Sofia Vergara está muito bem como a traficante colombiana Griselda Blanco, em série que estreou recentemente na Netflix (apesar das próteses faciais, dentes falsos e nariz postiço). O seriado tem cadência e narrativa parecida com “Narcos” e isso não é à toa: o principal produtor das duas atrações é o mesmo, Eric Newman. Tudo começa de forma instigante, com uma tela negra na qual se destaca a frase do chefão do Cartel de Medellín, Pablo Escobar: “O único homem que temi em minha vida foi uma mulher chamada Griselda Blanco”.
Ao longo dos seis episódios, me peguei várias vezes torcendo por essa mulher impiedosa e calculista, para quem a vida humana não valia nada. Percebi, então, que havia tido o mesmo comportamento em “Narcos” e “Breaking Bad”. “Será que eu, no fundo, gosto de traficantes?”, pensei comigo mesmo. Lembrei, então, que também tinha torcido para os vilões em “Casa de Papel” e “Peaky Blinders”. E como não ser fã de Michael Corleone nos três capítulos de “O Poderoso Chefão”? Ou de Hannibal Lecter em “O Silêncio dos Inocentes”? Ou de Darth Vader em “Guerra nas Estrelas”?
Talvez exista um ponto em comum entre vários representantes da vilania nas séries de traficantes de droga: eles são retratados com uma forte dose de humanidade e suas interpretações não são caricatas. É possível, assim, criar algum tipo de empatia com esses personagens, pois o roteiro não os coloca como pessoas cruéis o tempo todo. No caso específico de Pablo Escobar e Griselda Blanco, por exemplo, boa parte da história é gasta para mostrar o cotidiano dessas pessoas dentro de suas casas, lidando com suas famílias de forma amorosa.
Mas talvez Sigmund Freud tenha uma explicação melhor para isso. Nosso comportamento é constantemente moldado por nosso superego, aquela parte da mente que representa os valores morais da sociedade e nos impede de fazer tudo aquilo que queremos, dando vazão às paixões, às raivas e aos desejos. Os vilões são personalidades moldadas sem superego: fazem tudo o que desejam. Provavelmente, esse é um ponto que nos aproximam dos “bad guys”, pois secretamente queremos romper as barreiras do superego e fazer o que nos dá na telha.
Sentimos, muitas vezes, fascínio pelas personagens do mal porque não entendemos direito como esse comportamento surge na alma de alguém. Além disso, a vileza sempre surpreende alguém que é considerado normal.
Em relação à saga de Griselda, a história é contada de uma forma segundo a qual percebemos que há, naquele universo em que ela habita, gente muito pior que ela – e que, em determinadas situações, esses sujeitos são seus algozes. Essa empatia permanece com os telespectadores durante muito tempo e resiste até algumas atrocidades cometidas pela protagonista. Além disso, a história, que se passa do final dos anos 1970 até meados da década seguinte, mostra como o machismo e a misoginia foram uma barreira que Griselda teve de suplantar para chegar ao topo da cadeia alimentar do tráfico. O aspecto, digamos, feminista do roteiro também levanta simpatias para o papel vivido por Sofía Vergara.
O formato, de seis episódios, é perfeito para uma maratona curta durante o final de semana. Se a agenda estiver livre neste sábado, aproveite. É diversão garantida.