Estava ouvindo nesse final de semana algumas músicas de Rita Lee e de Gilberto Gil, todas gravadas entre 1978 e 1982. O que elas têm em comum? A presença de um tecladista e arranjador de mão cheia, que foi praticamente onipresente em todos os sucessos da MPB no início da década de 1980. Estamos falando de Lincoln Olivetti, que saiu dos bastidores e ficou conhecido quando regravou a canção “Baila Comigo”, de Rita Lee – e a versão virou tema de abertura de novela com o mesmo nome, produzida em 1981.
Prestei atenção pela primeira vez no trabalho dele após ouvir a balada “Mania de Você”, que Rita Lee gravou com o marido, Roberto e Carvalho. Logo no início, há um fraseado de piano elétrico que foi baseado em um arranjo de “Riders in the Storm”, da banda americana “The Doors”. De quem foi a ideia? Sim, de Olivetti. No LP seguinte, Rita gravou “Lança Perfume”, com um piano dançante praticamente copiado de “What a Fool Believes”, dos Doobie Brothers. Quem pilotava os teclados? Ele mesmo. Recentemente, descobri que Olivetti era autor da música “Black Coco”, uma representante nacional do ritmo disco. Só que a levada era igual de “Rock Your Baby”, sucesso dos anos 1970 com George McCrae.
Olivetti, no entanto, não passou sua carreira apenas copiando os outros. Ele teve uma carreira meteórica e prolífica, trabalhando para praticamente todos os grandes nomes da música brasileira.
Três grandes sucessos de Gal Costa, por exemplo, têm Olivetti como arranjador: “Meu Bem, Meu Mal”, “Festa do Interior” e “Um Dia de Domingo”, em dueto com Tim Maia. Por falar nele, “Acenda o Farol” foi também arranjada pelo maestro de Nilópolis.
Quer mais? Nas músicas abaixo, Lincoln Olivetti atuou como músico ou arranjador:
+ “Pai”, de Fábio Jr.
+ “Palco”, de Gilberto Gil.
+ “Leão Ferido”, de Biafra.
+ “De Repente, Califórnia”, de Lulu Santos.
+ “Estrelar”, de Marcos Valle.
Mas ele não ficou apenas nos bastidores dos estúdios. Em 1982, gravou um disco com o guitarrista Robson Jorge, um trabalho primoroso, e fez a trilha sonora do filme “Rio Babilônia” (uma obra que deixa a desejar).
A superexposição, no entanto, lhe causou dois problemas. O primeiro foi a dificuldade em se libertar da fórmula de sucesso, fazendo com que seu trabalho parecesse repetitivo. O segundo? Os críticos começaram a pegar no pé e seu nome começou a ficar queimado no mercado. Submergiu e voltou aos poucos, com novas ideias – como por exemplo no álbum “Assim Caminha a Humanidade”, de Lulu Santos, no qual atuou junto com o DJ Memê.
Infelizmente, Lincoln Olivetti foi para o andar de cima em 2015. Sua morte foi lamentada por muitos e as críticas contrárias à sua obra foram devidamente esquecidas e enterradas. O mundinho musical brasileiro – especialmente o pop nacional – se ressente de sua ausência. Ele teria muito a contribuir no cenário atual, que precisa desesperadamente de maestros talentosos para tirar vários artistas da vulgaridade melódica.