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Os riscos da reforma tributária para o setor de Serviços

O secretário extraordinário do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, teve uma longa entrevista publicada ontem pelo jornal Valor Econômico. O tema, evidentemente, é a reforma tributária. Várias dúvidas sobre o projeto pairam ainda sobre a sociedade. Mas o que vem tirando o sono de vários empresários é como vai ficar a tributação das empresas de serviços, cujo setor representa cerca de 70 % do Produto Interno Bruto brasileiro.

Perguntado sobre a alíquota do novo IBS (imposto sobre bens e serviços), Appy deu a seguinte resposta: “A alíquota de referência, aquela adotada automaticamente, será a que mantém a carga tributária atual. As pessoas precisam entender que já pagamos isso, de um jeito todo torto, de forma não transparente. No longo prazo, o efeito da reforma é de redução do custo do consumidor. Porque hoje a pessoa paga a carga tributária e paga pela ineficiência do sistema. Então se tenho um custo burocrático enorme, isso será reduzido com a reforma, o que tende a ser repassado para preço. No longo prazo, mesmo mantendo a carga, a tendência da reforma é ser deflacionária. No curto prazo há mudança de preços relativos. A alíquota também é determinada pelas exceções. Quanto mais exceções e tratamentos favorecidos, maior será a alíquota básica para manter a carga. Outro fator é o grau de sonegação e evasão. Nossa avaliação é de quando se simplificam as regras, isso tende a cair. A alíquota será calibrada ao longo da transição. Vendo o efeito positivo da reforma sobre a sonegação, por exemplo, isso se refletirá na alíquota ao fim da transição. Essa é a nossa posição, que o Congresso pode mudar”.

Essa resposta levanta alguns questionamentos, especialmente quando o secretário diz que  a “alíquota de referência, aquela adotada automaticamente, será a que mantém a carga tributária atual”. Isso quer dizer que a alíquota do IBS se manterá no patamar de hoje ou que uma nova alíquota vai manter a carga tributária total (aquela que é a soma daquilo que todos pagam) no nível atual?

O ministro Fernando Haddad já deu algumas declarações nas quais afirmou que a indústria paga muitos tributos e que essa situação precisa ser revista. Se a arrecadação proporcionada hoje pelas empresas industriais cair, suspeita-se fortemente que o setor de serviços pode ser chamado para pagar a conta, ao lado dos brasileiros mais ricos.

Appy afirma que a queda do custo burocrático das empresas para lidar com o emaranhado fiscal brasileiro deverá ser repassado ao consumidor. Vamos fazer um rápido exercício para ver se esse raciocínio faz sentido. Tomemos como exemplo um fabricante de bens de alto consumo, baseado no Brasil, com 150.000 funcionários. Digamos que, nessa corporação, a equipe para calcular tributos seja enorme, de 1.000 pessoas – ou 0,67 % do total de colaboradores. Digamos que toda a equipe seja dispensada (algo improvável) e que essa economia seja repassada diretamente ao preço de varejo (também altamente improvável). Quanto isso representaria na etiqueta de um produto na prateleira? Alguns centavos?

É evidente que haverá ganhos enormes com a desburocratização do processo fiscal. Mas não necessariamente haverá uma economia expressiva para mercadorias que são vendidos no varejo brasileiro, salvo algumas exceções.

Há outro problema a ser resolvido, esse na esfera pública. Tudo indica que, ao se fundir o Imposto sobre Serviços (ISS) com o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), haverá perdas para municípios e eventualmente governo estaduais. O secretário já declarou que os prefeitos terão de aceitar as novas regras. Mas, na prática, a coisa não funciona assim. As prefeituras têm canais diretos com o Congresso Nacional – e uma pressão dos municípios pode criar mudanças no texto final da reforma que serão contrárias aos interesses da Fazenda.

Não se pode fazer a reforma apenas para desburocratizar o sistema e eleger uma meia-dúzia de vítimas para arcar com a diminuição da arrecadação federal – especialmente quando se mexe com o empresário e com o empreendedor que são responsáveis por 70 % do PIB. É preciso ouvir os setores afetados antes de apresentar um texto ao Congresso. Mas a burocracia prefere defender suas ideias e repassar as mudanças aos parlamentares.

A emenda, aqui, pode ficar pior que o soneto. Muito pior.

Toda vez que vejo essa discussão sobre reforma tributária, sempre lembro da música “Taxman”, dos Beatles, composta por George Harrison para protestar contra os impostos britânicos, que poderiam levar mais de 80 % dos ganhos dos cidadãos nos anos 1960:

“Let me tell you how it will be (Deixe-me dizer como vai ser)

There’s one for you, nineteen for me (Fique com um para você e eu pego dezenove para mim)

Should five percent appear too small (Se cinco por cento parecer muito pouco)

Be thankful I don’t take it all (Agradeça por eu não ficar com tudo)”

Só nos resta pressionar – e muito – para que a conta, mais uma vez, não caia nos ombros do empresariado.

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