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O Day After do ex-ministro

Já se sabe que o ex-ministro Sergio Moro entregou à Polícia Federal mensagens de WhatsApp, arquivos de áudio e cópias de e-mails trocados com integrantes do governo. Essas seriam as provas de que o presidente Jair Bolsonaro teria tentado interferir politicamente nos trabalhos da PF.

Recapitulando: no dia 24, quando pediu demissão do Ministério da Justiça, Moro afirmou categoricamente que o presidente queria a exoneração de Mauricio Valeixo, diretor-geral da PF, por razões políticas, incluindo receber, com antecedência, relatórios elaborados pelo órgão sobre investigações em curso.

O pedido – ou a ordem, dependendo da interpretação – de Bolsonaro carrega em algo que fere o Estado de Direito: seus filhos são alvos de investigações. O senador Flávio por um esquema de rachadinhas na Assembleia Legislativas do Rio de Janeiro (processo colocado em pausa pelo Supremo Tribunal Federal, em função do foro privilegiado do chamado Zero Um). O outro, Carlos, é visto como articulador de uma central de fake news, também averiguado por agentes federais. Receber relatórios destes processos, assim, configuraria um claro conflito de interesses e até de obstrução de Justiça, uma vez que um pai estaria recebendo informações privilegiadas sobre diligências sobre seus filhos.

Com a entrega destes arquivos, que ainda precisam ser periciados, haverá um efeito dominó. Além do presidente, assessores do Planalto e outras pessoas foram envolvidos neste jogo. Ou seja, a PF vai primeiro estabelecer uma espécie de fluxograma do caso. O que foi feito, quem fez e quando fez. A partir daí, novos depoimentos serão tomados e mais material pode ser requisitado – ou até apreendido.

A primeira pergunta é: quem estará à frente dessa investigação?

Durante muitos anos, Moro foi extremamente próximo dos policiais federais de Curitiba, que trabalharam na Operação Lava-Jato. Seu depoimento, inclusive, foi tomado num prédio que conhece muito bem – a sede da PF no Paraná.

Mas a delegada encarregada das inquisições de ontem foi Christiane Corrêa Machado, chefe do Serviço de Inquéritos Especiais (Sinq), que não faz parte do círculo íntimo de Moro, e assumiu este cargo em agosto do ano passado, após concluir mestrado no Colégio Interamericano de Defesa, nos Estados Unidos. Antes, ela foi a vice-diretora de Inteligência da PF, comandou a divisão antiterrorismo do órgão e atuou em operações como Anaconda e Hurricane.

Ou seja, se for confirmada como a coordenadora desta investigação, Christiane deverá tocá-la com isenção. As oito horas que gastou no depoimento de Moro mostram que a delegada é detalhista e deve ter pedido inúmeras explicações ao ex-ministro da Justiça. De perfil técnico, deverá agir da mesma forma com aqueles que foram implicados com os áudios, mensagens e e-mails. Haverá, assim, uma rodada de novos depoimentos que podem trazer surpresas desagradáveis ao governo.

Percebe-se claramente que Moro estava pensando em sair do governo com estardalhaço há algum tempo. Ninguém grava conversas sem ter uma agenda bem definida em sua cabeça. Mas talvez seja o caso de se pensar: se estava insatisfeito, por que não saiu do Ministério? Ao gravar diálogos, no entanto, a finalidade era clara: registrar as pressões que estava sofrendo para utilizá-las depois.

Vamos supor que o presidente de fato o pressionou e, assim, fez algo errado. Do ponto de vista ético, está certo gravar colegas de administração? Provavelmente não, por melhores que sejam as intenções.

O ex-juiz já declarou que pretende buscar uma colocação na iniciativa privada. Pergunta-se: algum empresário contrataria um executivo que tem seu currículo a prática de gravações de seus colegas de trabalho? Dificilmente. Conclui-se facilmente que o candidato Moro, que estava em gestação desde os tempos da Lava-Jato, nasceu definitivamente no dia em que o botão “gravar” foi apertado. Não importa o que diga o ex-ministro: ele é candidatíssimo. E esta investigação o colocou no meio de um palanque que lhe renderá muitas manchetes e reportagens – tudo que um candidato precisa.

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