Misógino, machista, alcóolatra. Próximo de mafiosos, vivendo sempre na órbita de políticos poderosos e um ator de talento limitado – um verdadeiro canastrão. Foi preso duas vezes (uma delas por tentar seduzir uma menor de idade), tentou o suicídio em três ocasiões e liderava um grupo de amigos conhecido por “Rat Pack”, ou o “Bando de Ratos”, uma espécie de “Clube dos Cafajestes” em versão hollywoodiana. Além de tudo isso, era dono de um temperamento dificílimo e explosivo.
Leal, generoso, batalhador. Vencedor de um Oscar, estrelou de um curta metragem que ousava atacar movimentos de intolerância como o antissemitismo e o racismo em 1945. Dono de uma voz inconfundível, vendeu 250 milhões de discos no mundo inteiro. Defendeu vários amigos durante os anos do Macartismo, conseguiu a proeza de reaproximar Jerry Lewis e Dean Martin depois de anos brigados (num programa de TV ao vivo) e, no auge de sua carreira, não ficava em hotéis que se recusavam a hospedar negros.
Francis Albert Sinatra pode ser definido, em resumo, pelos dois parágrafos acima. Há quem prefira o primeiro parágrafo para descrever sua personalidade. Nós, de Money Report, preferimos o segundo. E elegemos Frank Sinatra como o CEO Improvável desta semana, que marca os quarenta anos do show que fez no Maracanã.
Devo confessar: eu fui a este show, ainda com quinze anos de idade. E, algum tempo atrás, tive o privilégio de entrevistar Roberto Medina, o promotor daquele evento, que me contou alguns bastidores sobre esse que foi um dos maiores espetáculos da história do entretenimento mundial.
Como Frank Sinatra entrou em sua vida? Tudo começou quando Medina gravou um comercial para o uísque Passport com o ator inglês David Niven (terminava com o britânico dizendo: “But sometimes I’d like to take my Passport in the Brazilian way: on the rocks. Saúde!”). Seus clientes pediram um novo filme com uma celebridade ainda maior. O publicitário pensou em Frank Sinatra. Fez-se o contato, negociou-se o cachê e uma data para gravar o comercial foi marcada. No dia da gravação, porém, ocorreu uma tragédia: a mãe do cantor morrera em um acidente aéreo. Sinatra estava devastado, mas em frente à câmera esperando suas instruções. Medina sugeriu que a filmagem fosse cancelada, mas o astro insistiu em seguir em frente.
Deste episódio surgiu uma forte amizade, que o levou a convidá-lo a fazer um show no Maracanã. Sinatra topou e veio ao Rio.
Tão logo chegou, seu maestro, Don Costa, brigou com a imprensa e disse que Sinatra não falaria com os jornalistas. Isso foi assunto para vários dias nos jornais e emissoras de TV.
No dia do show, uma chuva insistia em castigar o Rio de Janeiro, o que inviabilizaria a performance ao ar livre no Maracanã. Um pouco antes do horário marcado, porém, a água parou de cair dos céus. Sinatra, no camarim improvisado e sem saber da trégua dada por São Pedro, procurou Medina e sugeriu que o show fosse cancelado. O empresário, então, o levou até a saída dos vestiários, para ver todas as arquibancadas tomadas e nenhuma gota de chuva. Sinatra se embalou e começou o espetáculo.
Lembro de três coisas interessantes deste show, que durante décadas figurou no Guiness como a maior apresentação artística de todos os tempos, reunindo 200 000 espectadores. A primeira é que Frank defendeu Costa e disse:”I came here to sing to you, not to talk”. Depois disso, o beijoqueiro (lembram-se dessa figura?) apareceu e deu uma bitoca na bochecha do cantor. Por fim, anunciou uma canção dos Beatles assim: “This next song is from Lennon and McCartney”. Era “Something”, de George Harrison.
Pouca gente sabe, mas Sinatra foi um dos responsáveis pela realização do primeiro Rock in Rio.
Medina estava nos Estados Unidos para contratar o line-up do show, mas nenhum artista queria conversar com ele. Acabou descobrindo por intermédio de amigos que um cantor americano tinha sofrido um calote, anos antes, e queimado os empresários brasileiros no circuito musical dos Estados Unidos. Ele, então, pegou um avião e foi se queixar com seu amigo Old Blue Eyes. Sinatra ouviu Medina e mandou convocar uma entrevista coletiva. Com os jornalistas de entretenimento no local, disse que ele garantia pessoalmente o pagamento dos cachês e que o Rock in Rio seria um grande sucesso. A partir daí, Medina conseguiu ser recebido pelos grandes nomes do mercado e botou de pé seu festival – hoje um dos maiores do mundo.
Esse era Frank Sinatra. Um grande apreciador de Jack Daniel’s, como eu. Talvez a única qualidade admirável que eu tenha em comum com o maior cantor de todos os tempos.