Descobri nesta semana um novo termo: “sober shaming”. Não há exatamente uma boa tradução para essa expressão em nosso idioma, mas talvez o melhor significado seja “deixar alguém envergonhado por não beber”. Essa gíria não é uma novidade: existe no exterior há alguns anos. Mas só tomei conhecimento de sua existência na quinta-feira, lendo um artigo sobre esse fenômeno.
A prática de pressionar o próximo a beber álcool, porém, foi criada há muitos anos e deve preceder a minha existência. Mas, nos tempos digitais, se inventa uma expressão para tudo – e as palavras “sober” e “shaming” acabaram se unindo, para formar um novo jargão.
Quem já não foi pressionado a beber em uma reunião social? Eu já fui inúmeras vezes. Nos últimos anos, reduzi bastante o consumo de álcool à noite, por conta de um refluxo gástrico que insiste em aparecer no meio da madrugada, tirando o meu sono. Entre uma cirurgia e moderar a ingestão de álcool, optei pela segunda alternativa. Mas, nessas horas, sofro uma certa pressão.
Por que as pessoas fazem isso?
Talvez existam dois motivos. Um deles é que a bebida alcóolica é algo prazeroso e a interação entre as pessoas tem mais graça quando todos partilham uma garrafa e ficam na mesma sintonia. O segundo é que algumas pessoas podem se sentir culpadas em beber e preferem socializar a culpa. Isso também acontece com pratos muito calóricos – quem não se sentiu igualmente pressionado a dividir uma sobremesa com amigos e amigas?
É difícil manter uma dieta nos dias de hoje, com tantas tentações que aparecem à nossa frente. Mas o álcool tem o poder de destruir uma semana inteira de esforço e moderação no consumo de calorias. Por isso, é preciso de muita força de vontade para resistir à pressão do grupo para que você beba.
Ultimamente, não tenho resistido muito a esse tipo de apelo. Peço alguma coisa e fico fingindo que estou bebendo. Com isso, evito esticar qualquer tipo de discussão e deixo os demais felizes.
Isso me incomoda? De maneira nenhuma. Há coisas mais importantes para se preocupar. Mas o termo “sober shaming”, vejo nas redes, está sendo muito utilizado por quem se sente importunado com essa leve intimidação – provavelmente porque não tem a força de vontade necessária para deixar as bebidas alcoólicas de lado durante uma festa ou um jantar no final de semana.
O problema é que esse tipo de coerção está tão entranhado em nossa sociedade que as pessoas agem dessa forma no piloto automático. Quer um exemplo? Há dois anos, recebemos uns amigos em casa durante um sábado à tarde. Houve caipirinhas, copos de uísque on the rocks, dry martinis e várias doses de gim tônica. Mas, entre os convidados, estava alguém que tinha saído de um processo de reabilitação, depois de anos e anos de alcoolismo.
Antes de convidá-lo, perguntamos a ele se haveria problema em ficar num ambiente cheio de oportunidades para acabar com sua sobriedade. O amigo retrucou que levaria uma garrafa de suco de tomate da tabasco e ficaria tomando isso enquanto estivesse em casa (mais tarde, descobri que ele tinha uma caixa inteira no porta-malas de seu carro).
Ocorre que outro amigo trouxe um exemplar disputadíssimo de single malt para o nosso encontro e ficou insistindo para o alcoólatra em recuperação, sem saber da condição dele, experimentar o precioso líquido. Tive de chamar o dono do da garrafa de single malt de lado e explicar a situação, cortando o problema pela raiz.
Depois desse perrengue, tomei uma decisão, que sigo até hoje em qualquer evento social. Se uma pessoa disser que não está bebendo álcool, não discuto mais – e ofereço um refrigerante zero e sigo em frente. Melhor assim.