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O entusiasmo e a obsessão são as habilidades mais decisivas

E a escola afeta o desenvolvimento de ambas. Não deixe isso acontecer

Foram incontáveis as vezes que ouvi essas duas frases de efeito sobre a importância da educação escolar:

  • “A escola não é sobre aprender coisas específicas. É sobre aprender a como aprender.”
  • “A escola não é sobre como resolver algum problema específico. É sobre aprender a como pensar.”

Os seguidores dessas idéias frequentemente partem do princípio de que a melhor maneira de as crianças aprenderem a como aprender e a como pensar é por meio da escola.

Tais pessoas consideram perfeitamente aceitável o fato de que as coisas que as crianças aprendem na escola não serão diretamente úteis para elas fora da escola, pois acreditam que essas “meta-habilidades” de aprender e de pensar são perfeitamente transferíveis para o futuro, quando então, já na vida adulta, poderão ser utilizadas para conseguir os conhecimentos e as habilidades demandadas pelo mercado.

Só que este aprendizado imposto é totalmente antitético àquela outra habilidade realmente transferível e muito mais fundamentalmente importante: o entusiasmo.

O entusiasmo é a devoção genuína e espontânea a uma busca. É o impulso voluntário que nos leva a querer se aprofundar em algo, por pura paixão. O entusiasmo é a mais fundamental das habilidades transferíveis, pois é o mais poderoso motivador do aprendizado e da criatividade. Em qualquer área.

Por definição, o entusiasmo e a paixão não podem ser ensinados por meio de lições obrigatórias e compulsórias. O entusiasmo é como se fosse uma planta que só pode ser silvestre; que não pode ser cultivada por qualquer outra coisa senão a liberdade.

Acabando com o entusiasmo das crianças

Toda criança normal já nasce dotada de entusiasmos naturais. Elas são inerentemente dotadas de curiosidades. Elas são ávidas para explorar as coisas do mundo. Elas adoram observar e interagir com o mundo ao seu redor com grande entusiasmo e dedicação.

E, sob a adequada liberdade, esse entusiasmo irá crescer com o tempo e a experiência. Em algumas ocasiões, o entusiasmo chegará ao ponto da obsessão. As crianças irão se tornar obcecadas ou por alguma atividade específica (um esporte, um videogame, uma arte criativa etc.) ou por um assunto (dinossauros, uma linha de brinquedos, carros, aviões etc.).

Para os olhos de um adulto, esta obsessão poderá parecer inútil ou excessiva. Afinal, como é que um conhecimento profundo sobre Pokémon irá melhorar o futuro de uma criança? Mas eis aí o grande erro: a parte crucial não é o fato de a criança estar aprendendo tudo sobre Pokémon, mas sim o fato de que a criança, ao seguir o seu êxtase (para utilizar uma frase de Joseph Campbell), está aprendendo a como ficar absorta em algo; a como se aprofundar completamente em um assunto.

Esta, de novo, é a mais fundamental das habilidades transferíveis. No futuro, será esta propensão — construída na infância — à imersão voluntária e entusiasmada que o indivíduo poderá utilizar para dominar qualquer arte, assunto, trabalho manual, ocupação: desde design gráfico até administração de negócios e programação de computadores.

Só que os pais, os professores e todos os burocratas que criam os currículos do sistema escolar frequentemente fazem de tudo para oprimir e esmagar o desenvolvimento desta paixão. As crianças são tolhidas de seguir seus próprios interesses e compulsoriamente redirecionadas para fazer apenas aquilo que os adultos consideram ser mais importante. E mesmo essas atividades impostas também não são aprofundadas. Com o intuito de deixar a criança “mais experiente” e “mais madura”, as atividades são continuamente interrompidas e alteradas. Apenas explorações superficiais são permitidas.

O doutor Peter Gray, professor de psicologia do Boston College e especialista no assunto, escreveu todo um livro, intitulado  Livre para Aprender, relatando inúmeros exemplos práticos de como o sistema escolar compulsório mata o entusiasmo e a motivação das crianças. Em seu artigo “A escola é uma prisão e está destruindo nossas crianças“, ele diz:

Esta incrível vontade de aprender e esta enorme capacidade de aprendizado não são desligadas quando a criança faz 5 ou 6 anos de idade. Nós é que as desligamos por meio de nosso coercitivo sistema de educação compulsória. A maior e mais duradoura lição trazida pelo nosso sistema escolar é que aprender é algo maçante, que deve ser evitado ao máximo possível.

