Em tempos de redes sociais, expor a vaidade é algo perigoso. Muita gente acaba patrulhando de forma implacável aqueles que ficam exibindo suas qualidades em público. Essa manifestação da soberba, no passado, era apenas exercida na forma direta – aquela situação na qual uma pessoa fala, sem rodeios, sobre como ela é incrível. É o tipo de coisa que pode gerar reações inofensivas, como muxoxos, ou ataques virulentos, como posts ácidos.
Recentemente, porém, há outros tipos de presunção rolando nas mídias sociais. Um deles é enaltecer seus feitos profissionais sem reivindicá-los, colocando essas conquistas na conta da pessoa jurídica. O outro é a postagem de textos que mostram uma modéstia fora do comum, enobrecendo os objetivos de vida que a pessoa se impôs nos campos do trabalho, do caráter e do espírito. Ou seja, uma modéstia imodesta.
Nada contra falar bem de si. Afinal, se você não fizer isso, quem é que vai fazê-lo?
Mas existem formas e formas de se exaltar nossos pontos positivos. O cabotinismo disfarçado pode ser temerário, especialmente quando se faz isso repetidamente. Isso pode ser visto com frequência em redes como o LinkedIn. Tenho, às vezes, vontade de perguntar aos autores e autoras desse tipo de post: qual a razão para tantos autoelogios? Muitas vezes, quando queremos chamar exageradamente a atenção dos outros é porque existe uma razão escondida para este comportamento. Em alguns casos, pode ser a pressão exercida pela concorrência; em outros, algum tipo de insegurança.
O problema destas exibições explícitas de afetação é que podemos ser vistos como arrogantes, mesmo que não sejamos. Além disso, quando começamos nossa vaidade ganha asas, existe uma boa possibilidade de nos desconectarmos da realidade. Autoestima é uma coisa; narcisismo em nível alto é outra. E geralmente os convencidos acabam se tornando menos competitivos, pois acham irretocável tudo o que fazem.
Quando escrevemos seguidamente sobre metas de vida que nos tornariam seres humanos perfeitos, entramos em uma seara na qual somos vaidosos, mas queremos esconder a vaidade. E, neste momento, nossas manifestações podem soar falsas.
Qualquer reflexão sobre esse comportamento, considerado um dos sete pecados capitais, não pode ser feita sem colocar a seguinte frase no contexto: “A vaidade é a areia movediça da razão”. A sentença de George Sand (na verdade, pseudônimo de Amandine Dupin) mostra que os vaidosos deixam de ser racionais quando o assunto gira em torno deles mesmos.
Conheço um apresentador de televisão que é considerado vaidoso ao extremo. Curiosamente, trata-se de uma pessoa muito inteligente. Mas não passa essa imagem aos outros, pois a vaidade acaba ofuscando a percepção que os outros têm dele.
Há quem se sinta desconfortável com elogios, mas ainda assim é vaidoso (ou vaidosa). É o meu caso; adoro ser elogiado, mas não fico à vontade eventuais enaltecimentos. Talvez seja o jeito que me faça manter os pés no chão – mas nem sempre isso é possível.
A vaidade é uma forma silenciosa de nos amarrar a certas situações que se revelam perniciosas. Um exemplo está no filme “Advogado do Diabo”, estrelado por Keanu Reeves (o advogado) e Al Pacino (o diabo em si). Reeves consegue desbaratar os planos de Lúcifer e volta ao passado, anulando tudo o que tinha acontecido com ele durante a narrativa. Neste mundo que voltou ao momento zero, ao final de uma audiência, ele é abordado por um repórter, que deseja fazer um perfil do jovem causídico. Reeves, um tanto relutante, acaba aceitando. Ele sai de cena e o jornalista olha para a câmara, se transformando em Al Pacino, que diz:
– A vaidade, definitivamente, sempre foi o meu pecado favorito.