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10 argumentos econômicos – e 1 ético – em prol do livre comércio

E o argumento ético supera todos os econômicos

O argumento econômico em prol do livre comércio é direto. Aqui, ele será destilado em dez — na verdade, como você perceberá, onze — pontos elementares.

1. Linhas imaginárias chamadas ‘fronteiras’ não alteram a natureza das transações comerciais

Não há nada em relação às fronteiras políticas que justifique tratar transações comerciais através destas fronteiras como se fossem distintas das transações comerciais que ocorrem dentro destas fronteiras.

Países não comercializam; somente indivíduos o fazem. Sendo assim, a natureza da transação comercial não é alterada de acordo com as fronteiras políticas envolvidas. Você fazer uma transação comercial voluntária com um indivíduo localizado na cidade ao lado ou no estado ao lado possui exatamente a mesma natureza de você fazer uma transação comercial voluntária com um indivíduo localizado Coreia, na China ou em Taiwan. Qual exatamente é a diferença econômica entre você comprar algo de uma pessoa que está do outro lado da rua ou do outro lado do planeta?

Comércio é comércio. Não interessam as fronteiras geográficas e políticas envolvidas. Dizer que o comércio internacional é distinto do comércio interestadual, do intermunicipal, do interbairros, do interfamílias e, acima de tudo, do interindividual é total incoerência.

2. Toda a nossa atividade econômica, em última instância, almeja expandir o nosso consumo

Todos nós trabalhamos porque queremos trocar os frutos do nosso trabalho (dinheiro) por aqueles bens e serviços que ainda não temos ou dos quais necessitamos continuamente. Trabalhamos e produzimos para podermos demandar bens e serviços.

Nossa produção representa nossa demanda. O objetivo de toda a nossa produção é o consumo. A produção não é um fim em si mesmo; o fim é o consumo.

Por isso, toda a atividade econômica é, em última instância, justificada pelo tanto que ela nos permite expandir o nosso consumo, e não pelo tanto que ela nos permite expandir a nossa produção. O consumo é o fim; a produção é o meio.

Obviamente, a produção é um meio essencial. Não podemos expandir o consumo sem expandir a produção. No entanto, a produção não é o propósito supremo da atividade econômica.

Caso não acredite, pergunte a si próprio quanto você pagaria por um bolo confeiteiro cuidadosamente feito de pó de serragem, papelão e cimento, manufaturado por um padeiro que demorou vários dias na produção desta iguaria. Se a sua resposta é “nada”, então você entendeu o ponto.

3. A especialização se expande. E quanto maior a especialização, maior a produção e a qualidade de vida

Imagine viver em uma sociedade na qual nosso trabalho diário serve unicamente ao propósito de sobrevivermos, e não para desenvolver nossos talentos.

Essa é a realidade nos países que restringem o livre comércio: as pessoas, ao serem proibidas de utilizar os frutos do seu trabalho para adquirir aqueles bens e serviços que são mais bem produzidos por estrangeiros, acabam sendo obrigadas a desempenhar várias atividades nas quais não têm nenhuma habilidade. 

Estando isoladas da divisão mundial do trabalho, tais pessoas trabalham apenas para sobreviver, e não para desenvolver seus talentos. Elas não podem trabalhar naquilo em que realmente são boas, pois a restrição ao livre comércio obriga os cidadãos a fazerem de tudo, inclusive aquilo de que não entendem. Uma pessoa boa em informática acaba tendo de trabalhar como operário em uma siderurgia, pois seu governo restringe a importação de aço, que poderia ser adquirido mais barato de estrangeiros.

Por outro lado, quanto mais livre o comércio, maior a probabilidade de que cada indivíduo se especialize na produção daqueles bens e serviços que ele é capaz de produzir com mais eficiência, e em seguida utilize sua renda (alta, por causa da sua especialização) para importar aqueles bens e serviços que são produzidos de maneira mais eficiente por outros indivíduos em outras localidades.

Um indivíduo está em melhor situação econômica quando pode se especializar naquilo que faz melhor e, em decorrência disso, pode importar, ao menor preço possível, os bens de que necessita.

Uma economia cujo sistema de saúde é formado apenas por médicos comunitários irá salvar menos vidas e aliviar menos dores do que uma economia cujo corpo médico é formado por especialistas como neurocirurgiões, pedicuros, cardiologistas, oftalmologistas e, meu favorito (porque há alguns anos um desses especialistas salvou a vida de meu filho mais novo), gastroenterologistas pediátricos.

