Passada a régua do primeiro turno em São Paulo, a grande charada dos candidatos remanescentes é como conquistar o maior espólio eleitoral desta campanha: os 1.719.274 votos destinados a Pablo Marçal. O ex-coach já disse que não apoiará Ricardo Nunes ou Guilherme Boulos, mas declarou que aposta na vitória do psolista, depois de chamar o prefeito, o governador Tarcísio de Freitas, o ex-presidente Jair Bolsonaro e o pastor Silas Malafaia de “arrogantes”.
Marçal foi o vencedor em regiões paulistanas de alta densidade populacional, como os bairros de Vila Formosa, Pirituba, Vila Matilde, Mooca e Tatuapé. Além disso, teve boa performance na Vila Maria e no Tucuruvi. Muitos analistas acreditam que uma parcela significativa destes votos não está relacionada apenas a uma atitude de protesto contra os políticos tradicionais. Além de se apoiar na defesa do conservadorismo e de preceitos religiosos, o candidato do PRTB também teria convencido essa parcela do eleitorado com um discurso calcado em empreendedorismo e prosperidade.
Não é à toa, portanto, que Nunes e Boulos tenham incorporado essa pauta em suas primeiras declarações públicas no day after das eleições. “Tem dois principais perfis do eleitor do Marçal. Um é ser de direita. Naturalmente, esse eleitor vai vir comigo. O outro é um eleitor que viu nele essa questão de empreendedorismo, da prosperidade. Reconheço que é algo que eu preciso reforçar e vou reforçar. É uma contribuição que ele deu, que eu não imaginava que [o tema do empreendedorismo] estivesse tão ativo na memória das pessoas como fundamental”, disse o prefeito em reunião com um grupo de vereadores eleitos.
Já Boulos disse que irá adotar a proposta “Jovem Empreendedor” (empréstimos para quem quiser abrir o próprio negócio), de autoria da candidata Tabata Amaral, que ficou em quarto lugar no primeiro turno. Embora essa ideia específica seja de Tabata, a inclusão deste tópico nas propostas do PSOL é um reconhecimento à ênfase dada por Marçal ao assunto.
Há, porém, um problema nesta abordagem.
Pode-se gostar ou não de Marçal, mas ele é um ícone mais do que adequado para falar de enriquecimento através da iniciativa privada. Ricardo Nunes até pode evocar suas origens humildes (ao contrário, curiosamente, de Boulos) para falar do tema. Mas o público o enxerga muito mais como político do que como empreendedor. Já no caso do candidato do PSOL, esse discurso pode soar falso ou oportunista.
Segundo pesquisa divulgada pelo Sebrae no ano passado, 53% dos brasileiros sonham em ser empreendedores. Isso explica a aceitação do eleitorado em relação ao tom adotado por Pablo Marçal, pois em São Paulo talvez esse índice seja ainda maior que a média nacional. Esperemos que essa pauta – sempre restrita aos liberais – de fato ganhe tração entre a esquerda e deixe de ser apenas um discurso eleitoreiro. O empreendedorismo é a principal ferramenta de crescimento econômico e de mobilidade social em um país. Por isso, precisamos estimular o surgimento de mais empreendedores e propiciar o crescimento de milhões que hoje estão por aí, batalhando por seus negócios e pela prosperidade.