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Os caubóis que davam cem tiros de uma vez

Toda criança da minha geração gostava de filmes e seriados de bangue-bangue. O velho Oeste era uma constante entre nós. Revólver de brinquedo, espoleta, colete, cartucheira, chapéu de caubói, brinquedo de forte apache – as lojas daquela época eram cheias de opções para meninos que quisessem se imaginar no meio de uma briga com navajos e comanches.

Os canais de TV tinham várias séries para quem era fã do gênero: Gunsmoke, Bonanza, Bat Masterson, O Homem de Virginia, Paladino do Oeste, Chaparral, Daniel Boone, James West, Laramie, Laredo e Cimarron. Além disso, os filmes de bangue-bangue passavam com frequência na Sessão da Tarde, da Globo, ou tinham programas fixos na Record e na Tupi (“Segunda sem lei” era um clássico neste quesito). Nessas produções, como dizia uma vinheta televisiva dos anos 1970, os caubóis davam cem tiros de uma vez.

Sempre gostei do gênero, mas só fui me interessar de fato pelos grandes filmes sobre o Velho Oeste quando adulto. Já vi mais de uma centena, ao longo dos últimos anos. O suficiente para reunir aqueles que considero os melhores de todos, especialmente porque fogem da solução simples de colocar os caubóis como mocinhos e os índios como vilões.

Abaixo, fiz meu Top Ten dos filmes que se enquadram na categoria “western”. São produções primorosas que mostram personagens em conflito, vivendo em uma terra sem lei, com roteiros inteligentes e atuações excepcionais. Vamos lá:

ERA UMA VEZ NO OESTE – talvez a maior obra-prima do gênero, tem roteiro, direção e trilha sonora impecáveis. O ritmo é arrastado, mas a história e a fotografia são espetaculares. Tudo começa quando um forasteiro (Charles Bronson) chega a uma estação de trem. Calado e sorumbático, ele toca uma gaita em vez de falar (a explicação para isso está na última cena do filme) e está à procura de um malfeitor chamado Frank (Henry Fonda). Dirigido por Sergio Leone, tem Bernardo Bertolucci entre os autores do argumento e foi rodado (como a maioria dos spaghetti-westerns) no sul da Espanha.

RASTROS DE ÓDIO – um dos melhores “westerns” já feitos, mostra como o rancor entre brancos e índios vai contaminando as relações entre os habitantes da região. Uma atuação espetacular de John Wayne, com direção de John Ford. A locação utilizada é icônica: o Monument Valley, uma região desértica e rochosa que fica na divisão entre os estados do Arizona e Utah.

DA TERRA NASCEM OS HOMENS – de William Wyler, considerado um dos maiores nomes do cinema. Curiosamente, ele não gostou nem do roteiro ou da trilha sonora (um tema que gruda nos ouvidos e foi indicado ao Oscar) ou da atuação dos atores. Mas o resultado e excelente e mostra um herói (Gregory Peck) completamente diferente dos caubóis de praxe.

BRAVURA INDÔMITA – John Wayne dá vida ao personagem principal deste filme de uma forma original e surpreendente. É a história de uma menina que contrata um pistoleiro velho e bêbado para encontrar o bandoleiro que matou seus pais e está solto, vivendo na mesma região que Rooster Cogburn (Wayne).

OS IMPERDOÁVEIS – Clint Eastwood volta ao gênero que o tornou famoso nesta produção de 1992, que também dirigiu. A película tem um roteiro espetacular, que ficou rodando por vinte anos na mão de vários diretores, até que fosse realizado: uma prostituta é assassinada e desfigurada. Suas colegas de profissão, então, reúnem um bom dinheiro e oferecem a recompensa para quem descobrir o autor do crime. A cidade onde se passa a trama tem um nome peculiar: Big Whisky. Obteve nove indicações para o Oscar e ganhou quatro estatuetas, incluindo a de melhor filme (é um dos três faroestes a conseguir essa proeza).

DANÇA COM LOBOS – Kevin Costner, até esse filme de 1990, era considerado apenas um galã de Hollywood sem grandes pretensões. Ele dirigiu essa película e atuou de forma competente a saga do tenente John Dunbar que, sozinho em um posto avançado do Exército americano, acaba fazendo amizade com índios e… lobos.

TRÊS HOMENS EM CONFLITO – o melhor filme da trilogia de Sergio Leone com o cavaleiro de poucas palavras, interpretado por Clint Eastwood. Aqui, ele tem a companhia de Lee Van Cleef (o “mau” do título original) e Eli Wallach (o “feio”). O duelo final, entre os três, é um show de direção. O poncho de Eastwood é relembrado em “De Volta para o Futuro 3”, quando Marty McFly (Michael J. Fox) usa uma peça igual e se apresenta aos habitantes da Hill Valley do Século 19 como “Eastwood, Clint Eastwood”. Como definir a música-tema de Enio Morricone em uma palavra? Esplêndida.

BUTCH CASSIDY – Outro “western” produzido nos anos 1960, é conhecido por sua música-tema, “Raindrops Keep Falling on my Head” (B.J. Thomas, em uma composição de Burt Bacharach e Hal David). Os personagens principais (Paul Newman e Robert Redford) são bandidos procurados pelas autoridades e os diálogos são recheados de bom humor, algo raro no gênero.  “Raindrops” ganhou o Oscar de melhor canção-tema, embora não tivesse agradado a ninguém na produção (o empresário de B.J. Thomas disse que essa gravação iria arruinar sua carreira).

OS BRUTOS TAMBÉM AMAM – o título em português nada tem a ver com o original (“Shane”, o nome do personagem principal, vivido por Allan Ladd), mas dá uma pista de que esse não é um faroeste como os outros. Shane é um pistoleiro que luta o filme inteiro contra sua natureza, se mostrando paciente e controlado. Quando finalmente entra em um tiroteio (contra o vilão vivido por Jack Palance), ele percebe que essa luta é inútil. George Stevens, seu diretor, é o mesmo de obras-primas como “Assim Caminha a Humanidade” e “Um Lugar ao Sol”.

SETE HOMENS E UM DESTINO – o diretor Akira Kurosawa assistiu a vários filmes de bangue-bangue para compor a narrativa de “Os Sete Samurais”. E foi nesse filme japonês que “Sete Homens e Um Destino” se inspirou, a partir de uma sugestão de Yul Brynner ao produtor Walter Mirish (o diretor John Sturges, após a estreia da película, ganhou uma espada de samurai do próprio Akira Kurosawa). A música-tema, de Elmer Bernstein (com o jovem John Williams entre os músicos da orquestra), é um dos pontos altos do filme.

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