Em países de economia aberta, as pessoas, exatamente por poderem adquirir bens e serviços fornecidos por estrangeiros que são melhores no suprimento destes, podem se concentrar naquilo em que realmente são boas. Em países de economia fechada, as pessoas passam suas vidas lutando para apenas sobreviver, sendo obrigadas a desempenhar várias atividades que não são do seu domínio. Engenheiros acabam virando operários de fábricas.

4. A especialização requer liberdade de comércio

Um gastroenterologista pediátrico vivendo em uma grande metrópole usufrui um alto padrão de vida porque várias pessoas estão dispostas a lhe pagar para que ele se especialize nesta altamente especializada linha de trabalho, e estão dispostas a aceitar o dinheiro dele em troca do que produzem. Esse médico é rico somente porque ele transaciona voluntariamente com terceiros.

Se agricultores, carpinteiros, alfaiates, pilotos de avião e professores não estivessem dispostos a transacionar com ele, ele não teria tempo para praticar a gastroenterologia pediátrica. Em vez disso, ele teria de cultivar sua própria comida, construir sua própria casa, e fazer sua própria roupa. Ele e todo o resto de nós estaríamos muito mais pobres.

Por isso, em países que usufruem o livre comércio e seus cidadãos podem transacionar livremente com o resto do mundo, as pessoas possuem uma miríade de opções de trabalho: podem ser médicos altamente especializados, financistas, instrutores de ioga, artistas, cineastas, chefs, contadores e empreendedores do ramo de tecnologia. Tão rica e com tamanha liberdade de comércio é a economia, que todos têm opções, pois podem terceirizar a manufatura de vários bens para outros indivíduos de outros países.

Já em países fechados, nos quais todos têm de fazer de tudo apenas para sobreviver, não há como se especializar. Consequentemente, renda e padrão de vida são menores.

5. A especialização aumenta com o tamanho do mercado

Quanto maior o número de consumidores e produtores, maior o escopo para que cada produtor possa se concentrar em uma especialização mais restrita.

Este fato explica por que cidades grandes possuem restaurantes voltados a um nicho específico de mercado (como veganos ou libaneses) e médicos altamente capacitados (como gastroenterologistas pediátricos), ao passo que cidades pequenas não possuem restaurantes e profissões tão altamente especializados.

Os pontos quatro e cinco, em conjunto, geram aprimoramentos que se auto-reforçam: mais comércio promove mais especialização, e mais especialização, por sua vez, promove mais comércio. A economia cresce e o padrão de vida da população aumenta.

6. O livre comércio gera retornos crescentes

Uma importante consequência de se expandir a área do comércio — aumentar o tamanho do mercado — é aquilo que os economistas chamam de “retornos crescentes”.

Duplicar o número de pessoas que comercializam livremente com a população de um país faz com que a renda desta economia mais do que dobre. O livre comércio, ao promover uma maior especialização, gera aumentos na renda de todos os que participam deste arranjo.

Compare os serviços de saúde entre uma economia que tenha entre seus profissionais de saúde apenas 100 médicos de comunidade e outra economia que tenha, digamos, 20 médicos comunitários e 180 especialistas, como gastroenterologistas pediátricos. Este segundo arranjo só é possível em economias que praticam o livre comércio.

7. Não há limites ao grau de especialização

Não há limite à intensidade em que a mão-de-obra pode se especializar. Consequentemente, a produção total pode se expandir a uma taxa crescente — isto é, apresentando retornos crescentes.

Em outras palavras, o grau com que a mão-de-obra pode se especializar e fazer com que a produção total se expanda não é limitado — e nem definido — pelo tamanho da economia ou da extensão territorial do país. Tampouco o tamanho do país define um limite ao crescimento da especialização e da produção.

Ou seja, mesmo para países geograficamente grandes e altamente populosos, como EUA ou Brasil, não há nada na teoria econômica ou na história que diga que expandir o comércio exterior faz com que consumo e produção cresçam menos do que cresceriam caso a expansão ocorresse no comércio interno.

