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A teoria da conspiração de esquerda

Durante os quatro anos de governo Bolsonaro, testemunhamos uma enxurrada de teorias da conspiração, quase todas alinhadas ideologicamente com a direita. Como passamos boa parte desse tempo em pandemia, muitas delas foram disseminadas para desmoralizar as vacinas e as recomendações da Organização Mundial da Saúde. Essas teorias acabaram colocando dúvidas na cabeça de muita gente e contaminou o que deveria ser uma discussão meramente técnica com argumentos falsos e deliberadamente inventados para minar a credibilidade das autoridades sanitárias.

Há duas lógicas nesse processo. A primeira é encontrar explicações que tenham uma certa lógica e criem discussões intermináveis, oferecendo a leigos argumentos que possam fomentar debates com quem de fato entende do assunto. A segunda lógica é manter os duelos verbais em um campo hermético, no qual a maioria das pessoas não tem pleno domínio do conhecimento. Diante de assuntos complexos, assim, alegações inventadas não podem ser questionadas no calor da briga e apenas tornam o debate mais difuso.

O ponto de partida é sempre o mesmo: desacreditar uma fonte que defenda uma ideia diferente daqueles que propagam teorias da conspiração. Ou atacar uma ideia diferente da sua com pressupostos falsos e sofismas.

Recentemente, vimos isso acontecer no contexto em que o chamado PL das Fake News foi discutido. Os defensores da proposta, que teve enorme receptividade na esquerda, começaram a acusar as Big Techs – em especial o Google – de manipular seus algoritmos de busca para favorecer as críticas ao projeto (uma vez que essa era a posição da empresa de tecnologia).

Pode até ser que o Google tenha feito isso. Mas os detratores da empresa fazem acusações sem provas e usam apenas a sua percepção para corroborar suas teorias da conspiração. Manipular um algoritmo não é exatamente muito difícil. Mas, dentro de uma estrutura corporativa, seria uma atitude que vazaria rapidamente. A companhia tem muita gente experiente em seus quadros para saber que esse tipo de esperteza sempre termina mal.

Um artigo publicado nesta semana na Folha de S. Paulo, de autoria de Berthier Ribeiro Neto, diretor de engenharia da empresa para a América Latina, toca nesse assunto e refuta a acusação de manipulação de resultados de busca. Essa queixa constava em uma reportagem publicada na semana passada no mesmo jornal, baseada em um relatório preparado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. “Aparentemente baseado em um conjunto mínimo de consultas para o temo “PL 2.630”, feitas na última semana de abril, o relatório não detalha sua metodologia estatística e faz acusações sérias sobre a credibilidade da busca, que podem ser contestadas por fatos observáveis na própria web”, escreveu Ribeiro Neto.

Vamos supor que o Google tivesse mesmo manipulado sua busca para que os internautas vissem majoritariamente textos que espinafravam o projeto de lei. Isso quer dizer que as pessoas iriam automaticamente se alinhar com as posições defendidas nessas postagens? Não necessariamente.

Incorremos geralmente em um erro ao achar que as pessoas vão acreditar em tudo o que leem nas redes. Isso simplesmente não é verdade. Mas, então, qual seria a razão pela qual as Fake News se espalham tão rápido? Isso ocorre porque os internautas que repassam mentiras querem acreditar naquilo que estão lendo. E, mesmo que não tivessem lido um post fake, iriam questionar um texto com opinião contrária à sua.

E o que dizer da grande massa de deputados que era contra o texto apresentado na pauta da Câmara? Seria muita ingenuidade achar que essa rejeição teve origem em uma busca na web – ou que esses deputados tivessem sido influenciados de uma forma não republicana pelas Big Techs. A grande maioria dos deputados de centro, centro-direita ou direita viu no texto uma oportunidade para que se estabelecesse uma censura na rede. Certa ou não, essa percepção se consolidou antes que as Big Techs fizessem qualquer campanha contra o texto.

Como se pode ver, a teoria da conspiração é um recurso utilizado por quem deseja tumultuar o debate e desacreditar os oponentes. Não é um monopólio da direita – e a esquerda mostrou, neste caso, que tem tanto know-how nesse assunto quanto os bolsonaristas mais empedernidos.

Neste mundo polarizado, os dois lados querem apenas uma coisa: ganhar o debate. Não importa se os argumentos que baseiem a vitória sejam falsos ou distorcidos. Só importa derrotar o outro lado. Mesmo que seja por caminhos tortuosos, moralmente questionáveis e errados.

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