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O caso de Wizard mostra como um bom empresário pode se dar mal no governo

O empresário Carlos Wizard Martins tem uma das trajetórias empresariais mais impressionantes do mercado brasileiro. Começou aos 10 anos de idade, acompanhando seu pai, caixeiro-viajante nas estradas do interior do Paraná. Em 1987, fundou aquela que seria uma das maiores escolas de inglês do país, vendida em 2014 por quase R$ 2 bilhões ao grupo Pearson. Hoje, é dono de vários negócios, entre os quais se destaca a cadeia de lojas de produtos naturais Mundo Verde.

Na segunda-feira passada (1), assumiu um cargo no Ministério da Saúde e ficou sob a mira de toda a imprensa nacional, até porque o país registra números bastante expressivos de contaminação e mortes durante a pandemia do coronavírus. No domingo, depois de uma semana conturbada, divulgou uma nota na qual desistia de colaborar com a administração federal.  Em seu comunicado, pediu “desculpas por qualquer ato ou declaração de minha autoria que tenha sido interpretada como desrespeito aos familiares das vítimas da Covid-19 ou profissionais de saúde que assumiram a nobre missão de salvar vidas”.

Há alguns dias, escrevi neste espaço que o combate à pandemia deveria abrigar mais pessoas vindas do setor privado e que as ideias de combate à pandemia não deveriam ficar concentradas nos entes públicos, uma vez que o Estado é sempre ineficiente quando comparado à iniciativa empresarial. Wizard, neste caso, era um exemplo que gerava boas expectativas.

A experiência com este empresário, no entanto, naufragou rapidamente. Por quê?

É preciso, antes de mais nada, considerar uma regra básica para quem assume um cargo público de grande exposição: não se pode falar tudo o que se pensa. Esse princípio ganha ainda mais importância quando se faz parte de governo que vive à turras com a imprensa, que observa com lupa todos os movimentos dos ministérios, autarquias e empresas estatais. Wizard começou, neste sentido, mal.De início, criou polêmica ao defender o uso da cloroquina no tratamento dos contaminados, um assunto explosivo nos meios de comunicação, até porque o presidente é partidário do uso do medicamento, ao contrário do que pensa a comunidade médica. Foi a deixa para que boa parte dos veículos começasse a questionar a indicação de um empresário sem formação técnica para um cargo importante na Saúde.

Depois disso, coincidência ou não, veio a decisão do Ministério de mudar os critérios de divulgação e da contagem de casos e de vítimas da pandemia, que foi acompanhada por outra saraivada de críticas.

Por fim, veio da declaração de que os governos estaduais poderiam estar inflando os números da pandemia, em função de uma disputa política com o Planalto. Uma nova chuva de farpas veio de tudo quanto é lado.

No mundo atual, os julgamentos negativos dos veículos pressionam os gestores públicos. Mas são as redes sociais amplificam as críticas e criam um ambiente contrário aos que se envolvem em polêmicas. Essas mesmas redes se mobilizaram contra Wizard numa onda crescente que ganhou maior força entre sexta-feira e sábado.

O efeito no mundo empresarial foi imediato.

A escola Wizard passou a usar mecanismo de “adwords” do Google e ganhou o topo da página toda vez que alguém digitava o nome do empresário no mecanismo de busca. Neste post pago, vinha a seguinte mensagem: “Desde 2014, a Wizard faz parte da maior empresa de educação do mundo e se tornou a Wizard by Pearson. A aquisição integral da Wizard pela Pearson marcou o fim do vínculo de qualquer natureza da marca com o empresário Carlos Martins”. A rede de lojas de produtos naturais Mundo Verde, que é de propriedade de sua família, também emitiu um comunicado no qual afirma que o Carlos Wizard Martins “é acionista do Mundo Verde, mas desde 2018 não atua na gestão da empresa”.

A curta semana como servidor público, assim, poderia causar eventualmente um boicote a seus negócios. A coação psicológica exercida pelas redes, a pressão natural de um cargo tão visado e uma perspectiva de prejuízos empresariais devem ter sido tão impactantes que fizeram o empresário pedir o boné. Como diz o investidor Warren Buffet, um dos homens mais ricos do mundo, “leva vinte anos para se construir uma reputação e cinco minutos para arruiná-la”.

Wizard percebeu que seus cinco minutos estavam perto de ser atingidos e resolver sair antes de se queimar por completo. Apesar da curta e desastrada passagem por Brasília, é preciso cuidado antes de criticá-lo desbragadamente. Afinal, estamos falando de alguém com sólida formação religiosa, que ergueu um negócio bilionário do zero. Nos últimos dois anos, é importante ressaltar, havia trabalhado como voluntário em Roraima para ajudar venezuelanos que tinham cruzado a fronteira, fugindo da fome e de um quadro político violento e instável. Lá, ajudou a acolher 12 000 dos 30 000 refugiados que entraram no Brasil (foi inclusive durante esse período que conheceu o general Eduardo Pazuello, ministro interino da Saúde).

Ao desistir de trabalhar no Ministério da Saúde e pedir desculpas por suas afirmações durante o tempo em que pertenceu à Pasta, Wizard seguiu uma das regras básicas da espera empresarial: não se apaixonar por uma ideia. Ao enxergar racionalmente que esse cargo seria a ruína de sua reputação, preferiu a porta da saída. O fracasso de Wizard, infelizmente, traz um efeito colateral trágico – o de afastar empresários com competência e boas intenções de colaborar com o Estado e oferecer soluções práticas e criativas para os grandes problemas que o Brasil enfrenta.

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