O plenário do Senado aprovou na noite de quarta-feira (3), em primeiro turno, o texto-base da PEC Emergencial, que permite ao governo federal pagar o auxílio emergencial em 2021 por fora do teto de gastos do orçamento e do limite de endividamento. No entanto, o programa ficará limitado a um custo total de R$ 44 bilhões. A votação em segundo turno ficou para esta quinta-feira (4). Depois disso, se a aprovação for confirmada, a proposta seguirá para a Câmara dos Deputados.
Essa PEC permite que o auxílio emergencial seja financiado com créditos extraordinários, que não são limitados pelo teto de gastos. As despesas com o programa não serão contabilizadas para a meta de resultado fiscal primário e também não serão afetadas pela chamada “regra de ouro” — mecanismo que proíbe o governo de fazer dívidas para pagar despesas correntes, de custeio da máquina pública.
O valor, a duração e a abrangência do novo auxílio ainda serão definidos pelo Executivo. A primeira versão do auxílio ultrapassou os R$ 300 bilhões de custo total, tendo chegado a cerca de 68 milhões de pessoas, em duas rodadas: na primeira, que durou cinco meses, foram parcelas de R$ 600 por pessoa; na segunda, chamada de “auxílio residual”, foram parcelas de R$ 300 durante quatro meses, e com um público-alvo menor. O novo montante representa menos do que o auxílio residual, que custou cerca de R$ 64 bilhões.
Contrapartida fiscal
Em contrapartida, a proposta impõe medidas de contenção fiscal para compensar o aumento de despesas. A principal delas são dispositivos a serem acionados quando os gastos do poder público atingirem um determinado patamar. Esses “gatilhos” passam a ser permanentes, e não restritos à pandemia de covid-19.
Na esfera federal, todas as vezes em que a relação entre as despesas obrigatórias sujeitas ao teto de gastos e as despesas totais superar 95%, os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário e o Ministério Público deverão vedar aumento de salário para o funcionalismo, realização de concursos públicos, criação de cargos e despesas obrigatórias, concessão de benefícios e incentivos tributários e lançamento de linhas de financiamento ou renegociação de dívidas.
Os estados e municípios estão sujeitos à mesma regra dos 95%, porém apenas de forma facultativa. No caso desses entes da federação, também será possível acionar as medidas de contenção de gastos quando a relação entre as despesas correntes e as receitas correntes (impostos e contribuições) atingir 85%. Nesse caso, a implementação dependerá apenas de atos do Executivo, com vigência imediata.
A PEC também traz a previsão de diminuir incentivos e benefícios tributários existentes. Segundo o texto, o presidente da República deverá apresentar, em até seis meses após a promulgação da emenda constitucional, um plano de redução gradual desse tipo de benefício. São feitas exceções a programas como o Simples, o subsídio a produtos da cesta básica e a Zona Franca de Manaus.
Calamidade pública
A partir da promulgação da PEC Emergencial, a Constituição passará a contar com um regime orçamentário excepcional para situações de calamidade pública — como é o caso da pandemia. Segundo o texto, durante a vigência do estado de calamidade, a União deve adotar regras extraordinárias de política fiscal e financeira e de contratações para atender às necessidades do país, mas somente quando a urgência for incompatível com o regime regular.
As proposições legislativas e os atos do Executivo com propósito exclusivo de enfrentar a calamidade e suas consequências sociais e econômicas ficam dispensados de observar várias limitações legais, desde que não impliquem despesa obrigatória de caráter continuado. Entre as regras que ficam suspensas está a proibição de concessão ou ampliação de benefício tributário que gere renúncia de receita. Também estão suspensos os limites e condições para contratação de operações de crédito. O regime extraordinário também permitirá a adoção de contratação simplificada de pessoal, em caráter temporário e emergencial, e de obras, serviços e compras.
O superávit financeiro apurado em 31 de dezembro do ano anterior poderá ser destinado à cobertura de despesas com medidas de combate à calamidade pública, além do pagamento da dívida pública. Durante a vigência da calamidade pública, ficará também suspensa a proibição de que pessoas jurídicas em débito com o sistema de seguridade social assinem contratos com o poder público.
A PEC prevê, ainda, que uma lei complementar poderá definir outras suspensões, dispensas e afastamentos aplicáveis durante a vigência da calamidade pública.
A decretação do estado de calamidade pública, que vai disparar o regime extraordinário, passa a ser uma atribuição exclusiva do Congresso Nacional, a partir de proposta do Executivo.
Desvinculação de receitas
A PEC também muda regras para vinculação de receitas, liberando fatias do Orçamento que hoje são destinadas exclusivamente a certas áreas. Atualmente, a Constituição proíbe a vinculação de receitas tributárias, com algumas exceções. A proposta mexe nessa estrutura, estendendo a proibição para todos os tipos de receita e expandindo as exceções.
Uma ressalva que desaparece é a que permite a vinculação de receitas para serviços de administração tributária — dessa forma, essa vinculação passa a ser proibida. Por outro lado, uma série de fundos federais são incluídos entre as ressalvas e poderão manter receitas orçamentárias reservadas para eles: Fundo Nacional de Segurança Pública (FNSP), Fundo Penitenciário Nacional (Funpen), Fundo Nacional Antidrogas (Funad), Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), Fundo de Defesa da Economia Cafeeira (Funcafé) e Fundo para Aparelhamento e Operacionalização das Atividades-Fim da Polícia Federal.
Receitas de interesse da defesa nacional e as destinadas à atuação das Forças Armadas também não terão recursos desvinculados.
Educação e saúde
Originalmente, a PEC Emergencial previa outras medidas imediatas de redução de despesas para compensar o pagamento do ajuste emergencial, como o fim da vinculação orçamentária mínima para a educação e a saúde e a redução salarial de servidores públicos. Esses dispositivos causaram polêmica entre os senadores e foram removidos pelo relator, senador Marcio Bittar (MDB-AC).
Atualmente, a Constituição obriga a União a aplicar, no mínimo, 18%, e os estados e municípios, no mínimo, 25%, da receita resultante de impostos na manutenção e no desenvolvimento do ensino. À saúde, a União deve destinar 15% da sua receita corrente líquida, enquanto estados e Distrito Federal, 12% da arrecadação de impostos, e municípios, 15%, também da arrecadação de impostos. Bittar afirmou ser favorável ao fim desses pisos, mas reconheceu que o debate não está “amadurecido” neste momento.
Outro item retirado do texto da PEC seria o fim dos repasses do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) para o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Hoje, um mínimo de 28% da arrecadação do PIS/Pasep, que abastece o FAT, vai para o financiamento de programas do BNDES.
(Agência Senado)