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Questão de lógica: você não teme a automação e a reforma da previdência, mas tem receio da inflação

Com uma moeda estável, seu futuro seria muito menos incerto

Um temor bastante recorrente na atualidade é o de que um eventual aumento na automação causará desemprego em massa e, consequentemente, a situação financeira futura das pessoas será pior.

Sejamos claros e diretos: não é a automação o que assusta as pessoas, mas sim a inflação — isto é, a perda do poder de compra da moeda.

Isso pode parecer estranho à primeira vista, mas a realidade é que a promessa de um futuro bastante automatizado — com as máquinas substituindo grande parte do esforço físico humano — só pode ser vista como uma ameaça porque as atuais moedas mundiais são fundamentalmente inflacionárias.

Como era antes e como é hoje

Até o início do século XX, quando o mundo utilizava o ouro como moeda, os preços de bens e serviços caíam ano após ano: por exemplo, de 1814 a 1913, nos EUA, os preços caíram em média 0,58% ao ano, o que significa que algo que custava $100 em 1814 passou a custar $56 em 1913, ano da criação do Federal Reserve. Neste mesmo período, o PIB real cresceu 4% ao ano (de $14,43 bilhões para $680 bilhões).

No Reino Unido, similarmente, no mesmo período, os preços caíram 0,34% ao ano, e o PIB real cresceu 2,12% ao ano.

Hoje, infelizmente, a realidade é inversa: os preços aumentam ano após ano, e o crescimento econômico se tornou, na melhor das hipóteses, intermitente.

Ou seja, já incorporamos a idéia de que, no futuro, o poder de compra de cada unidade monetária será inevitavelmente menor do que é hoje. E é aí que residem nossos temores.

No mundo atual, quem simplesmente trabalha e poupa verá o poder de compra do seu dinheiro guardado diminuir ao longo do tempo. Mas este não é o estado natural das coisas, como hoje pressupomos. Trata-se de um fenômeno que foi artificialmente criado. A razão pela qual os preços tendem a aumentar é que o dinheiro perde seu poder de compra em decorrência de medidas criadas por políticos e burocratas. (Veja aqui e aqui como ocorre no Brasil).

Apenas pergunte a si próprio: mais inovações, concorrência e competição não deveriam significar, por definição, que estamos nos tornando mais produtivos e, consequentemente, capazes de obter os mesmos benefícios (bens e serviços) por custos menores? Isso é exatamente o que ocorre em algumas indústrias de alta tecnologia (smartphones, tablets, notebooks, televisões etc.). Onde há um genuíno livre mercado, com empresas privadas produzindo e concorrendo entre si em busca de consumidores, os preços caem.

O motivo por que a quantidade de dinheiro necessária para comprar um item aumenta é simplesmente porque a quantidade de dinheiro em circulação está aumentando a um ritmo maior do que o aumento da produtividade. Os preços sobem porque o sistema bancário, em conjunto com os bancos centrais controlados pelos governos, está continuamente criando dinheiro. Os preços dos bens e serviços simplesmente se ajustam a este dinheiro adicional em circulação.

Em outras palavras, os sistemas de metas de inflação implantados pelos bancos centrais nada mais são do que metas de se criar dinheiro a uma taxa que supere os ganhos de produtividade. Exemplo: se um Banco Central diz que sua meta de inflação é de 4%, seu objetivo é criar dinheiro a uma taxa que supere os ganhos de produtividade em quatro pontos percentuais a cada ano.

E uma taxa de aumento de preços de 4% ao ano significa que, daqui a 30 anos, os preços estarão, em média, 3,25 vezes maiores. Ou seja, um indivíduo terá de ter uma renda nominal 3,25 vezes maior (terá de mais do que triplicar seu salário) apenas para manter seu padrão de vida.

Consequências

E o que isso significa para a automação?

A inflação faz com que seja imensamente difícil para o cidadão comum poupar dinheiro visando à aposentadoria. Praticamente impossibilita o objetivo de acumular fundos que durem para o resto da vida. Praticamente impossibilita o objetivo de utilizar essa poupança para reduzir seu tempo de trabalho.

Consequentemente, para que a poupança do cidadão comum não perca poder de compra ao longo do tempo, ele terá de continuamente investi-la no mercado financeiro, o que significa que ele corre o risco de perder o que já tem.

