O presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, disse que diante da piora “quantitativa e qualitativa” da inflação, a autoridade monetária do país terá um trabalho difícil e desafiador, tudo em um cenário de alta nos preços de alimentos, combustíveis e de energia. Em sua avaliação, além do problema de inflação interna, o Brasil está “importando inflação de outros países, o que torna o ambiente ainda mais desafiador”, as declarações foram dadas no IX Fórum Jurídico de Lisboa, em Portugal, nesta terça-feira (16).
Ele ressaltou que para contornar essa situação, será necessário, ao Brasil, buscar o equilíbrio fiscal, além de passar a mensagem que o país tem condições de ter um crescimento sustentável mais alto. Ele disse que, em parte, a inflação que vem sendo registrada em diversos países está relacionada à “maior injeção fiscal da história mundial”, medida adotada com o objetivo de amenizar os efeitos da pandemia na economia. Com a pandemia, o cenário mundial ficou diferente do que se imaginava, “com uma rápida e volátil mudança de cenários, em termos de crescimento e de perspectiva de inflação”, disse Campos Neto. Governos ficaram em pânico sem saber, até então, a real dimensão do problema.
A injeção apontada por Campos Neto foi de US$ 9 trilhões, segundo informou na semana passada o Fundo Monetário Internacional (FMI), sendo que US$ 4,5 trilhões foram em transferências diretas. Pensando que o PIB mundial está entre US$ 84 [trilhões] e 85 trilhões, são 10% de injeção fiscal em um espaço de tempo relativamente pequeno. “Os bancos centrais criaram uma tese que isso era um aumento temporário, porque, quando a economia reabrisse, as pessoas voltariam a trabalhar e, assim, voltariam a consumir serviços, deixando de consumir bens, o que resultaria queda nos preços de bens. Segundo essa tese, a reabertura mundial, após a pandemia, reequilibraria essas forças e faria com que a inflação caísse rapidamente”, disse. Essa expectativa, segundo ele, acabou não se concretizou, uma vez que ela partia da premissa que haveria uma “ruptura de oferta” maior do que a que foi registrada, e que as pessoas que estavam em casa não estariam produzindo, o que acarretaria queda na oferta de bens.
Deslocamentos
Segundo o presidente do BC, o que aconteceu foi “um grande deslocamento de demanda” porque os governos colocaram muito dinheiro na mão das pessoas em um período muito rápido. “Demorou para os bancos centrais entenderem o efeito combinado desse conjunto de ajudas, de US$ 9 trilhões”, disse. “A gente imaginava que o consumo de energia elétrica em casa ia crescer mais que fora de casa, e isso não aconteceu. O que aconteceu foi o contrário, porque produzir bens gasta mais energia do que produzir serviços. Temos um deslocamento grande da demanda de energia que não foi acompanhado de aumento na oferta de energia”, complementou.
Impacto nos preços
Na avaliação de Campos Neto, a comunidade econômica demorou para entender o impacto que os programas fiscais teriam nos preços. Ainda segundo ele, esse impacto nos preços da energia elétrica e dos combustíveis foi maior do que o esperado em 2021. “Foi na verdade o maior [impacto] dos últimos 20 anos, adicionado ao choque de alimentos registrado no ano anterior”, disse.
Diante desse cenário, Campos Neto disse que o BC então iniciou processo de aumento de juros. “A inflação acelerou e teve piora tanto quantitativa como qualitativa em todos os aspectos. É muito importante sermos realistas para entendermos a quão disseminada está a inflação e o quão difícil será o trabalho do BC nesse ponto. Temos percebido, mais recentemente, uma revisão de inflação para cima e de crescimento para baixo em 2022”.
Commodities
Ele apontou alguns dos motivos que não possibilitaram, ao Brasil, se beneficiar da alta dos preços das commodities. “Quando as commodities sobem, a moeda brasileira aprecia, porque o Brasil é exportador de commodities. Então o preço da moeda local absorveria a alta externa”, disse. “Só que dessa vez isso não aconteceu. Tivemos aumento do preço de commodities com desvalorização da moeda. Isso aconteceu porque os termos de troca, que é essa relação, foram acompanhados de aumento do nível de dívida emitida”, explicou ao associar essa dívida às medidas de combate aos efeitos da pandemia na economia do país.
(com Agência Brasil)