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Rever “São Paulo S/A”, um programa necessário 

Neste Carnaval, tive a oportunidade de rever um filme que assisti aos dezesseis anos, no CineSesc da Rua Augusta. Trata-se de “São Paulo – Sociedade Anônima”, dirigido por Luiz Sérgio Person e estrelado por Walmor Chagas, Eva Wilma e Darlene Glória. Lembro de ter adorado essa película quando adolescente e ter colocado essa produção em uma lista de filmes brasileiros que gostava. 

Percebi que mudei muito nesse intervalo de tempo. Reconheço que “São Paulo S/A” é uma obra à frente de seu tempo, com soluções de enquadramento geniais para a época e uma narrativa em tom solene que continua a me agradar. A trama não é linear, algo intrigante para esta época e que cativa um espectador mais exigente. Percebe-se também um grande cuidado na fotografia e na captação das imagens dos atores. 

No entanto, o roteiro é um tanto arrastado e pretensioso. Há um quê de existencialista na saga do personagem principal, vivido por Chagas. Mas, ao mesmo tempo, não é possível entender exatamente a sua insatisfação com a vida medíocre que leva – pois não é possível enxergar nesse papel uma densidade intelectual ou pretensões que possam existir fora da vida de classe média embotada que é retratada no enredo. Carlos também é um personagem de sua época: machista e misógino, chega a ser agressivo com as mulheres com as quais se relaciona em pelo menos duas cenas. 

O filme retrata (com estereótipos) a expansão das indústrias de autopeças de vieram a reboque das fábricas de automóveis. Podemos ver, logo no início, a linha de montagem da Volkswagen e de seus fuscas. As aglomerações do centro da cidade nos anos 1960. A decoração um tanto kitsch das residências da época.

Há também quatro imagens fabulosas. A primeira surge quando Chagas está andando pelo viaduto do Chá e podemos ver um dos Palacetes Prates que ainda estava em pé no Vale do Anhangabaú. A segunda é um relance da fábrica da Duchen, um projeto de Oscar Niemeyer, que ficava à beira da Via Dutra. A terceira: Chagas e Eva Wilma estão na Praça da República e vê-se, ao fundo, o edifício Itália ainda em construção. Por fim, temos um almoço entre os personagens Carlos e Ana em um restaurante que funcionava no mezanino da Galeria Metrópole, na avenida São Luís. 

Ao fundo, vê-se o Palacete Prates no Vale do Anhagabaú, que seria demolido mais tarde

O único empresário da trama, interpretado por Otelo Zeloni, é retratado como um picareta explorador – e constantemente criticado por seu braço direito, Carlos (Walmor Chagas). Ou seja, nenhuma surpresa para um roteiro elaborado na década de 1960. 

Os personagens, de maneira geral, estão vivendo seus dramas pessoais, que desaparecem na grande metrópole e se tornam problemas menores e passageiros. A empatia é algo que inexiste. Todos estão preocupados em adaptar o dia a dia a suas necessidades e continuar a vida. Os atores estão muito bem, apesar do roteiro que poderia ser mais burilado. Chagas, Eva Wilma, Darlene Glória e Ana Esmeralda reproduzem as angústias da vida moderna nos anos 1960 com elegância e segurança.  

Tocar o barco, sem saber exatamente para onde se vai, é o mote de todo os papéis — e talvez seja o da humanidade de maneira geral. Não é à toa que Carlos vive repetindo ao longo da exibição: “Recomeçar. Mil vezes recomeçar”. 

Apesar de seus problemas e de suas limitações, “São Paulo S/A” é um filme que provoca. Nos faz colocar em perspectiva nossas vidas diante da trajetória dos personagens que são descortinados pelo diretor Luiz Sérgio Person (pai da cineasta Marina Person). Ao mesmo tempo, instiga o espectador a avaliar a própria existência e checar se existem elementos de mediocridade em seu cotidiano. 

Ficou interessado? Está na Globoplay. Ou no YouTube: 

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