Ainda segundo Gray, o entusiasmo e o impulso natural pelo aprendizado são continuamente substituídos por um sistema de controle social que ensina às crianças que seus interesses e observações não mais importam.

Em nome da educação escolar, estamos cada vez mais roubando das crianças o tempo e a liberdade de que necessitam para se educarem por conta própria por meio de seus próprios métodos. Criamos um arranjo educacional no qual as crianças devem suprimir seus instintos naturais — os quais as estimulam a estar no controle do próprio aprendizado — para, em vez disso, simplesmente seguirem automaticamente métodos e caminhos criados para elas por adultos, e os quais não levam a lugar nenhum.

Já o conhecido educador e defensor do ensino doméstico (homeschooling) John Holt escreveu o seguinte em seu livro — hoje best-seller — Como as Crianças Aprendem:

Queremos acreditar que estamos enviando nossas crianças para a escola para que elas aprendam a pensar. Mas o que realmente estamos fazendo é ensinando-as a pensar de maneira errada. Pior: estamos ensinando-as a abandonar uma maneira natural e poderosa de pensar e a adotar um método que não funciona para elas e o qual nós mesmos raramente usamos.

Ainda pior do que tudo isso: nós tentamos convencê-las de que, ao menos dentro da escola, ou mesmo em qualquer situação em que palavras, símbolos ou pensamento abstrato estejam envolvidos, elas simplesmente não podem pensar. Devem apenas repetir.

No final, quando a criança sai do sistema escolar compulsório, sua capacidade de entusiasmo — a paixão genuína e espontânea a uma busca — está completamente atrofiada. Ela não mais pode seguir suas paixões simplesmente porque ela já se esqueceu de que tal coisa existe. A única coisa que pode impulsioná-la a realizar algo é a motivação externa dada por figuras de autoridades. Tudo o que ela aprendeu é que deve fazer apenas aquilo que os outros consideram bom para ela.

Consequentemente, no trabalho e na vida em geral, essa pessoa ficará à deriva. Será um adulto que irá apenas a reboque dos outros, sem rumo certo na vida.

Meu caso

Lembro-me de ter tido, no início de minha infância, uma sucessão de manias que à época eu chamava de “febres”. Eu descobria um determinado assunto e então ele dominava minhas atenções e interesses por meses. E então, com o tempo, eu ficava saciado e me dava por satisfeito, e ia então para o assunto seguinte. Tive várias fases. Fui obcecado com dinossauros, depois com animais em geral (colecionava os nomes científicos de todas as espécies que saíam nas revistas da National Geographic), depois com He-Man, Transformers etc.

E então minha suscetibilidade a contrair essas febres foi sendo interrompida e finalmente vencida por essa verdadeira máquina de moer chamada de “sistema escolar compulsório”. Fui dominado pela apatia e tive uma crise existencial. E isso durou até a universidade.

Porém, quando finalmente me formei, minha capacidade de paixão e entusiasmo voltou, e veio forte. Reaprender a habilidade da obsessão e do entusiasmo foi uma das mais importantes etapas do meu processo de “desescolarização”.

Vencida a crise existencial, tornei-me obcecado em estudar teologia e cosmologia. Após perceber que eu não compreendia o mundo à minha volta, tornei-me obcecado em aprender sobre a história do mundo, e me tornei autodidata no assunto. Após descobrir as idéias da liberdade, tornei-me obcecado em estudar por conta própria os princípios da Escola Austríaca de Pensamento Econômico e a filosofia política do libertarianismo. Deixar-me ser levado por meu êxtase ao longo desses caminhos de obsessão finalmente me levou a uma carreira profissional bem-sucedida e gratificante.

Meu único arrependimento é que esta feliz progressão tenha sido tão longamente postergada por aquele martírio devorador de entusiasmos e arrefecedor de espíritos que é o sistema escolar compulsório.

Conclusão

Não ceda à tentação de frustrar as paixões de seus jovens filhos; não restrinja suas obsessões. Confie nas escolhas deles. Deixe-os cultivar sua capacidade nata de se devotar com entusiasmo, paixão e júbilo às suas próprias buscas. A paixão e o entusiasmo são os ativos mais preciosos deles: a habilidade fundamental que irá gerar todas as outras habilidades. Não roube isso deles. Deixe-os livre para construir suas paixões. Isso lhe deixará orgulhoso no futuro.

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Por Daniel Sanchez

Publicado originalmente em: cutt.ly/EBmMRop

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