ciência enfrenta. E nossa Ciência continuará avançando apenas se culminar sua Grande Descoberta inicial sobre os efeitos criativos e coordenadores da ordem espontânea do mercado. Devido à sua complexidade, esses efeitos não podem ser imaginados, projetados ou dirigidos de cima para baixo com base em comandos coercitivos daqueles que possuem poder político. Além disso, o estudo da transição mais adequada, em cada caso e circunstância histórica, para o sistema ideal proposto, baseado na liberdade completa do Estado, é outro dos grandes e inevitáveis desafios que nossa Ciência enfrenta no momento. A transição deve se basear tanto na evitação de vácuos regulatórios repentinos quanto na privatização e no desmantelamento gradual, contínuo e específico (“desregulamentação social gradual”) de todo o quadro de intervencionismo estatista que hoje frustra os processos livres de cooperação voluntária. Em resumo, o triunfo definitivo na guerra da Ciência Econômica contra o “estatismo cultural” que hoje a corrompe e a confina só se tornará claro com (primeiro) a formulação teórica completa e (depois) a realização prática do ideal libertário de um sistema anarcocapitalista. É certo que somente se conseguirmos culminar esse ambicioso programa científico será possível para o futuro da humanidade se expandir exponencialmente, com uma prosperidade que hoje, devido à sua magnitude e complexidade, nem sequer conseguimos imaginar.

Muito obrigado.

Madrid, 24 de outubro de 2024

Universidad Rey Juan Carlos

Jesús Huerta de Soto

Palestra inaugural do professor Jesús Huerta de Soto na 8ª Conferência de Economia Austríaca, que ocorreu em Madri, no dia 24 de outubro de 2024.

______________________________________________________

Publicado originalmente em: https://encurtador.com.br/Zm8NS

Compartilhe

Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Pesquisar

©2017-2020 Money Report. Todos os direitos reservados. Money Report preza a qualidade da informação e atesta a apuração de todo o conteúdo produzido por sua equipe.