Você, morando em seu estado, ganha tanto expandindo seu comércio com cidadãos do estado vizinho quanto com cidadãos de um país do outro lado do mundo. O comércio, de qualquer natureza, sempre e em todo lugar, envolve indivíduos de carne e osso negociando e transacionando entre si, de uma forma que cada um dos indivíduos envolvidos julga ser de seu melhor interesse.

Não há nenhum motivo para não se ter uma economia global sem fronteiras econômicas. Comércio é comércio. Não interessam as fronteiras geográficas e políticas envolvidas. Não há restrições ao comércio entre bairros, entre cidades e entre estados. Não há nenhuma preocupação com a balança comercial entre o seu estado e o estado vizinho. Qual então é o sentido econômico de haver restrições comerciais entre países? Qual exatamente é a diferença econômica entre você comprar algo de uma pessoa que está do outro lado da rua ou do outro lado do planeta?

8. A concorrência traz disciplina aos produtores e é positiva para os consumidores

A concorrência econômica é positiva e funciona através das fronteiras políticas tão eficientemente quanto dentro de fronteiras políticas. A concorrência disciplina empresas, estimula a criatividade empreendedorial, e ajuda a descobrir e impulsionar — em um processo parecido ao da seleção natural — o que funciona melhor economicamente.

Mais importante, a concorrência gerada pelo livre comércio direciona trabalhadores e outros recursos escassos para aquelas atividades e linhas de produção em que eles são mais eficientes e possuem vantagem comparativa.

Assim, atividades ineficientes — que estão apenas imobilizando recursos escassos e que só se mantêm porque são protegidas e subsidiadas pelo governo — são expulsas do mercado pelo livre comércio, e estes recursos escassos se tornam liberados para ser utilizados em outras áreas cuja demanda do consumidor é maior.

Simplesmente não há nenhum motivo para neutralizar — por meio de protecionismos e restrições ao comércio — a concorrência externa tendo como justificativa o fato de que esta concorrência não fala nosso idioma.

9. Os seres humanos são o principal recurso

Como sempre ensinou o professor Julian Simon, especialista em recursos naturais, os seres humanos em uma economia de mercado são o recurso mais supremo e decisivo que existe.

O recurso mais supremo não é a terra ou o petróleo ou minas de minério de ferro ou de ouro; não são as fábricas, ou os computadores ou os tratores; não são os estoques de trigo, ou de aço laminado ou de dinheiro na mão. O recurso mais supremo é a criatividade humana e a engenhosidade.

Com efeito, é exatamente porque a criatividade humana sabe como utilizá-los, que o petróleo, o minério de ferro, o trigo e demais materiais são recursos. Sem a criatividade humana essas coisas seriam meras matérias em estado bruto, meras massas de moléculas, não mais valiosas e úteis aos seres humanos do que são aos antílopes e ratos.

E, ainda assim, a criatividade humana é um dos poucos recursos que consistentemente se tornou mais escasso nos últimos 250 anos. Sabemos que a criatividade humana se tornou mais escassa porque seu preço de mercado aumentou enormemente ao longo dos últimos séculos nas economias de mercado ao redor do mundo. Por exemplo, o salário real médio de um americano hoje é, segundo estimativas conservadoras, aproximadamente 60% maior do que era em 1790. (Veja mais detalhes aqui). Este aumento no preço da mão-de-obra sinaliza que ela se tornou mais escassa em relação à demanda por ela.

Em contraste, a maioria dos outros recursos e insumos produtivos — inclusive energia, metais e serviços de transporte — se tornou, e continua sua tornando, menos escassa. Tal conclusão é possível quando analisamos (como é o certo) a tendência de seus preços reais. E estão se tornando menos escassos exatamente porque há mais seres humanos criativos contribuindo para a economia de mercado.

O livre comércio maximiza a capacidade das pessoas de um país de duas maneiras, que funciona como um via de mão dupla: de um lado, elas contribuem com sua própria criatividade e esforço para a economia global; de outro, elas fazem uso da criatividade e esforço dos bilhões de outros seres humanos (recursos supremos) que residem em outros países.

Nós fazemos uso desta criatividade diretamente quando terceirizamos tarefas produtivas (como linhas de montagem e manufatura de produtos) para empresas e trabalhadores estrangeiros. Por que seria algo positivo reduzir artificialmente nosso acesso a esta oferta de recursos supremos, que são os trabalhadores de outros países?

É por isso que, por definição, quem é contra o livre comércio é quem tem medo da abundância e da prosperidade.

