Pelo menos seis grandes negócios acionaram a Justiça com dívidas de bilhões de reais
Foi recorde atrás de recorde. Mês após mês, o ano de 2023 registrou números recordes de pedidos de recuperação judicial vindo das empresas. O mecanismo é um remédio jurídico para as companhias tomarem um fôlego e se recuperarem de crises econômicas.
Só em novembro, foram 175 pedidos de recuperação judicial no Brasil, um aumento de 196% em relação ao mesmo mês de 2022. Em outubro, foram outras 162 solicitações de reestruturação. Os dados são do Serasa Experian.
No acumulado do ano, contando de janeiro a novembro, foram 1.303 pedidos de recuperação judicial. No mesmo período do ano passado, foram 756. Ou seja, quase que duplicou o número de companhias acionando esse mecanismo jurídico.
“Apesar de começarmos a observar os resultados da queda da inflação e das taxas de juros, o que tem contribuído para uma melhoria na inadimplência das empresas, o cenário de recuperação judicial apresenta uma reação mais lenta”, diz o economista da Serasa Experian, Luiz Rabi.
“O constante crescimento da lista de companhias negativadas mostra que a instabilidade econômica ainda é um desafio para os empreendedores. Nesse contexto, abalados financeiramente, muitos empresários acabam recorrendo aos processos de recuperação judicial como uma tentativa de renegociar dívidas e evitar a falência”.
A maioria das empresas que pedem recuperação judicial são micro e pequenos negócios, mas há também casos de grandes companhias, com dívidas bilionárias. Em 2023, pudemos ver grandes negócios de serviços, varejos e indústrias protocolando recuperação judicial. Relembre alguns dos principais processos do ano abaixo.
O ano começou com uma crise bilionária na varejista Americanas, umas das principais empresas de varejo do país. Após anunciar um rombo fiscal de 20 bilhões de reais, num comunicado a investidores que chacoalhou o mercado e o setor, a empresa entrou em recuperação judicial alegando dívidas de 43 bilhões de reais. Foi a maior crise do varejo brasileiro.
No último mês, os credores aprovaram o plano de reestruturação da companhia. O CEO da Americanas, Leonardo Coelho, destacou a versão final do plano de recuperação judicial como um “esforço conjunto” do colegiado de credores, assessores financeiros e assessores jurídicos. “O plano tem o melhor formato possível para equilibrar passivos e destravar o crescimento sustentável da empresa.”
A proposta da companhia determina um aumento de capital de R$ 12 bilhões por parte do trio 3G – Jorge Paulo Lemann, Beto Sicupira e Marcel Telles – e uma capitalização de dívidas no mesmo montante por parte dos bancos.
Oi (segunda recuperação judicial)
- Dívida estimada: R$ 44,3 bilhões
Depois de encerrar um primeiro processo de recuperação judicial em 2022, a empresa de telecomunicações Oi ingressou com um segundo pedido de reestruturação no primeiro semestre deste ano.
No primeiro processo, de 2016, a dívida da tele era de 65 bilhões de reais. Quando saiu do primeiro processo, estava ainda com um passivo de 35 bilhões de reais, que depois foi revisto para 44,3 bilhões de reais.
Em fato relevante enviado à Comissão de Valores Mobiliários (CVM), a empresa lembrou em março, quando ajuizou o pedido, que juntamente com suas subsidiárias vêm empreendendo esforços, em conjunto com seus assessores financeiros e legais, mediante a condução de negociações com certos credores financeiros, visando a potencial repactuação de dívidas financeiras, fortalecimento da sua estrutura de capital e otimização de sua liquidez e perfil de endividamento, e essas negociações continuam em andamento.
Light
- Dívida estimada de R$ 11 bilhões
Em maio, foi a vez da Light, de eletricidade, entrar em recuperação judicial com uma dívida estimada de 11 bilhões de reais. No comunicado que fez ao mercado, a companhia falou que vinha avaliando alternativas e empreendendo esforços na busca do equacionamento de obrigações financeiras, “inclusive mediante tratativas com certos credores no âmbito de procedimento de mediação devidamente instaurado e em curso na presente data”. No entanto, a Light cita que a situação se agravou, “embora siga avançando nas negociações”.
Aproximadamente R$ 7 bilhões estão com detentores de debêntures e R$ 3,1 bilhões em títulos de dívida no exterior (bonds).
A assembleia de credores está prevista para março de 2024. A companhia depende de um acordo com os acionistas para conseguir renovar suas concessões, que vencem em 2026, junto à Aneel.
Cervejaria Petrópolis
- Dívida estimada: R$ 4,4 bilhões
No primeiro semestre do ano, a Cervejaria Petrópolis, dona da Itaipava e da Petra, entrou em recuperação judicial com uma dívida estimada de 4,4 bilhões de reais. De acordo com a petição em que pediu recuperação, o grupo que gera 24 mil empregos diretos e cerca de 100 mil indiretos enfrentava uma crise de liquidez decorrente da redução de receita.
No ano passado, a empresa vendeu 24,1 milhões de hectolitros de bebidas, o que representa uma queda de 23% na comparação com 2020. Essa redução significou um recuo de 17% na receita bruta do período. Ao mesmo tempo, os custos do setor subiram e, ainda segundo a defesa da Petrópolis, não foram repassados ao consumidor.
O plano de reestruturação da empresa já foi aprovado pelos credores. O calendário de pagamento vai até 2035, de acordo com a classificação do credor. O objetivo da empresa, conforme apresentado no documento, é manter os 24 mil empregos que as 30 empresas da holding têm. Saiba mais: O plano de recuperação da dona da Itaipava é suficiente para reaver dívida de R$ 4,4 bilhões?
123 Milhas
- Dívida estimada: R$ 2,3 bilhões
Em agosto, a agência de viagens online 123 Milhas entrou em recuperação judicial com dívida de 2,3 bilhões de reais. No pedido de recuperação feito à Justiça, a defesa alega que a empresa está enfrentando a pior crise financeira desde sua fundação em 2016 “decorrente da cumulação de fatores internos e externos, que impuseram um aumento considerável de seus passivos nos últimos anos”.
Um pouco antes, a empresa havia suspendido os pacotes com datas flexíveis e a emissão de passagens promocionais. Em nota, a empresa afirma que o pedido de recuperação judicial tem como objetivo “assegurar o cumprimento dos compromissos assumidos com clientes, ex-colaboradores e fornecedores”. A empresa avalia que, desta forma, “chegará mais rápido a soluções com todos os credores para, progressivamente, reequilibrar sua situação financeira”.
Southrock, dona da Starbucks no Brasil
- Dívida estimada: R$ 1,8 bilhão
Já no final do ano, uma nova crise balançou o setor de serviços no país. A Southrock, operadora da Starbucks, do Eataly e da Subway no Brasil entrou em recuperação judicial com uma dívida de 1,8 bilhão de reais.
Segundo a companhia, a crise econômica no Brasil resultante da pandemia, a inflação e a permanência de taxas de juro elevadas agravaram os desafios do negócio.
“Neste cenário, a SouthRock segue comprometida a defender a sua missão e seus valores, enquanto entra em uma nova fase de desafios, que exige a reestruturação de seus negócios para continuar protegendo as marcas das quais tem orgulho de representar no Brasil, os seus Partners [colaboradores], consumidores e as operações de suas lojas”, disse em nota.
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Por Daniel Giussani
Publicado originalmente em: https://encurtador.com.br/dqrvU