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O que ainda precisa ser dito sobre o atentado contra Trump

O único elemento que faltava para sacramentar uma vitória acachapante de Donald Trump era justamente o candidato republicano adotar a imagem de mártir – algo semelhante ao que aconteceu no Brasil com o ex-presidente Jair Bolsonaro em 2018. Neste mundo cada vez mais polarizado, muitos indivíduos enxergam o processo eleitoral como uma espécie de luta entre o Bem e o Mal. A tentativa de assassinato de um proponente acaba reforçando essa tese e beneficiando quem levou o tiro.

Ocorre que este planeta em que vivemos ficou muito difícil de interpretar. Já se foi a época em que havia uma dicotomia fácil de assimilar, aquele processo que coloca um personagem como James Bond de um lado e Ernst Stravos Blofeld de outro (ou os nazistas contra os aliados, como ocorreu na Segunda Guerra Mundial). Neste universo de 2024, os extremos possuem, em doses diferentes, elementos bons e ruins. Mas cada lado se vê como o mocinho e acusa o outro de ser o vilão.

Neste quadro, não há uma terceira opção: temos Trump contra Joe Biden, Emmanuel Macron em oposição a Marine Le Pen ou Luiz Inácio Lula da Silva contrário a Jair Bolsonaro. O atentado contra o candidato republicano, porém, colocou um novo ingrediente nesta polarização: Trump ganhou a simpatia dos indecisos com o ato violento, um impulso que deve consolidar o triunfo na corrida pela Casa Branca.

O tiro disparado na Pensilvânia pode ter sido a pá de cal para definir o resultado dessa campanha. Mas o fato é que a candidatura de Donald Trump já estava com a faca e o queijo na mão, muito favorecida pela inépcia democrata. A incompetência da agremiação azul começou a ganhar força nos últimos dois anos, quando os sinais de senilidade de Biden ficaram evidentes. Os caciques democratas preferiram ignorar as claras evidências de que Biden iria demonstrar fragilidade na corrida eleitoral e simplesmente fizeram vista grossa para a decadência física do presidente americano.

Poderiam ter preparado um plano B, mas deixaram tudo como estava. Também teriam a possibilidade de turbinar alguns nomes do partido para trabalhar a ribalta nacional, mas permaneceram inertes. Quando perceberam que Biden tinha chances quase que inequívocas de derrota, já era tarde. O que restou nos quadros do Partido Democrata? Políticos regionais ou totalmente ligados à cultura woke.

Como se sabe, os preceitos woke têm grande receptividade em grandes centros urbanos americanos, como Nova York, Chicago ou Los Angeles. Mas capengam no restante do país, especialmente nos estados do Meio Oeste. Este é um ponto importante dentro na política americana: como trabalhar a opinião pública para sensibilizar os eleitores com projetos de inclusão?

Dois democratas fizeram isso com maestria, em uma época em que os “wokes” ainda não existiam e, assim, não havia a tentativa de se impor na marra valores progressistas à totalidade do país. Estamos falando de John Kennedy e de Bill Clinton, que conseguiram avanços significativos neste campo sem usar um discurso agressivo ou militante.

Além de ser vítima de etarismo, Biden ainda peca pela falta de personalidade em sua administração. A gestão democrata não tem exatamente uma grande bandeira que se pode explorar. Neste sentido, parece bastante com o mandato de Jimmy Carter, com uma diferença crucial: a economia, em comparação com o que ocorreu entre os anos 1977 e 1980, vai muito bem.

Trump perdeu quatro anos atrás por questões que ultrapassaram a agenda econômica. Desta vez, a mesma coisa – com ingredientes diferentes – vai ocorrer com Biden. O tiro desferido em Pensilvânia, no entanto, deu a ele uma chance ímpar: a de se apresentar como um guerreiro do conservadorismo e dos valores tradicionais americanos.

Trata-se de uma guerra de rejeições, mas o atentado turbinou Trump de uma forma quase que irreversível. Somente uma grande virada, com a escolha de um novo candidato democrata, poderia virar o jogo. Mas isso, a essa altura, parece ser impossível.

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