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Em tempos de “lockdown”, o Brasil conhece os efeitos nefastos do “deadlock” político

“Deadlock” é uma palavra em inglês usada para definir uma situação que envolve partes contrárias e na qual nenhum progresso pode ser feito, dada a intransigência dos dois lados. É exatamente o que está acontecendo com o presidente Jair Bolsonaro, que quer forçar o fim das regras de isolamento, e autoridades regionais, como governadores e prefeitos, que estão endurecendo as ferramentas de distanciamento social. Ou seja, em tempos de “lockdown”, estamos enfrentando um verdadeiro “deadlock” político.

Os discursos de Bolsonaro e de governadores como João Doria são movimentos coreografados, programados e ensaiados. Os dois personagens têm certeza absoluta de que estão corretíssimos e vociferam em críticas que não pretendem convencer o lado opositor – apenas cutucá-lo. Além disso, as farpas são disparadas apenas para marcar posição, reforçar o antagonismo e servir de base para, no futuro, indagar à sociedade uma pergunta em rom triunfante: “Eu não disse?”.

A temperatura está subindo conforme evoluem os ataques no front da política.

De um lado, Bolsonaro – acompanhado por um Paulo Guedes usando religiosamente uma máscara facial de proteção – quer a reabertura do comércio e de demais empresas para reativar uma economia que estancou. Neste raciocínio, as eventuais mortes que surgirão deste relaxamento são o preço a pagar diante do desastre econômico que o país enfrenta. Não há, aqui, nenhuma empatia pelas famílias dos cerca de 10 000 mortos pelo coronavírus.

Do outro lado do ringue, a preocupação é evitar o colapso do sistema de saúde, em especial a superlotação dos leitos de UTI – o que está perto de acontecer em algumas localidades. Dentro dessa lógica, o recrudescimento do isolamento é a única saída. E as empresas? Governadores e prefeitos olham para empresários, especialmente pequenos e médios, com aquela expressão usada por muitos motoristas aos mendigos que abordam seus carros em busca de uma esmola. A de que aquele problema é tão grande e insolúvel que não chega a ser sua responsabilidade.

Assim, temos dois antagonistas encastelados em seus cantos, movidos pelo combustível da intolerância. A um falta empatia com questões sanitárias. Ao outro, em relação à economia. A inexistência de colaboração e o “deadlock” em si só pioram a pior crise vivida pelo Brasil em toda a sua história.  

Será que esse é o caminho? Existe apenas uma preocupação principal? Por que os representantes do Poder Executivo – federal, estadual e municipal – não tentam encontrar juntos uma solução comum?

Sobre a saúde: dificilmente prefeitos e governadores voltarão atrás em suas medidas contra a pandemia, mesmo sem ter elementos que mostrem uma acurácia total de suas decisões (o próprio governador de Nova York, Andrew Cuomo, apresentou dados estarrecedores, de que 66 % dos pacientes hospitalizados por coronavírus em seu Estado estavam em casa, isolados como manda a cartilha).

Sobre a economia: mesmo que a quarentena terminasse hoje, a economia não pegaria no tranco e haveria um tempo de adaptação à liberdade de trabalhar, estudar e passear. A inércia provocada pela interrupção brusca de atividades será vencida com sacrifício e paciência. Assim, não adianta forçar a barra para religar a atividade econômica.

É preciso unir forças e pensar em como evitar o desastre que se aproxima, com uma número ainda maior de demissões e queda persistente no faturamento. A solução para a economia não está necessariamente em botar todo mundo de volta às ruas. Está em planejar essa retomada e oferecer condições para os mais afetados a repensar seus modelos de negócios, além de ter acesso a crédito justo para conseguir atravessar o mar de ondas revoltas que está à frente. E combater as consequências trágicas do desemprego, não necessariamente só oferecendo dinheiro através da Caixa Econômica Federal.

Deixar a queda de braço de lado e buscar soluções de cabeça fria é algo que as autoridades deveriam fazer imediatamente, deixando as rixas de lado. Injúrias podem ficar para o futuro – quem sabe no ano das eleições presidenciais. Por enquanto, todos vamos sofrer. Se nos unirmos, a travessia para o equilíbrio econômico pode não ocorrer mais rapidamente. Mas, com solidariedade e cooperação, vai doer muito menos.

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