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Na dúvida, mire no carteiro

Quando um PM aponta um fuzil para uma jornalista e depois filma seu trabalho, algo está errado

Na noite de terça-feira (16), o programa Profissão Repórter, da Globo, mostrou cenas de um policial militar apontando um fuzil para uma repórter que cobria uma ação na favela da Prainha, no Guarujá (SP), Baixada Santista. A patrulha da PM seguia no âmbito da Operação Escudo, uma resposta contra traficantes pelo assassinato do soldado Patrick Reis durante uma ronda de rotina. A reação até ontem resultou em 18 mortes, sendo que no mínimo duas são suspeitas de mera retaliação contra moradores de favelas. Outra duas, no mínimo, teriam ocorrido mesmo em decorrência de confrontos com traficantes armados.

O programa mostrou um PM mirando contra a jornalista Danielle Zampollo, mesmo após ela ter se identificado. “Eu tinha acabado de chegar lá. Estava com o meu celular. Tinha deixado a câmera no carro, porque fui mesmo para apurar, para checar as informações. E chega ao local uma viatura do COI [Companhia Independente de Operações Especiais], da Polícia Militar”, relatou. “Quando ele começou a apontar o fuzil pra mim, e manteve a arma apontada, estranhei. Achei que estivesse acontecendo alguma coisa. Olho pra trás e não tem ninguém. Só eu, numa viela estreita. Aí que eu vi que era comigo. Ele ficou 17 segundos apontando o fuzil pra mim, sem parar.”

Para quem já cobriu ações em favelas, soa tudo muito estranho. A PM não costuma ser agressiva com jornalistas durante ações. Pelo contrário, os soldados acham que imagens ajudam a mostrar o trabalho duro contra o crime. Mas com mortes suspeitas, o que foi feito? O PM largou o fuzil para filmar a repórter, algo em nada irregular. Mas convenhamos, uma imprudência. Se a área seria perigosa a ponto de justificar mirar em alguém que passava, qual a lógica em largar a mesma arma? Ou o perigo seria a presença da imprensa?

Daí, a conversa do carteiro. Nas redes sociais, o vídeo do policial (que estava sem identificação) viralizou com a conversa que a repórter estava ali para flagrar alguma irregularidade. Exatamente. Quem não deve não teme. Ponto. Jornalistas podem ser alvejados? Podem, mas é raríssimo. Basta ter cuidado. Ou seja, avisar os moradores e a polícia de sua presença.

Na mesma terça-feira (15), saíram 12 laudos das vítimas da Operação Escudo. O de Felipe Vieira Nunes (30) mostrou que ele levou sete tiros no tronco no início da noite de sexta-feira (29). Ele havia saído de casa, na Vila Baiana, para ir ao mercado. Felipe trabalhava vendendo açaí na Praia da Enseada e não tinha aparente envolvimento com criminosos. Vizinhos disseram que ele foi abordado ao passar pela rua. Já o relatório da PM diz que ele atirou primeiro. A ação não foi filmada pelas câmeras corporais dos agentes envolvidos. Além dos tiros, seu corpo tinha marcas de queimaduras de cigarro, relataram familiares. Tudo suspeito e precisando de esclarecimentos.

O procurador-geral de Justiça de São Paulo, Mario Sarrubbo, afirmou que “um aspecto que salta aos olhos é o tamanho dessa operação e o número muito pequeno de câmeras corporais nos policiais militares“. Por isso, apontar um fuzil para uma repórter não chega exatamente a surpreender neste caso. A lógica aparente é espantar o carteiro que pode ser portador de más notícias.

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