Neste cenário, a conclusão é óbvia: perder o emprego — ou seja, perder sua fonte de renda — se torna um enorme problema, independentemente de você ter ou não uma poupança. Logo, a ausência de um emprego em um eventual futuro em que as máquinas poderão fazer todo o trabalho físico (ou, quem sabe, até mesmo os trabalhos mentais) se torna uma temível ameaça.

Em termos puramente econômicos, é claro, a automação não é uma ameaça, mas sim uma oportunidade. As máquinas, historicamente, sempre nos libertaram do fardo do trabalho pesado, monótono, perigoso, estafante e, por que não?, emburrecedor. As máquinas nos possibilitaram “terceirizar” para elas o trabalho extenuante para que pudéssemos nos dedicar a outros afazeres e a novos empreendimentos. Isso se traduziu em um espetacular aumento em nossa riqueza e em nosso padrão de vida.

E como elas reduzem nossa necessidade de trabalhar exaustivamente ao mesmo tempo em que aumentam nossa produtividade (podemos produzir mais com menos esforço e com menos custos), os preços teriam de cair ainda mais rapidamente. Logo, nossos salários deveriam durar muito mais.

Porém, em um mundo de moedas inflacionárias, isso parece impossível, pois a percepção é a de que devemos trabalhar cada vez mais horas apenas para conseguir manter nosso padrão de vida.

Afinal, se a cada ano, o poder de compra da moeda cai entre 3 e 5%, isso significa que temos de aumentar nossa renda nominal neste mesmo valor apenas para conseguirmos comprar os mesmos bens e serviços de antes com nosso salário.

Ou, colocando de outra forma, imagine como seria se você nunca tivesse um aumento salarial: seu padrão de vida iria cair anualmente em decorrência do aumento de preços causado pela inflação monetária.

Esta perda anual no poder de compra, comparada ao aumento no poder de compra que deveríamos ter em decorrência do aumento da produtividade, é subtraída de nós pela inflação. Caso tivéssemos uma moeda sólida e estável, os preços cairiam anualmente, pois estaríamos sendo beneficiados pelo comprovado aumento de produtividade causado pela maior automação (isso, com efeito, já ocorre exatamente hoje no Brasil: em termos de ouro, tudo está mais barato).

E é exatamente esta realidade da perda do poder de compra causada pela inflação que faz com que um futuro de ampla automação pareça uma ameaça.

Por que temer?

Mesmo com uma moeda fiduciária propositalmente inflacionária, os preços de vários bens de consumo — que inicialmente eram de luxo e hoje se popularizaram — desabaram. Os preços de utensílios domésticos como fogão, geladeira, televisão e todos os tipos de sistemas de entretenimento doméstico, lava-louças, churrasqueiras, microondas, forno elétrico, panelas especiais, torradeiras, esteiras de ginástica, aspiradores de pó, vários tipos de roupas etc. caíram 81% entre 1960 e 2013 em termos de horas de trabalho necessárias para adquirir a renda para comprar esses itens.

Já os preços de vários serviços que também eram luxo — comunicação e informação — não apenas desabaram, como caíram para zero. 

Esta é uma característica intrínseca do capitalismo: em setores em que há  livre concorrência, e pouca ou nenhuma regulação, os preços reais tendem a cair. E tendem a cair porque capitalistas visando ao lucro fazem contínuos investimentos com o objetivo de produzir mais por menos. Caso não o façam, perdem mercado para a concorrência.

Mas, infelizmente, trata-se de um fenômeno localizado. Para outros setores, como saúde, educação, habitação, energia elétrica, saneamento, infra-estrutura etc., que são amplamente regulados, os preços tendem a subir muito em termos reais. [Veja números impressionantes para o Brasil].

Se tivéssemos uma moeda sólida e estável — ou seja, um arranjo no qual nos beneficiaríamos totalmente de nosso aumento de produtividade (individual e coletivo) —, a automação significaria simplesmente que poderíamos trabalhar menos ao mesmo tempo em que temos mais tempo para usufruir um maior padrão de vida — pois todos os preços iriam consistentemente cair, e provavelmente a um ritmo crescente.

Mais ainda (e isso é algo de que poucos se dão conta): sem um dinheiro inflacionário, nem sequer haveria a necessidade de constantes reformas do sistema previdenciário. Dado que a moeda ganha poder de compra com o tempo, os infindáveis debates sobre a reforma da previdência virariam mera curiosidade masoquista.

Como isso pode ser temido?

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Per Bylund

Publicado originalmente em: cutt.ly/rnIciP8

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