10. O protecionismo existe apenas para proteger os grandes interesses

Restrições ao comércio são feitas por políticos a soldo de grandes grupos de interesse. O encarecimento artificial dos produtos importados significa que os produtores nacionais estarão agora livres e despreocupados para elevar seus preços e reduzir a qualidade de seus produtos. Como não há mais concorrência estrangeira a quem os consumidores nacionais recorrerem, estes agora são obrigados a pagar mais caro por bens nacionais de qualidade mais baixa.

O governo recorre ao protecionismo para proteger as empresas nacionais e blindá-las contra os desejos dos consumidores (principalmente dos mais pobres, que ficam sem poder aquisitivo para comprar produtos bons e baratos feitos no exterior). Em troca deste favor, os políticos ganham vultosas contribuições de campanha. 

Os empresários corporativistas que enchem os bolsos com o dinheiro extraído dos consumidores por meio dessa violência imposta pelo governo querem que o público extorquido acredite que a tarifa é, na verdade, um benefício para os trabalhadores. Sim, há algum benefício marginal para os trabalhadores que trabalham especificamente nas indústrias protegidas, mas ao custo do bem-estar e da renda de todo o resto da população.

Restrição às importações e reservas de mercado fazem com que a capacidade de consumo e de investimento da população seja artificialmente reduzida. Consequentemente, lucros e empregos diminuem por toda a economia. Assim, proteger empregos em um setor por meio de tarifas de importação gera queda da renda e desemprego em vários outros setores da economia.

Se o objetivo é falar de quem realmente ganha com as tarifas, o enfoque não tem de estar nos trabalhadores, mas sim nos empregadores de um ínfimo punhado de trabalhadores que são beneficiados pelas tarifas.

Com o protecionismo, você consegue ver os empregos protegidos e os salários artificialmente elevados naquelas indústrias protegidas. Mas você não vê os empregos perdidos e a queda de salários naqueles outros setores da economia que tiveram sua demanda reduzida porque os consumidores tiveram de gastar mais dinheiro para adquirir os produtos daquelas indústrias protegidas.

Por isso, o desemprego é mais baixo exatamente nos países que praticam o livre comércio.

Por fim, o argumento ético

Encerro com aquele argumento que considero o mais crucial de todos, e que deriva diretamente do décimo item acima. Não é um argumento econômico, mas sim ético. Mesmo após tudo o que foi dito, minha defesa do livre comércio está baseada na ética, independentemente de questões econômicos.

A minha crença mais profunda e inabalável é que, se você trabalha, produz e ganha seu salário honestamente, então você tem o direito de usar esta sua renda da maneira que mais lhe aprouver. Você pode usá-la para comprar tecidos nacionais vendidos pelo comerciante do outro lado da rua ou comprar tecidos importados da Ásia. Você pode usá-la para comprar carros fabricados na cidade ao lado ou comprar carros importados da Europa, da Ásia ou dos EUA.

O dinheiro é seu. Foi adquirido honestamente e com trabalho duro. Ele não pertence nem ao governo e nem a nenhum produtor nacional. Nenhum político e nenhum grande empresário protegido por político têm o direito de proibir você de comprar um bem de quem você quiser.

E, ainda assim, todos os argumentos protecionistas se baseiam na premissa de que fabricantes nacionais — seja de automóveis, de tecidos, de sapatos ou de eletroeletrônicos — têm uma espécie de direito moral ao seu dinheiro.

Se você quer comprar carros ou eletroeletrônicos ou sapatos ou tecidos importados, mas é proibido — ou, o mais comum, penalizado com uma alta tarifa de importação —, o estado está simplesmente dizendo que os fabricantes nacionais têm o direito moral de reivindicar uma parte da sua renda.

Se você não gastar seu dinheiro da maneira como o governo e os fabricantes nacionais consideram ser a mais apropriada, você será penalizado. Assim, o bem-estar econômico de um grupo organizado de pessoas é colocado acima do seu e do resto da população. Cria-se uma casta protegida com o direito de usufruir uma reserva de mercado bancada pela casta espoliada.

Esta presunção de que há duas castas de indivíduos, a qual simplesmente está na base de todas as políticas protecionistas, é moralmente repreensível e eticamente indefensável.

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por Donald Boudreaux

Publicado originalmente: cutt.ly/fBm0gSN

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